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DISCURSO DE POSSE PRESIDÊNCIA DA COMAB – 2017

Grão Mestre do Goba e presidente da Comab 2017/2018 Gilberto Lima da Silva

O presidente eleito da COMAB, 2017/2018, o Grão Mestre do GOBA, irmão Gilberto Lima da Silva, na solenidade de posse, em sessão magna da Confederação Maçônica do Brasil, emocionou a todos com uma e emocionante narrativa literária, confirmando, indiscutivelmente, que tudo é possível quando que se tem determinação e bons costumes.

A narrativa

Sereníssimo Irmão João Krainsky Neto, Presidente de Honra da COMAB;

Excelentíssimo Senhor José Ronaldo de Carvalho, Prefeito Municipal de Feira de Santana;

Sereníssimo Irmão Jair Tércio Cunha Costa – Grão-Mestre da Grande Loja Maçônica do Estado da Bahia;

Soberanos, Sereníssimos e Eminentes Irmãos Grão-Mestres, Grão-Mestres Adjuntos e Grão-Mestres de Honra;

Poderosos Representantes das Ordens Paramaçônicas DeMolay, Filhas de Jó, Shriners International e Estrela do Oriente;

Sobrinhos e Sobrinhas;

Meus Irmãos;

Senhoras e Senhores Convidados, boa noite a todos!

Afirmam especialista ser a nossa língua portuguesa uma das mais ricas dentre todas aquelas faladas pela humanidade.

Dizem, por exemplo, ser a única a possuir uma palavra para definir um sentimento de angústia motivada pela distância ou pela perda de um ente querido: saudade.

Entretanto, há momentos em nossas vidas que, mesmo na rica língua portuguesa, parece não haver vocábulos suficientes para traduzir, com exatidão, nossos sentimentos.

Este momento aqui e agora, para mim, é um deles.

Enquanto olho para cada um de vocês, meus amigos, meus Irmãos, muitas palavras poderiam ser pronunciadas, mas, com certeza, seriam insuficientes para dimensionar algo tão abstrato como são os sentimentos que agora experimento.

Se eu recorresse ao vernáculo brasileiro típico, até encontraria alguns termos que poderiam ser utilizados neste momento para tentar lhes dizer o que sinto.

Poderia recorrer a palavras com profundo significado abstrato como: felicidade, gratidão, realização, responsabilidade, expectativa, compromisso, comprometimento, por exemplo.

Mas, como aplicar cada uma delas para dimensionar exatamente o que sinto?

Se eu recorrer ao vocábulo felicidade, por exemplo, ficará difícil saber se o que eu sinto é o mesmo que vocês percebem diante da minha afirmação.

Então, se me permitem, recorrerei a um artifício que costumo utilizar quando quero ser claro o suficiente: conto uma história e, a partir dela, me faço entender.

A história que lhes contarei é fato, aconteceu de verdade, mudarei apenas os nomes dos personagens por motivos que os Senhores entenderão no final.

É a história de um personagem de origem humilde e procedência Nordestina. Eu poderia chamar o personagem da nossa história de Zé, Tonho, Chico, ou tantos outros nomes comuns em nosso Território, sobretudo aqui no Nordeste.

Vou preferir então chama-lo de Chico, por razões que, também, entenderão mais adiante.

Muito bem: Chico nasceu no ano de 1959, na zona rural, num local bem isolado do interior do Nordeste.

Quando digo local isolado, quero dizer que inexistia qualquer contato do nosso personagem com costumes ou atividades da civilização moderna tal como as conhecemos hoje.

Primogênito de uma família de sete filhos, Chico, embora hoje trabalhe na área de tecnologia, até os onze anos de idade ele desconhecia, por exemplo, que existisse a televisão.

Como ele tinha um Tio que costumava se aventurar pelo Brasil a fora, ouvira dele o que seria um telefone: um aparelho que permitia que alguém falasse com outro, mesmo estando à distância.

E, depois de ouvir esses relatos, Chico ficava a imaginar no seu mundinho pequeno, porém feliz, como seria esse tal aparelho e como devia de funcionar. Internet, então, nem passava pela sua imaginação.

Nunca tinha visto um carro em sua vida. A não ser carroça e carro de boi. Ou burrico, seu mais comum meio de transporte.

Não havia nas redondezas, qualquer possibilidade de estudar, porque não existiam escolas. Portanto, aos onze, quase doze anos de idade, Chico era completamente analfabeto.

Então, em 1969, a Matriarca da família decidiu e convenceu seu marido que deveriam sair dali e buscar estudos para os seus filhos.

E aí, sem qualquer tipo de planejamento prévio, sem possuir nenhuma formação profissional que lhe garantisse a sobrevivência em uma cidade grande, o Pai de Chico vendeu seu pequeno sítio, com todas as benfeitorias nele existentes, incluindo os cavalos, bodes, vacas, porcos e galinhas que possuíam e, num início de noite, colocou os filhos e os pertences pessoais que lhe restaram em um carro de bois e rumou para a “rodagem” para, dali pegar um “pau-de-arara” que os levasse a uma determinada cidade grande que eles haviam previamente escolhidos.

O Chico, nosso personagem que, junto com seus Irmãos menores, adormeceu aos solavancos do carro de bois rodando nos caminhos esburacados, só acordou quando do embarque no caminhão que os levaria ao seu destino, dormindo logo em seguida.

Afinal, era madrugada. Voltou a acordar, já no raiar do dia, ao embarcarem num ônibus tipo Marinete rumo ao seu novo lar, num bairro da periferia, bastante afastado do grande centro daquela cidade.

As primeiras impressões do Chico sobre uma cidade foram visuais e olfativas: como sentarem-se na última poltrona daquele ônibus, a visão assustadora daquele carro que lhe parecia gigantesca lhe ofereceu muitos sopapos e solavancos durante o longo percurso.

Incomodava-o ainda o forte cheiro que, muito tempo depois, descobriu ser carbureto, que era transportado por outro passageiro.

Ao chegarem à nova casa, um misto de êxtase pela aventura vivida desde a partida até aquele momento, somada à saudade do seu habitat e, ainda, a frieza dos vizinhos que, àquela altura eram meros desconhecidos, lhe invadiu o peito.

Poucos dias depois o nosso Chico viveu uma nova e inesperada aventura em sua vida: sua genitora o havia matriculado num grupo escolar e chegara o momento do seu primeiro dia de aula.

E lá se foi nosso personagem com um chapéu de palha na cabeça (este item do vestuário fazia parte do seu antigo cotidiano), os pés descalços, vestia sua melhor camiseta combinando com uma bermuda que, por possuir um rasgão nos fundilhos, fora prévia e carinhosamente remendado por sua protetora mãe.

Pronto: estava inventado o “bullying”.

Na escola aquele menino tímido e trajado completamente diferente do que era considerado normal, foi alvo de todo tipo de troça que os Senhores possam imaginar.

Até corredor polonês ele enfrentou.

Se o Maurício de Souza tivesse conhecido o nosso personagem, poderíamos dizer que nele se inspirou para criar o Chico Bento dos gibis.

Com exceção da malandragem de roubar goiabas do Nhô Lau e da extrema preguiça com os estudos que o Chico Bento demonstra, no restante são muito parecidos. Mas, é só coincidência. O Maurício de Souza nunca conheceu nosso personagem.

Apesar dessa estreia terrível, o nosso Chico era muito esforçado e dotado de alguma inteligência e, com isso, em pouco tempo se safou daquelas humilhações porque demonstrou grande aptidão pela aprendizagem.

O Chico frequentava uma classe multiserial, onde crianças de 1ª à 4ª série conviviam na mesma sala de aula, com uma única Professora atendendo a todos.

No final daquele primeiro ano 1970, com doze anos de idade, Chico já havia cursado duas séries num único ano, conquistando assim o respeito dos Professores e dos Colegas, antes seus algozes.

Mas as dificuldades não foram somente para o Chico. Também a sua família, que chegou à cidade grande completamente despreparada e desacostumada com o novo habitat, começou a sofrer as consequências: como viviam com os pés descalços, por força do hábito rural, começaram a ficar doentes.

Por outro lado, seu Pai, sem nenhuma qualificação profissional, não conseguia um emprego para garantir o sustento da família, e o pouco dinheiro que trouxera esgotou-se.

Em pouco tempo estavam todos famintos, doentes e passando muitas necessidades.

Muitas foram às manhãs em que nada havia para ser servido.

Então, a Matriarca fazia uma panela com uma boa quantidade de café ralo e o servia à família, misturado com farinha de mandioca.

Tinha alguns dias que aquela era a única refeição até o dia seguinte. Outras vezes, os vizinhos sabendo das dificuldades enfrentadas por aquela honrada família, lhes ofereciam a solidariedade com a oferta de alguns ingredientes ou mesmo comida pronta.

Certa feita, o nosso personagem descobriu que, nas proximidades do seu bairro havia um frigorífico que abatia bois e, ao redor deste, havia salgadeiras que preparam os couros para viajarem ao curtume mais próximo.

Devido ao abate mecanizado, alguns nacos de carne ficavam presos aos couros e os magarefes os retiravam e jogavam a um canto, antes de salga-los. E Chico recolhia, com frequência, aqueles nacos de carne para servir de alimento à sua família.

Ali, a dor da fome dava lugar à dor da perda da dignidade ao ser maltratado e humilhado pelos funcionários daquelas salgadeiras, que o tratava como mendigo ou como cachorro sarmento.

Outro momento de grande tristeza na vida de Chico e de seus Irmãos era o Natal.

Ao amanhecer seus amiguinhos apareciam sorridentes com os presentes que Papai Noel houvera deixado sob suas janelas e eles, nossos personagens nada recebiam.

Os dias seguintes eram de tristeza, pois ficavam a se perguntar: o que fizeram de errado para Papai Noel nunca se lembrar deles?

Não diziam que Papai Noel sempre se lembrava das crianças boazinhas?

Então, eles eram más e estavam sendo castigados?

Naquela típica família brasileira, fruto do êxodo do sertão para a cidade grande, havia uma saudável preocupação e cuidado com a manutenção dos valores morais e com a formação dos filhos.

Enquanto um cuidava da educação, o outro zelava pela formação.

O Pai, rigoroso em seus posicionamentos, não permitia nenhuma transgressão ética, por menor que fosse.

Dizia sempre: “exija o que é seu, mas, jamais, deseje o que não lhe pertence por direito”.

Se um dos filhos chegasse a casa com algo – por mais simples que fosse – dizendo que achou em algum lugar, ele, imediatamente dizia: “volte lá e coloque onde você achou. Quem o perdeu vai procurar”.

Já a Mãe zelava religiosamente pela formação escolar. Fazia sacrifícios pessoais, se necessário (e muitas vezes era necessário) para que nada faltasse na vida escolar dos seus filhos.

Não admitia que um filho seu faltasse à escola, sob nenhum pretexto.

Bom, apesar de todas aquelas dificuldades que a família enfrentava, o Chico continuava a estudar e obter notas excelentes. Concluiu o primário, fez exame de admissão e entrou para o ginásio. Só que agora, apesar dos seus Pais já estarem trabalhando – inclusive sua genitora que precisou auxiliar seu parceiro para complementar a renda – os livros escolares eram caros e ele, Chico, também precisava trabalhar.

Então, saía de casa às 05h00 da manhã e ia ao trabalho levando sua marmita, o uniforme e os livros escolares. Para chegar ao local de trabalho, caminhava por duas horas, pois não havia transporte público que permitisse chegar a tempo ao trabalho.

Almoça sua marmita e, ao encerrar o expediente profissional, se dirigia à escola sem poder jantar e ali permanecia até a última aula que terminava às 23h45.

Depois, caminhava até sua casa para dormir algumas poucas horas e, novamente recomeçava a rotina.

Chegou um momento que Chico não mais aguentou a jornada e, influenciado por amigos que lhe dizia que estudar era coisa de burguesia, desistiu de vez de estudar, abandonando antes de concluir o ensino médio, dedicando-se somente ao trabalho.

Entretanto, jamais deixou de estudar, sozinho, como autodidata.

Passadas algumas décadas, nos dias atuais, aquela família vive novos ventos. Quase todos os Irmãos do Chico estão com carreiras profissionais consolidadas. Os poucos que não conseguiram, foi porque não quiseram.

A oportunidade foi a mesma para todos. Para os primeiros, o esforço da Matriarca valeu a muito pena: há entre eles uma Doutora em Pedagogia, com PhD em linguística, um suboficial militar, um publicitário, e o nosso personagem, o Chico, que mesmo tendo que desistir de estudar para trabalhar (embora não se orgulhe nem um pouco disso) pode oferecer conforto e estudo de qualidade aos seus dependentes. Tudo valeu a pena.

Senhoras e Senhores, meus Irmãos: aquela corajosa mãe de família que muitas vezes se anulou para garantir o acesso dos seus filhos à formação educacional, mesmo sendo apenas semialfabetizada, encontra-se aqui hoje entre nós: D. Helena Carneiro Lima. E o Chico é este humilde Irmão que vos fala.

Acho que agora ficará mais fácil eu me fazer entender:

Quando falo da felicidade que sinto neste momento, vocês podem avaliar que o tamanho dela é de alguém que vivenciou e sofreu na pele a narrativa que acabo de fazer e que, contrariando as melhores expectativas possíveis, conseguiu não apenas superar todas as dificuldades que a vida lhe ofereceu, mas, ainda, tornar-se Maçom.

Algo que por si só já é invejável para a maioria dos brasileiros. Ainda, conseguiu ter a oportunidade de Presidir uma Confederação, liderando 22 outros Grão-mestres e, consequentemente, algumas dezenas de milhares de Maçons espalhados por este enorme e amado Brasil.

Quando falo de gratidão, estou falando de render homenagens a todos os que me proporcionaram oportunidades.

Sem elas, eu não conseguiria superar tudo sozinho.

Então, quero agradecer primeiro à minha mãe, por sua garra e determinação em proporcionar aos seus filhos algo que não teve: o acesso à educação.

Quero agradecer às minhas Tias e Tios que sempre me orientaram. Agradecer à minha Esposa Marinalva, que tem sido companheira, compreensiva com minhas ausências para servir à Ordem Maçônica e que tem sido a minha fortaleza nos momentos em que minha insegurança me flexiona para o fracasso.

Gratidão às minhas duas filhas Deborah e Giselma que me fizeram firmar um ideal de lhes proporcionar o que não pude concluir: o estudo acadêmico.

Hoje, as duas me orgulham por terem, indiretamente, realizados o meu sonho de concluir uma faculdade.

Agradecer aos meus Netos: Gilberto, que estuda nos EUA, Brehna, que faz medicina em Buenos Ayres, Yasmin, que sempre me inflama a autoestima com suas demonstrações de admiração, às pequeninas Ana Melissah e Lívia, pelas alegrias que me proporcionam.

Gratidão aos meus Irmãos Maçons que ajudaram a construir minha trajetória pessoal, me ensinando a – aceitando desafios – , me superar sempre. Gratidão aos Grão-Mestres Antonio de Brito Dantas, do Rio Grande do Norte e Lázaro Emanuel Franco Salles, de Minas Gerais, por cogitarem e trabalharem a hipótese de eu vir a Presidir esta Confederação.

Gratidão ao Grão-Mestre Noê Paulino de Carvalho, do Maranhão, que, sendo sua vez de ser o Presidente da COMAB, abdicou em meu favor.

Gratidão à parceria permanente do meu colega Grão-Mestre da Grande Loja da Bahia, Jair Tércio Cunha Costa, inclusive pelos ensinamentos que me proporciona.

Gratidão a todos os Irmãos do Grande Oriente da Bahia – GOBA que muito tem me ensinado.

Quando falo de realização estou querendo dizer que tal qual escreveu o poeta, me sinto realizado porque já produzi filhos e netos, já plantei árvores e já escrevi livros. Inclusive, estou ajudando a escrever, neste momento, o Livro da Confederação Maçônica do Brasil.

Quando falo de responsabilidade, quero dizer que tenho plena convicção de que tenho que garantir, como Presidente desta importante organização que é a Maçonaria, as conquistas até aqui obtidas, que foram feitas à custa do sacrifício de muitos abnegados Irmãos que me antecederam, aos quais não tenho o direito de decepcionar.

Quando falo de expectativa, quero dizer que espero corresponder àquilo que meus Pares que formam o Colegiado da COMAB, meus Grão-Mestres e meu Povo Maçônico esperam de mim.

Darei o melhor de mim para que suas expectativas sejam atendidas. Mas, ao mesmo tempo, peço antecipadas desculpas, se vier a fraquejar, falhar ou decepcionar.

Quando falo de compromisso, estou falando do Plano de Trabalho que foi apresentado, discutido, e aprovado na Assembleia que antecedeu esta Solenidade e que transcorreu durante todo o dia de hoje.

Também estou falando do compromisso que tenho com a minha Pátria de lutar para a melhoria da educação básica, único caminho capaz de tornar o Brasil um país, realmente, do futuro.

Finalmente, quando falo de comprometimento, me refiro ao meu engajamento na busca por um futuro melhor para o nosso País. Entendemos que, apesar do estado terminal que passa o Estado Brasileiro, corroído pela corrupção generalizada, há que se fazer algo por ele. Fica aqui, publicamente, o compromisso de lutarmos de forma aguerrida pela verdadeira reforma política.

O compromisso de estabelecermos, em conjunto com a sociedade organizada e uma saudável discussão contra a carga tributária exacerbada sem a necessária contrapartida dos serviços do Estado ao Cidadão.

O compromisso de, enquanto representante de um grupo formador de opinião, rediscutirmos o Pacto Federativo e a reforma tributária e fiscal.

Sabemos meus Irmãos e Amigos, dada à grandeza da nossa Pátria, existe não apenas uma luz no fim do túnel, mas toda a luz que o Supremo Arquiteto do Universo disponibiliza e que nós havermos de busca-la para a felicidade geral da Nação e do Povo Brasileiro.

Tenho dito!

Gilberto Lima da Silva

Grão-Mestre do GOBA

Presidente da COMAB 2017/2018

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