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GOVERNO BOLSONARO SINALIZA COM ENDURECIMENTO

Imagem de divulgação

A demissão do ministro-general Santos Cruz, e sua substituição pelo general Luiz Eduardo Ramos Pereira, comandante militar do Sudeste sinaliza que o governo Bolsonaro tomou o caminho do endurecimento do regime, com consequências imprevisíveis para o cenário político-institucional.

A troca de generais e o que parece ser o novo rumo do governo foi uma verdadeira operação conjunta do Exército. A demissão de Cruz e a nomeação de Ramos Pereira foram anunciadas na tarde desta quinta-feira (13) simultaneamente a mais um “pronunciamento” do ex-comandante do Exército e atual assessor especial do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), o general Eduardo Villas Bôas.

Durante os anos dos regimes militares na América Latina, os “pronunciamentos” eram manifestações de líderes militares com o objetivo de estabelecer limites aos regimes democráticos -ou arrebentar de vez com eles, com os consequentes golpes de Estado.

Villas Bôas é o cérebro do Exército. Se não fosse sua frágil condição física -ele tem a gravíssima esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma doença degenerativa incurável- estaria no lugar do general Heleno, à frente do GSI. Mas, mesmo muito debilitado fisicamente, é o “pater” do Exército. Há uma certa aura de credibilidade ao redor do general, injustificada. Nomeado por Dilma em fevereiro de 2015, traiu a democracia e apoiou vivamente o golpe de Estado; depois, com sua ação nos bastidores e seus tweets ameaçou o STF caso soltasse Lula e, agora, saiu em defesa de Moro.

Ramos Pereira é, de longe, o mais bolsonarista dos generais 4 estrelas à frente da tropa. Em julho passado, ecoou o pronunciamento de Villas Bôas de ameaça ao STF no caso do habeas corpus de Lula. Foi uma manobra claramente combinada.

Em abril, com seu twitter, Villas Bôas advertiu o STF sobre “o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição” -uma declaração de aparência genérica mas que foi entendidas na Praça dos Três Poderes por bons leitores, para quem meia palavra basta. Lula ficou preso e assim está até hoje.

Em julho pouco mais de um mês do lançamento da pré-candidatura de Lula à Presidência, o general Ramos Pereira, numa solenidade de aniversário do Comando Militar do Sudeste, mencionou diretamente a eleição para em seguida afirmar: “Não podemos transigir com as leis vigentes, buscando atender a interesses pessoais ou até mesmo político-partidários”. Uma versão quase literal do tweet de Villas Bôas. Como todos sabemos, Lula teve sua candidatura vetada.

Há um elemento nessa troca de generais que não deve ser minimizado: o governo Bolsonaro cruza uma linha perigosa para a democracia. Ramos Pereira é o primeiro militar da ativa a assumir uma posição de comando estratégico e operacional do governo Bolsonaro, na Secretaria de Governo. Bolsonaro começa a comprometer institucionalmente o Exército com seu governo -e o Exército está concordando com este marco simbólico.

Especula-se que o general Cruz teria caído devido a seu confronto com Olavo de Carvalho e os filhos de Bolsonaro. Como pondera o arguto analista político Artur Araújo, por qual razão o governo escolheria um momento de confluência de duas crises grandes, a Vaza Jato e a greve geral, para demitir o ministro-general por rusgas do passado? A resposta é óbvia: não há qualquer razão para isso.

O que está em risco neste momento é a operação que foi um dos pilares do golpe de 2015-16 e a grande eleitora de Bolsonaro em 2018, a Lava Jato. Desmontada a Lava Jato, desfaz-se toda a narrativa que sustenta a ofensiva da direita e extrema-direita nos últimos anos.

Não nos iludamos. Não é Olavo quem derrubou o general Cruz. Ramos Pereira chega ao núcleo do poder para, em aliança com Villas Bôas, Heleno e outros generais, iniciar um processo de endurecimento. Dará certo? Isso é outra história.

Mauro Lopes

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