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A luta contra a depressão e pelo direito à felicidade sem aspas

De acordo com pesquisa realizada pela Organização Mundial de Saúde, cerca de 300 milhões de pessoas no mundo sofrem com a depressão. No Brasil, país da América Latina que apresenta o maior aumento da quantidade de pessoas com quadro depressivo nos últimos 10 anos, atualmente quase 6% da população sofre com o transtorno.

Apesar do número gigantesco e alarmante de casos diagnosticados como depressão (não entra nessa conta a quantidade certamente grande de pessoas que sofrem com o transtorno e não possuem diagnóstico), menos da metade das pessoas com o quadro depressivo procuram acompanhamento psicológico e/ou tratamento psiquiátrico.

Isso acontece por uma série de fatores: o estigma e o preconceito sobre questões relacionadas à saúde mental ainda são grandes; a falta de recursos e de acesso à saúde pública de qualidade (o que afeta sobretudo a população mais pobre, que é justamente a que mais sofre com a depressão).

A vulnerabilidade existente por parte da população jovem (a maioria das pessoas que tem depressão no Brasil são jovens LGBTs), que não tem autonomia familiar e financeira para procurar atendimento; outros preconceitos e dificuldades socioeconômicas que estão associados ao quadro depressivo e aparecem como empecilhos à procura por tratamento.

Desse modo, a depressão se torna o principal motivo que leva tanta gente ao suicídio. Por ano, em todo mundo, cerca de 800 mil pessoas tiram a própria vida, sendo esta a segunda principal causa de morte entre pessoas com idade entre 15 e 29 anos.

No Brasil, a taxa de suicídio aumentou muito entre a classe trabalhadora, que sofre cada vez mais com o desemprego, com a falta de acesso a serviços públicos, com uma exploração cada vez maior e com a falta de perspectiva tanto de se aposentar quanto de viver uma vida de trabalho estável.

Aumentou também entre os povos indígenas (a média de suicídio é quase o triplo da média nacional), diretamente afetados pela política genocída de expansão do agronegócio e pelo consequente aumento dos conflitos pela terra, que desrespeitam e destroem territórios, florestas, culturas e modos de vida.

Por outro lado, se não podemos ignorar esses dados, tampouco devemos esquecer a realidade de sofrimento e agonia que grande parte da população mundial enfrenta.

Logo, é preciso lembrar que milhões de pessoas estão sobrevivendo e lutando diariamente pelo direito a uma vida digna, sem transtornos psicológicos incapacitantes e sem nenhuma forma de opressão e exploração.

Para quem, assim como eu, vive tantos momentos paralisantes da depressão e se vê temporariamente sem perspectiva, não se deixe esquecer que não estamos sozinhos nem na dor nem na luta.

Para que a nossa perspectiva seja construída na certeza da vitória coletiva sobre as mazelas de uma sociedade violentamente desigual, é imprescindível que lembremos que não somos definidos pelos nossos sintomas e que depressão não é sinônimo de fraqueza, mas que, pelo contrário, representa a força enorme que temos de estar enfrentamento diariamente tanta dor e dificuldade.

Mais do que nunca o autocuidado é uma tarefa revolucionária e a luta por um mundo melhor e mais justo está indissociavelmente ligada à luta pela nossa condição individual de sobrevivência e bem-estar, pelo direito a uma felicidade sem aspas e sem crises nas entrelinhas.

Júlia Vilhena

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