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‘Minha mãe é uma peça 3’ elimina piadas com gordofobia e gays

Os cartazes dos três primeiros filmes de 'Minha mãe é uma peça' — Foto: Divulgação

O jeito de Paulo Gustavo fazer graça foi mudando nos últimos anos. Ele faz cada vez mais piadas com problemas de saúde, e cada vez menos piadas com gordofobia e estereótipos gays.

Somados, os dois primeiros filmes de “Minha mãe é uma peça” venderam quase 15 milhões de ingressos. E a segunda parte é a comédia mais vista da história do cinema brasileiro, com R$ 121 milhões de arrecadação.

E o G1 já viu, em uma pré-estreia, a terceira parte da saga de Dona Hermínia. A personagem volta aos cinemas nesta quinta-feira (26).

Com caderninho na mão, também foram vistos os outros dois filmes. Essa maratona humorística de quase 5 horas rendeu uma contagem de piadas.

Em resumo, houve:

Queda de piadas com gordofobia.

Diminuição de humor com estereótipos gays.

Aumento das piadas com doença e saúde.

Cada vez mais gracinhas citando famosos.

A fórmula é a mesma que fez sucesso no teatro: o tema central é a relação de uma mãe com seus filhos. Hermínia é inspirada na mãe de Paulo Gustavo, que sempre aparece nos finais dos filmes, em vídeos gravados pelo ator. Por isso, há tantas piadas com comida, supermercado, sair à noite, namorados…

Mas por que o humor mudou?

“Eu vi que você é CDF, né? Fez conta de quantas piadas de acordo com os temas. Achei bem CDF”, diz Paulo Gustavo, rindo. Ele explica a queda de piadas sobre peso:

“É um processo natural de uma pessoa, no caso falando de mim mesmo, que vem tendo um ganho de consciência. Coisas que eu poderia falar antes, eu não falaria mais hoje. Muita coisa que brinquei há dez anos, eu já não acho mais graça.”

Paulo lista dois motivos para a mudança:

“Tem essa consciência que a gente está ganhando cada vez mais até por ter essas pautas que a gente discutindo. E eu acho que eu amadureci como ser humano. Eu vou fazendo meus trabalhos de acordo com meu jeito de ser. Eu não sou a mesma coisa que eu era. A arte ela acompanha isso ou isso que acompanha a arte.”

Ele também comenta como o outro filho, Juliano, é retratado no novo filme: “O terceiro filme inteiro é a Dona Hermínia querendo entrar na vida do Juliano e resolver o casamento dele. E feliz conhecendo a sogra, mãe do namorado dele.”

Mas, para o humorista, todo esse papo não tem nada a ver com ser mais certinho, ou menos ácido. “Não acho que eu estou politicamente correto. Tem coisas que eu falo que são até mais radicais e podem ser mal interpretadas.”

‘Marcelinaaaaaaa…’

A primeira constatação ao ver o filmes é que rolou uma queda nas piadas com gordofobia. O primeiro filme tinha 20 piadas sobre o peso da Marcelina, vivida pela atriz Mariana Xavier. Caiu para oito piadas no segundo filme e a terceira parte não tem piadas deste tipo.

‘Julianoooooo…’

Outra mudança foi nas piadas com esteriótipos de gays, quase todas estreladas por Juliano, personagem de Rodrigo Pandolfo. Eram 10 e caíram para 8. No novo filme, não tem.

Com a decisão de não usar mais esse tipo de humor, Paulo Gustavo opta por fazer graça com a desgraça. Piadas com doenças foram as que mais cresceram no decorrer da saga da Dona Hermínia.

Paulo Gustavo e Rodrigo Pandolfo em 'Minha mãe é uma peça 3' — Foto: Divulgação
Paulo Gustavo e Rodrigo Pandolfo em ‘Minha mãe é uma peça 3’ — Foto: Divulgação

 

Análise das piadas filme a filme:

‘Minha mãe é uma peça’ (2013)

Das cerca de 60 piadas contadas no primeiro filme, a maioria é sobre filhos (16), comida (11), casamento (5) e doenças (5). Há vezes em que Dona Hermínia faz rir falando de maconha (3), falando mal do corpo de rivais (3) ou indo pelo humor mais escatológico: cocô (3) e pum (2) são temas de piadas.

É o filme mais escrachado: A estreia tem o roteiro com mais piadas que poderiam ser consideradas inadequadas em 2019. Hermínia chama uma vizinha de “macumbeira”, por ela ser adepta de uma religião de origem africana não revelada. Ela diz que uma boate “está cheia de puta”, por ter mulheres usando vestidos curtos.

O que tem de diferente: É o único com piada sobre bater em criança. Para a protagonista, o certo é “tacar coisas nelas, não bater com as mãos, aí não deixa impressões digitais e não é crime”.

Drama: a morte do sobrinho de Hermínia, André, em acidente de carro.

‘Minha mãe é uma peça 2’ (2016)

São 47 piadas. De novo, o lado maternal é o que rende mais risos (12 vezes). Doenças (6) e famosos (5, incluindo a participação de Fátima Bernardes) passam a dominar o roteiro. Há também sequências sobre sexualidade (2) e desemprego (2).

É o filme menos escrachado: Dona Hermínia não xinga tanto as mulheres de “vaca” como nos outros dois e fala merda apenas cinco vezes. O fato de ser uma apresentadora de TV na maior parte da trama contribui para esse bom comportamento.

O que tem de diferente: É o único que tem um tipo de piada que não é focado no talento de Paulo Gustavo. Há pelo menos cinco piadas em que o efeito humorístico se dá na edição: Hermínia fala uma coisa e, de repente, rola um corte para ela fazendo o oposto.

Drama: a morte da Tia Zélia, muito importante na vida da protagonista.

Minha mãe é uma peça 3 (2019)

Tem mais piadas do que os outros dois somados. São 114. Além de ser campeão em piadas sobre doença, é o que mais tem citações a famosos: são nove. Foram 5 no segundo e uma no primeiro.

São 25 piadas sobre filhos, 13 sobre comida, 9 com sexualidade, 8 com humor físico, 5 sobre solterice, 7 sobre ser “pobre”, 4 com cocô ou xixi e 3 sobre dinheiro.

O que tem de diferente: Há uma sequência com gracinhas sobre saúde mental. O roteiro dá uma zoada em quem faz terapia, mas tem dinheiro e não tem tantos problemas na vida pessoal. Hermínia dá a entender que quem tem dinheiro não pode ter ansiedade ou depressão.

Drama: O momento mais dramático, com trilha emotiva, é um flashback em que Juliano (Pandolfo) quer ir vestido de Emília em uma festa da escola. Ele sofre bullying e a mãe defende. A impressão é a de que se fosse no primeiro filme, a história teria sido contada diferente.

O que os três filmes têm em comum?

Cena de  'Minha mãe é uma peça 3' — Foto: Divulgação
Cena de ‘Minha mãe é uma peça 3’ — Foto: Divulgação

Filhos, frutas e problemas intestinais são os temas comuns dos três filmes. Em todos, há pelo menos um momento de destaque em que Hermínia disserta sobre o poder de determinadas frutas soltarem ou prenderem o intestino.

Sempre há, também, pelo menos um momento dramático, no meio do filme. Nos três casos, a tensão e a tristeza duram no máximo três minutos.

Não há atores principais negros, que sejam amigos ou namorados dos protagonistas, mas os médicos do segundo (faz check-up em Hermínia) e do terceiro filmes (obstetra de Marcelina) são negros.

O que costura as três tramas, claro, é a relação mãe e filhos. De preferência, dando deixando claro que a simplicidade e o apego às origens são coisas nobres.

 Braulio Lorentz

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