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Para líderes cristãos, impeachment de Bolsonaro é dever histórico

Lideranças religiosas pedem impeachment de Bolsonaro

O pedido de impeachment contra Jair Bolsonaro (sem partido) protocolado na Câmara dos Deputados, na semana passada, por lideranças de diferentes religiões cristãs, teve o apoio de católicos, anglicanos, luteranos e evangélicos.

A transmissão teve a participação das pastoras Romi Márcia Bencke e Lusmarina Campos Garcia, do padre Manoel Godoy e do bispo Dom Valdeci Santos Mendes. A conversa foi mediada pelo Frei Sérgio Gorgen.

Na abertura, Gorgen afirmou que “a intenção dessa atividade foi trazer para a sociedade ponderações acerca da responsabilidade coletiva com a vida do povo brasileiro e chamar a atenção às ações genocidas do presidente Jair Bolsonaro”.

Para ele, além do debate político, o afastamento de Bolsonaro deve ser tratado como uma urgência humanitária: “as posturas de Bolsonaro demonstram que ele não tem compromisso com a vida do povo brasileiro, agravam a crise sanitária, ampliam as dificuldades de acesso à saúde e impedem investimentos nas áreas para atendimento da população”.

O bispo católico Dom Valdeci, da diocese do Brejo (Maranhão), relembrou as palavras do Papa Francisco que desafiam a “indignar-se”, a não guardar silêncio frente às “situações tão desafiadoras que estamos vivendo”.

Para além da epidemia, destacou o aumento do número de pessoas em situação de rua, os ataques constantes praticados contra os povos tradicionais e o aumento da miséria. “É preciso que tenhamos respostas!”, enfatizou.

Lusmarina Campos Garcia, pastora da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IELCB), salientou a força coletiva e repercussão do pedido de impeachment. Segundo ela, dois motivos reforçam a ação.

“O primeiro é que não é um pedido feito a partir de partidos políticos, ou seja, vem de uma categoria representativa da sociedade, o que demostra a urgência da situação, onde as pessoas veem nesse pedido uma representação de suas próprias angustias; o segundo diz respeito a quebra do apoio hegemônico de que todo cristão apoia Bolsonaro.”

Por usa vez, o padre católico Manoel de Godoy, de Minas Gerais, lembrou que “a participação ativa de lideranças do campo religioso são uma constante em diversos momentos históricos recentes: a resistência à ditadura, a mobilização pela redemocratização e a Constituinte foram os fatos citados pelo religioso que integra os grupos Padres da Caminhada e Padres Contra o Fascismo”.

Na sua opinião o momento é grave e requer posicionamentos firmes: “como nossas igrejas têm compromisso com a vida, diante de alguém que não respeita a vida é claro que tínhamos que nos manifestar, fortalecer essa questão da nossa unidade em defesa da vida em todas as circunstâncias e nesse momento mais que nunca”.

Dever histórico

A secretária geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs no Brasil (CONIC), a pastora luterana Romi Bencke, explicou que o pedido de impeachment é “um compromisso profético e dever histórico com a humanidade, a nossa fé não nos permite silenciar”.

Segundo ela, os números – até o momento da transmissão eram cerca de 220 mil mortes no Brasil – desafiam as igrejas a não ficarem caladas e reabrem um debate necessário acerca do posicionamento político de cristãos e cristãs diante do atual governo.

“Ainda existe um senso comum que diz que as pessoas cristãs são as responsáveis pela eleição de Bolsonaro e nós estamos aqui afirmando que não, afirmamos que entre cristãos e cristãs existe pluralidade e com esse pedido de Impeachment delimitamos muito bem essa fronteira.”

Frei Sérgio destacou que os signatários do 63º pedido de impeachment contra Bolsonaro caminham em direção a um reencontro com uma Teologia de Libertação, divergindo dos adeptos da chamada “Teologia da Prosperidade”, que fundamenta ações em busca de poder e influência política.

“O motivo da petição não é para as igrejas tomarem o poder, mas pelo papel que as igrejas têm como representações do Cristo vivo em defesa da vida.”

Dom Valdeci concordou: “Não podemos ficar assistindo o massacre de vidas. Como organismos que lutam em defesa da vida, como organismos do povo de Deus é nosso dever lutar em defesa da vida e continuar os sonhos nessa caminhada, junto com as demais pastorais, entidades e movimentos sociais”.

Ele destacou ainda que “é preciso oferecer a nossa solidariedade aos povos, estando perto dos excluídos, junto de quem seus direitos foram negados”.

Números da pandemia

Sobre a omissão de Bolsonaro frente à pandemia, elemento fundamental na argumentação pelo impedimento, Lusmarina destacou que “o país ocupa o terceiro lugar em número de contaminação pela covid-19 e o segundo em número de mortes causado pelo vírus, o que implica dizer que, se as medidas cabíveis tivessem sido tomadas em tempo pelo governo federal, não teríamos chegado ao estado que estamos”.

Citando de modo especial a situação do esgotamento do sistema de saúde em Manaus e a falta de oxigênio nos hospitais para atender as necessidades de doentes internados, a pastora apresentou dados de uma pesquisa feita pela USP que mostra que as atitudes do governo federal são sabotadoras das políticas públicas sanitárias.

“Se tivéssemos uma representação presidencial preparada e que respeitasse a vida do povo, com certeza não teríamos chegado à situação que chegamos hoje”, afirmou.

Padre Godoy estendeu a crítica ao então presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que, segundo ele, “teria se tornado um engavetador de pedidos de impeachment, pedidos sérios, feitos com motivos sérios, por organizações muito sérias”.

Reafirmou os motivos que fundamentam o pedido que ajudou a subscrever: “Por que o impeachment de Bolsonaro?

ele é o incentivador de aglomerações, faz campanha contra vacina, faz campanha em favor de medicamentos que não têm comprovação alguma cientificamente no combate a covid, não tem projeto público sanitário para o país, é um verdadeiro genocida”.

Defesa da vida

Todos manifestaram confiança de que o pedido de impeachment desenvolvido pela Associação Brasileira dos Juristas pela Democracia (ABJD) e subscrita pelas lideranças religiosas cristãs, testemunhado por artistas, lideranças religiosas de outras matrizes, movimentos sociais e organizações populares, tem potencial para seguir repercutindo e inclusive alcançar seu objetivo final.

“Sobre as perspectivas, em primeiro lugar devemos continuar falando bastante sobre o conteúdo do pedido que destaca o crime de responsabilidade do governo Bolsonaro em relação a gestão da crise, potencializada pela pandemia”, assinalou Romi.

“A gente sabe que a desigualdade, o racismo, as diferenças territoriais sempre existiram em nosso país, não foi a pandemia que provocou isso, no entanto potencializou crises provocadas por um sistema estrutural de desigualdades e quem ocupa o espaço de poder tem a responsabilidade de tomar decisões de minimizar os impactos provocados por essa pandemia”, acrescentou.

“Esse governo fez uma opção contrária do que significaria o cuidado com o povo, é preciso responsabilizar as mortes do povo.” Concluiu, citando que além de Bolsonaro, os militares que o apoiam, o vice-presidente Mourão e os ministros Pazuello, Salles e Guedes devem arcar com sua parcela de culpa.

Dom Valdeci encerrou o ato virtual chamando a sociedade a apoiar o pedido de impeachment: “Estamos nesse caminho de luta em defesa da vida, em uma construção longa nessa caminhada unidos no compromisso que é pra o povo não morrer”, afirmou.

“Eu acredito que o mundo será melhor quando o menor que padece acreditar no menor”, arrematando com a afirmação de que para as representações presentes o pedido de Impeachment de Bolsonaro é um ato de solidariedade pela defesa da vida do povo brasileiro.

Uma nova transmissão está sendo programada pelos subscritores do pedido de impeachment para a próxima sexta-feira (5), que será retransmitida pelo BdF/RS e pela Rede Soberania.

Marcos Antonio Corbari e Edcleide da Rocha Silva

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