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Pesquisas diz que crianças expostas à violência têm a cognição social afetada

Foto: Instituto do Cérebro do RS/Divulgação

Uma pesquisa desenvolvida pelo Instituto do Cérebro do Rio Grande do Sul mostrou alteração no desenvolvimento de crianças expostas à violência.

O estudo, feito com cerca de 70 estudantes de 10 a 12 anos de escolas públicas de Porto Alegre, avaliou o impacto da criminalidade no aprendizado e no funcionamento do cérebro.

Foram escolhidos bairros com altos índices de violência.

O trabalho, que faz parte do projeto VIVA – Vida e Violência na Adolescência, foi publicado na revista científica internacional Developmental Science.

De acordo com o pesquisador do InsCer Augusto Buchweitz, é a primeira vez que um estudo de neuroimagem pesquisa como a violência afeta o cérebro de crianças latino-americanas.

“No hemisfério direito do cérebro a gente tem uma rede de regiões que, quando eu olho para uma pessoa e preciso decifrar como ela está se sentindo, essa rede se ativa.

É automático.

Nessas crianças, quanto mais expostos à violência, mais essa rede está desativada e não está ligando quando precisa ligar”.

Depois de responderem a um questionário sobre exposição a maus-tratos, as crianças foram submetidas a uma ressonância magnética.

Durante o exame, pares de olhos eram mostrados e elas tinham que decidir o estado mental da pessoa que estava na foto.

“Elas precisavam dizer se aquelas pessoas estavam felizes, tristes, cansadas. Na hora de decidir a emoção daqueles rostos, as crianças erraram muito.

Só 60% acertaram.

Esse índice é muito baixo.

Essa média é comparada a de adolescentes, de 16 a 18 anos, no Chile. Isso é grave”.

Segundo os pesquisadores, esse tipo de funcionamento atípico do cérebro é marcador de risco para transtornos de humor e de ansiedade, sendo característico de populações que sofreram abusos.

Essas alterações prejudicam principalmente a capacidade de aprender dos alunos.

“Ele pode realmente ser um indicativo de que essas crianças estão em risco, pela escola e pelo ambiente em que elas vivem, de grande parte da sua saúde mental já estar sendo comprometida. Isso é muito triste porque a escola deixa de ser um porto seguro, para aprendizagem, e dificilmente as crianças conseguem dedicar a energia que elas deveriam.

A gente gasta muita energia para aprender algo novo. Se a gente está preocupado em sobreviver, se vai ter tiroteio, se vai apanhar, sobra pouca energia no cérebro para aprender”.

O estudo mostrou também que a conectividade da amígdala, conhecida como o “centro do medo” no cérebro, se comunicava mais nestes estudantes.

Em laboratório, a análise de fios de cabelos das crianças identificou ainda uma aumento no cortisol, que sugerem alto nível de estresse.

“Aquela criança que tinha testemunhado mais violência, inclusive abuso sexual, era a que tinha mais cortisol no cabelo. Você tem o relato da criança e um marcador biológico importante.

Quando o estresse atinge níveis tóxicos, ele começa a causar processos mal adaptativos.

Nesses casos, o cérebro não aguenta mais e diz ‘chega, é estresse demais, quando eu olhar para o rosto de uma pessoa eu não vou mais tentar decidir se ela está feliz ou se está brava comigo’. Ele desliga”.

Buchweitz alerta para a necessidade de redes de apoio para essas crianças e destaca o bullying como um dos fatores desse estresse.

“Isso pode ter consequências importantes, mas pode ser revertido. Precisa ser feito algo logo.

É preciso estabelecer redes de apoio nas escolas, ter um profissional que vá nas famílias e que ajude com essa situação”.

Lilian Lima

 

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