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Domingos coração de ouro

Domingos Oliveira em 'Todas as Mulheres do Mundo', de 1966 — Foto: Geraldo Modesto/TV Globo

É Caio Blat quem nos passa uma frase que Domingos Oliveira tinha como divisa: “O amor é a única coisa pela qual vale a pena sofrer”. Um artista que acreditava nisso, a ponto de fazer do amor o tema principal de seus filmes, peças de teatro e especiais de TV, não passou pela vida em vão. Pelo contrário, com sensibilidade e inteligência, deixou sua marca entre os feitos de uma brilhante geração.
Era mesmo brilhante aquela geração. Os que trabalhávamos em jornal, ficávamos impressionados, e até contagiados, pelo amor daqueles moços ao cinema. Passado tanto tempo, ainda acredito que sete entre dez jovens intelectuais de então (a maioria com menos de 30 anos) adoravam cinema.
Só na nossa redação havia quem fazia (Nélson Pereira dos Santos), quem criticava (Nélson Vieira Ottoni), quem estudava (José Carlos Avellar), quem sonhava (Moisés Kendler) e a numerosa turma do super 8 acreditando que dela ainda surgiria um novo Godard, ou Antonioni, ou Truffaut, ou Fellini. O cinema, para quase todos eles, acabara de ser reinventado na Europa.
Domingos Oliveira não chegou a trabalhar regularmente em jornal, mas colaborou com alguns. Ao se considerar “um escritor”, fazia de seus filmes e peças uma extensão natural do ato de escrever. Suas histórias, na maioria, inspiravam-se em fatos reais, vividos por ele ou por amigos. Ou melhor, amigas, pois são as mulheres as principais personagens dos filmes ou peças que escreveu e/ou dirigiu. Entre estes, as confissões de adolescente da filha Maria Mariana.
Domingos Oliveira foi mesmo um dos jovens daquela geração de cineastas, hoje bem representada por Cacá Diegues. Tinha 20 anos quando estreou com “Todas as mulheres do mundo”. Recorrendo às amareladas páginas de minha coleção de “Guia de Filmes”, lembro o que disse do filme o crítico Salvyano Cavalcanti de Paiva: “Domingos Oliveira vê a vida, a sua e a dos outros, como nenhum autor brasileiro”.

Referia-se à sua forma de contar as seis histórias, de retratar a mulher, de unir ao romântico o humor carioca. Dois anos depois, com “Edu coração de ouro”, garantia seu lugar ao lado de Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrada, Leon Hirszman, Ruy Guerra, Paulo César Saraceni e outros.
À certa altura, Domingos Oliveira passou a se dedicar mais ao teatro. “Somos todos do Jardim da Infância” veio primeiro. Em seguida, uma peça após outra. Até levar adiante a ideia da filha com “Confissões de mulher de 30” e, agora, “Mulheres de 50”, seu adeus, ainda a estrear na televisão.
Com todas as limitações que a doença de Parkinson lhe impôs, Domingos jamais parou de escrever. Em seus dois livros, ambos autobiográficos, volta a falar de amor.
Em entrevista de 2006, referia-se com carinho às figuras femininas de sua vida, quatro delas atrizes: Leila Diniz, Nazareth Ohana (mãe de Cláudia), Lenita Plonczynski (mãe de Maria Mariana) e Priscilla Rozembaun (companheira dos últimos 38 anos). Por fim, traça um autorretrato definidor: “Sou os que as mulheres que eu amei fizeram de mim”.

João Máximo

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