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Quem criou o termo ‘agrotóxico’ e por que não ‘pesticida’ ou ‘defensivo agrícola’

Lei pretende mudar nome "agrotóxicos" para "pesticidas" — Foto: Nathalia Ceccon/Idaf-ES

O produto utilizado para controle de pragas e doenças nas lavouras é conhecido mundialmente como pesticida (pesticides, em inglês). O Brasil é o único que adotou uma nomenclatura própria para o produto: agrotóxico.

O termo surgiu em 1977 e foi criado pelo pesquisador e PhD em agronomia Adilson Paschoal, autor do livro que deu origem ao termo: “Pragas, agrotóxicos e a crise ambiente: Problemas e soluções”.

Em entrevista ao G1, ele explicou de onde surgiu a origem do nome, que foi adotado pelo governo federal na Lei dos Agrotóxicos, publicada de 1989. Além disso, o departamento do Ministério da Agricultura responsável pelo registro desses produtos se chama “Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins”.

O nome é considerado negativo pelo setor produtivo, que tenta, por meio do projeto de lei 6299/2002, chamado por ambientalistas de “pacote do veneno”, mudar o nome oficial de “agrotóxico” para “pesticida”.

Para o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, que é também engenheiro agrônomo, a nomenclatura atual não faz sentido.

“É a mesma coisa que chamar o nosso remédio de ‘humanotóxico’. A toxicidade é um fator do produto, se ele for usado de maneira incorreta ou em excesso. Eu entendo que o produto é um ‘agroquímico’ que pode ser tóxico”, explica Rodrigues.

Mas, segundo Paschoal, o nome oficial “cumpre todo o rigor exigido pela ciência e a exatidão terminológica requerida pelo nosso idioma”.

Veja a explicação:

Agrotóxico tem origem do grego: agros (campo) + tokicon (veneno). O vocábulo tem sentido geral, incluindo todos os produtos de natureza tóxica usados na agricultura (mais propriamente nos sistemas agrícolas ou agroecossistemas), para o manejo de pragas, patógenos e ervas invasoras.

O vocábulo não é apenas etimologicamente correto como também o é cientificamente, sendo a ciência que estuda os efeitos desses produtos chamada toxicologia. Trata-se, pois, de um vocábulo com todo o rigor exigido pela ciência e a exatidão terminológica exigida pelo nosso idioma”.

Outros nomes que são mais utilizados pelos produtores rurais são os termos “defensivo agrícola”, “pesticida”, “praguicida”, “agroquímico”, “produto fitossanitário” e “biocida”. Para o pesquisador, nenhuma dessas nomenclaturas explicam de forma satisfatória a função desses produtos.

O que Paschoal diz:

“Pesticida (do latim pestis, a doença, + cida, o que mata) é expressão usada em países de língua francesa e inglesa (pesticides), estrangeirismos que não são aceitos pela norma culta da língua portuguesa. Significando ‘o que mata a peste’, e ‘peste’ é doença, o vocábulo não pode ser usado com sentido geral, englobando pragas, patógenos e plantas invasoras.

Mesmo para doença o termo é inadequado uma vez que não é a doença que se mata, mas, sim, os seus agentes causadores, isto é, os patógenos.”

“Praguicida (do latim plaga, a praga, + cida, o que mata) não é, pela mesma razão, possível o seu uso em caráter geral. Implícito na definição está o fato de existirem pragas e não pragas e que o praguicida mata apenas pragas, o que hoje sabemos não ser verdade, pois esses produtos matam mais o que não é praga (inimigos naturais, espécies inócuas) do que pragas, organismos esses desprovidos de resistência como mecanismo pré-adaptativo. “

Defensivo agrícola (do latim defensa, defesa, + ivus) é o termo mais incorreto, ambíguo, utópico, vago e tendencioso de todos. Etimologicamente significa ‘próprio para a defesa’, mas não indica defesa de que ou de quem; se defensivo agrícola, então a defesa é da agricultura, não especificando tratar-se de substância tóxica para o controle de espécies daninhas. D

eduz-se disso ser qualquer técnica usada na defesa da agricultura um defensivo agrícola. Nesse sentido, métodos de controle de erosão são defensivos agrícolas, pois defendem a agricultura dos processos erosivos do solo. Este exemplo basta para se concluir que não existe lógica nenhuma para se caracterizar exclusivamente os produtos químicos agrícolas como sendo defensivos, mesmo porque, hoje se sabe muito bem, serem eles agentes de desequilíbrios biológicos, gerando mais pragas e doenças do que realmente controlando-as.

Quando pensamos em termos da natureza, tais produtos não podem ser encarados como instrumentos de defesa, mas de ataque maciço contra todo tipo de vida, e de destruição e perturbação do equilíbrio da natureza.”

Produto fitossanitário. É outro termo aventando por aqueles que desconhecem ciência e a língua pátria. Se o argumento é o de se adotar terminologia, mesmo que errada, usada em outros países (pesticida, por exemplo), este só seria usado aqui.

Além disso, a expressão não pode ser empregada em sentido geral, limitando-as às plantas (fito = planta), excluindo pragas e vetores de doenças animais, também controlados por agrotóxicos, passiveis de registro e de controle pelos órgãos fiscalizadores. Igualmente estariam fora as ervas invasoras, pois o vocábulo “sanitário” significa “que se refere a ou é próprio da saúde ou da higiene”.

Seria, por acaso, a saúde da erva daninha que se almeja?”

Agroquímicos é outra maneira tendenciosa de ocultar a natureza tóxica dos produtos usados na agricultura. O termo, amplo por natureza, permite incluir além dos agrotóxicos também os adubos minerais, de natureza química como aqueles. Sob essa denominação, os inseticidas microbianos, cujo emprego ganha força em todo o mundo, estariam obviamente fora.”

Biocida (do latim bios, vida + cida, o que mata) é termo mais realista, com sentido mais amplo, incorrendo em pleonasmo: matar o que é vivo. Seria possível matar o que é morto? “.

Rikardy Tooge

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