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O governo ver pobres e minorias como entraves e opera seus métodos de destruição

Governo esmaga as minorias

E de sangue indígena e sangue negro que se construiu o Brasil. A liberdade é vermelha, a cor da resistência, a cor da luta.

Ele desce a Lapinha ostentando a bandeira verde e amarela, mas sua pele é morena, é brasa. Ele é o senhor deste chão, o grande ancestral que abrigou os guerreiros de África.

Agô, que essa terra tem dono.

Assim a Bahia festeja o 2 de julho, com as imagens do caboclo e da cabocla percorrendo Salvador num cortejo cívico, alegre e também religioso.

O candomblé acolhe o ancestral indígena por afinidade e respeito. Quando os negros chegaram, os índios já empreendiam sua luta, já sobreviviam à sanha do opressor. E seguiram séculos e séculos resistindo, mas uma batalha desleal agora é travada e a união de todos os povos em defesa de tantas tribos nunca foi tão necessária.

“Pintado com tinta de guerra, o índio despertou.
Raoni cercou os limites da aldeia.
Bordunas e arcos e flexas e facões.
De repente, eram mais que canhões
Na mão de quem guerreia.”

Lá se vão mais de 30 anos desde que esses versos de João Nogueira embalaram o desfile glorioso da escola de samba Tradição, a famosa dissidente da Portela. Era um brado, um grito de guerra, um alerta.

Naquele primeiro ano da redemocratização, denunciar as atrocidades da ditadura militar contra os povos indígenas ainda era algo incipiente, feito com muito cuidado. O que mais tarde ficaria comprovado é que o genocídio empreendido desde sempre se intensificou como uma estratégia do regime e a quantidade de índios exterminados é assustadora.

Nas periferias, favelas e morros deste País, o povo negro também sofria nas mãos da ditadura por meio de seus desdobramentos nas políticas de segurança pública.

As polícias militares tinham suas facções, esquadrões, grupos de extermínio.

A verdade é que a história desse período obscuro também é contada a partir do ponto de vista das elites, no caso as elites da esquerda.

Gente branca e de classe média, intelectuais e estudantes, políticos e militantes e até “guerrilheiros”, que em muitas situações aparecem como os únicos perseguidos pelo sistema. O povo pobre, preto e indígena sofreu muito, lutou muito e resistiu.

“Caraíba quer civilizar o índio nu
Caraíba quer tomar as terras do Xingu.
Caraíba quer civilizar o índio nu
Caraíba quer tomar as terras do Xingu.”

Com o pretexto de integrar os índios, promoveu-se um genocídio cultural tão cruel quanto a dizimação de fato. Civilizar ainda é uma ideia presente, sobretudo nessas mentes reacionárias que tomaram o poder e retomaram as táticas mais desumanas de extermínio.

Madeireiros, garimpeiros, latifundiários, respaldados por ações governamentais, elegeram os povos indígenas como um grande inimigo a ser eliminado, colocando em perigo a vida das lideranças e suas comunidades.

Do Quariterê a Palmares, sabemos que os quilombos sempre acolheram negros, índios e pobres. Oprimidos de toda sorte encontraram abrigo e seguiram com suas estratégias de resistência na busca de direitos e cidadania. Essa luta se atualiza porque as políticas de Estado retroagiram a tal ponto que é necessário reinventar os quilombos e unir forças contra o mal que nos ameaça.

Quando o sol resplandece os raios da manhã
Na folha, na fruta, na flor e na cascata
Reclama o pajé pra Tupã
E o curimatã sumiu dos rios
Uirapuru fugiu pro alto da mata
Toda a caça ali se dispersou
Oh, Deus Tupã!
Benze a pedra verde, a muiraquitã
E os índios estão se juntando igual jamais se viu
Pelas terras do pau-brasil.

Desastres ambientais avançam numa proporção assustadora. Queimadas na Amazônia, óleo nas praias do Nordeste, destruição e morte.

O mundo em estado de alerta e o Brasil no foco das discussões internacionais sobre meio ambiente.

Contudo, é preciso denunciar o sofrimento do povo, o crescimento da fome e da miséria, o genocídio negro e indígena, o aumento brutal do feminicídio.

A necropolítica, atingindo um nível atroz, soma-se ao cinismo de um discurso neoliberal que nos faz perceber a perversão de um sistema. Em vez de assumir a luta contra a pobreza e a desigualdade, o governo passa a ver pobres e minorias como entraves e opera, direta ou indiretamente, seus tristes métodos de destruição.

“Eh, Xingu!
Ouvindo o som do seu tambor
As asas do condor, o pássaro guerreiro,
Também bateram, se juntando ao seu clamor
Na luta em defesa do solo brasileiro.”

Uma luta de todos que clamam por justiça e esperam que a morte de mais uma liderança indígena não fique impune. Que o temor servil não tome conta do povo brasileiro e o brado do caboclo ecoe nas matas, com a força de Oxóssi, o mais índio entre os orixás, levando esperança aos povos da floresta e também ao povo do Axé.

Que nossa identidade seja plena e o atabaque ressoe o canto ancestral, chamando a Jurema Sagrada, do catimbó, da umbanda, dos quilombos e dos terreiros de candomblé, na comunhão dos encantados, para que a fé nos ajude a vencer.

Quem tem sangue de caboclo reconhece o chamado. Lá das matas vem a força “da nação do Brasil, da nação brasileira, das cores da nossa bandeira”. Das matas vem o grito de Arariboia, Pena Branca e Pena Verde, de Sultão, Serra Negra e Rei da Hungria, de Ubatuba, Morumbi e Eru, de Jussara, Jurema e Jupira, de Sete Flechas, Sete Pedreiras e Rompe-mato, de Pedra Preta, Pedra Branca e Giramundo.

Okê Caboclo! De arco, flecha, borduna, tacape, ajaré, venham guerrear pela paz.
“Um grito de guerra ecoou
Calando o uirapuru lá no alto da serra
A nação Xingu retumbou
Mostrando que ainda é o índio o dono da terra.”

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