O Museu Nacional inaugurou, nesta quarta-feira (16), a primeira exposição após o incêndio de setembro, que consumiu sua sede histórica, na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro.
A mostra inclui 160 peças do projeto Paleoantar, dedicado a a coletar e estudar rochas e fósseis da Antártica.
Entre elas, há oito peças que foram resgatadas dos escombros do prédio, além de ossos e réplicas de animais pré-históricos.
A iniciativa, apenas quatro meses após a tragédia, tornou-se possível com um convite do Museu da Casa da Moeda do Brasil, que cedeu duas salas de seu edifício, no centro da capital fluminense, para a exposição das peças.
Curiosamente, esse mesmo edifício foi a primeira sede do Museu Nacional no século 19, quando este ainda era denominado de Museu Real.
A partir de quinta-feira (17), a exposição será aberta ao público e poderá ser visitada nos próximos quatro meses, de terça-feira a sábado, das 10h as 16h, e no domingo, das 10h às 15h.
Segundo o diretor do Museu Nacional, o paleontólogo Alexander Kellner, as peças apresentadas são de importância internacional e o objetivo é que outras cidades possam acolhê-las depois de 17 de maio.
“Estamos já buscando parceiros para fazer com que a exposição viaje.
O Museu Nacional continua vivo. Nós estamos trabalhando”, disse Kellner.
A exposição, intitulada Quando Nem Tudo Era Gelo – Novas Descobertas no Continente Antártico, busca mostrar que a Antártica nem sempre foi como é hoje e já abrigou florestas de coníferas, com fauna e flores exuberantes e clima bem mais ameno.
Há réplicas de um mosassauro e de um plesiossauro.
O público poderá ver também um fragmento de osso de pterossauro (réptil voador), o segundo já encontrado em toda a Antártica. Ele é considerado o mais importante achado da equipe de pesquisadores do Museu Nacional.
Estão expostos ainda fósseis de répteis, baleias, lagostas, pinha e samambaias. No percurso, os vistantes também poderão ver como é o trabalho dos paleontólogos, quais ferramentas eles usam, como se abrigam e como se locomovem.
A curadoria da exposição é de Juliana Sayão, paleontóloga da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pesquisadora cedida ao Museu Nacional.
“Nunca nenhuma população humana habitou a Antártica.
Então, é um continente que traz essa assinatura de ter informação pura no seu conteúdo”, disse Juliana.
Segundo ela, a pesquisadora, a exposição ajuda a mostrar como uma mudança no clima traz impactos para vida.
“Mexendo no clima, você mexe na diversidade. Mexe na flora, mexe na fauna, mexe na cadeia alimentar.”
Peças resgatadas
A exposição já estava sendo planejada antes do incêndio e era estimada para outubro de 2018.
Embora a mostra tenha saído do papel, 99% do que está exposto não fazia parte da proposta original.
A maior parte do acervo apresentado foi selecionada a partir do que estava em um prédio anexo ou emprestado para outras instituições científicas.
A curadora afirmou que não houve perda de qualidade, já que foram encontradas peças compatíveis com as que estavam previstas inicialmente.
“Temos peças belíssimas e exclusivas”, acrescentou Juliana.
Entre as oito peças expostas que foram recuperadas dos escombros edifício do Museu Nacional, há um fragmento de rocha vulcânica e um tronco fossilizado de 70 milhões a 80 milhões de anos que se encontra com aspecto metalizado devido ao impacto de um armário que derreteu no incêndio.
A ideia é mantê-lo desse jeito, como uma testemunha da tragédia.
“Fóssil é algo raro e, na Antártica, mais raro ainda. Mas dentro do que costumamos coletar lá, troncos são mais comuns.
Se fosse um osso, possivelmente iríamos trabalhar para retirar a aparência metalizada”, disse Alexander Kellner.
De acordo com Kellner, os trabalhos de resgate ainda estão no início e outras peças já estão sendo recuperadas, e a expectativa é de que muita coisa ainda seja encontrada.
“Por exemplo, os dentes de tubarão.
Tínhamos uma coleção maravilhosa.
E estava em uma sala em que ainda não entramos.
Kellner informou ainda que já está se movimentando para buscar o apoio do governo do presidente Jair Bolsonaro ao Museu Nacional.
“Queremos mostrar nosso plano a ele.
O Museu Nacional não está à deriva.
E a maior prova é esta exposição”, afirmou.
Importância estratégica
O Paleoantar é um projeto do Museu Nacional vinculado ao Programa Antártico Brasileiro (Proantar).
Voltado para exploração científica do continente gelado, o programa existe desde 1982 e é desenvolvido com apoio operacional da Marinha e financiamento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e de instituições de fomento à pesquisa.
A primeira vez que pesquisadores do Paleoantar participaram de uma expedição do Proantar foi em 2006.
Somente 10 anos depois, os paleontólogos do Museu Nacional voltaram à Antártica, mas, desde 2016, todos os anos, o Paleoantar tem integrado as expedições do Proantar.
Os trabalhos de campo têm sido realizados nas ilhas James Ross, Snow e Vega, na península antártica.
Neste momento, há uma equipe por lá.
Kellner afirma que o investimento neste tipo de pesquisa é de importância estratégica.
O Paleoantar é financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“A Antártica é objeto de cobiça de vários países. Somente vão opinar sobrr o que vai acontecer futuramente com o continente aqueles países que tiverem pesquisa lá”, afirmou.
JB