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Sociedade de Cardiologia introduz a fé em suas orientações de prevenção e cura

Medicina e fé

A SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia) atualizou suas recomendações aos médicos de prevenção e tratamento de pacientes, introduzindo nelas (ou reforçando) a fé e a espiritualidade.

Após abordar as consequências coronárias da hipertensão, sobrepeso e diabetes, tabagismo e falta de atividade física, o documento discorre sobre “um conjunto de evidências da forte relação entre espiritualidade, religião, religiosidade e os processos de saúde, adoecimento e cura”.

A SBC, no documento, assume um tom arrogante ao afirmar que a espiritualidade e a fé não são adotadas pelos médicos da comunidade internacional para “medir e avaliar sua influência nos resultados de saúde, “[…], por desconhecimento do conceito e desatualização científica”.

Ou seja, do ponto de vista da entidade, os cardiologistas do mundo, incluindo os dos países desenvolvimentos, que gastam muito dinheiro em pesquisas e estudos, são atrasados porque desconsideram a religião e a espiritualidade dos pacientes.

É preciso admitir que a SBC é arrojada, a ponto de não temer parecer ridícula.

A entidade coronária se alonga em um tema que, em tese, não é de seu escopo ao admitir que “a espiritualidade não tem uma definição clara, sendo o termo usado de forma imprecisa e inconsistente, variando de acordo com religião, cultura e tempo e por isso de difícil aferição”.

Se a religiosidade é de difícil aferição, como a própria SBC admite, não dá para obter evidências de suas consequências. Assim ela não é, a rigor, uma ciência.

A entidade não se detém diante de tal “detalhe” e segue adiante.

Argumenta que “80% da população mundial possui alguma afiliação religiosa e a fé tem sido identificada como poderosa força mobilizadora nas vidas de indivíduos e comunidades”.

A SBC está mal informada, para não dizer que faz proselitismo anti-ciência.

Ela desconhece que a sociedade mundial está mudando.

Em países subdesenvolvidos como o Brasil e os africanos, a afiliação religiosa supera os 80%, mas isso não ocorre no mundo desenvolvido (incluindo os Estados Unidos), onde o número dos sem religião tem aumentado substancialmente nas últimas décadas.

Além do mais, ao sustentar que 80% das pessoas do mundo seguem formalmente uma religião, a SBC certamente acha que a população de 1,39 bilhão de chineses habita outro planeta, onde a maioria não é adepta a crença alguma.

Para justificar sua abordagem que transcende a ciência médica, a do sangue correndo nas veias, a Sociedade Brasileira de Cardiologia entra em discussões infindáveis, que nada têm a ver com ciência.

Ela diz, por exemplo, que a religião facilita a “proximidade com o transcendente”.

Cita o médico americano Harold Koenig, segundo o qual a religião é “um sistema organizado de crenças, práticas e símbolos destinados a facilitar a proximidade com o transcendente ou o Divino e fomentar a compreensão do relacionamento e das responsabilidades de uma pessoa com os outros que vivem em comunidade”.

Harold Koenig defende que a crença, a prática religiosa e a oração são aliadas da ciência médica. No Brasil, ele é admirado pelos espíritas.

Continuando em seu documento, a SBC acrescenta que a religiosidade ocorre “quando um indivíduo acredita, segue e prática uma religião”.

Ela pode se dar de maneira “organizacional”, por intermédio de participação na Igreja, templo ou serviços religioso. Ou “não organizacional, como rezar, ler livros ou assistir programas religiosos por iniciativa própria”.

Ateus e agnósticos, onde ficam nesta história toda?

Os “filósofos” da SBC colocam os ateus, agnósticos e os sem religião na categoria dos espirituais.

“[…] Tanto os ateus quanto os agnósticos, embora não acreditando ou sendo incertos sobre a existência de Deus, ainda assim possuem uma forma de espiritualidade baseada na filosofia existencial, encontrando significado, propósito e realização na própria vida.”

“A espiritualidade evoca preocupações, compaixão e uma sensação de conexão com algo maior além de nós mesmos.”

A pessoa que ler o documento da SBC a partir dos tópicos finais para o começo terá a impressão de que está diante de uma exposição lacradora de conceitos que, para os simples mortais, são controversos e passíveis de várias interpretações.

Muitos pacientes, talvez a maioria, principalmente os terminais, precisam, sim, de assistência espiritual, mas quem deve fazê-lo é o pastor ou familiares religiosos, e não cardiologistas preocupados com a transcendência.

O documento da SBC cria uma brecha para pregação nos hospitais do fanatismo religioso, que, ao que parece, está se instalando na própria entidade.

Informação de documento da SBC.

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