Tempo - Tutiempo.net

Rússia diz ter matado líder máximo do Estado Islâmico: quem é Abu Bakr al-Baghdadi

Baghdadi saiu das sombras e apareceu em Mossul em junho de 2014

O Ministério da Defesa da Rússia informou nesta sexta-feira que um ataque aéreo pode ter matado o líder do Estado Islâmico (EI), Abu Bakr al-Baghdadi, e outros 330 combatentes. O alvo teria sido uma reunião do conselho militar do grupo em Raqq, no norte da Síria, realizada no dia 28 de maio.

Num comunicado publicado na agência de notícias estatal russa, Sputnik, o ministério afirmou que 30 comandantes e até 300 soldados do EI estavam na reunião. “De acordo com informações checadas por vários canais, o líder do EI, Ibrahim Abu-Bakr al-Baghdadi, estava presente na reunião e foi morto em consequência do ataque aéreo”.

No entanto, sua morte já foi divulgada outras vezes equivocadamente. O coronel John, porta-voz da coalizão americana de combate ao EI, disse que os EUA não conseguiram confirmar se Baghdadi de fato foi morto. Já o governo sírio não comentou o caso. A localização de Baghdadi é desconhecida há tempos.

A seguir o especialista William McCants explica como Baghdadi chegou ao posto máximo do grupo extremista.

Ferrenho religioso

Ibrahim Awwad Ibrahim al-Badri, também conhecido como Abu Bakr al-Baghdadi, nasceu em 1971 em Samarra, no Iraque, numa família sunita de classe média. Sua família era conhecida por sua religiosidade, e a comunidade acredita que ele seja descendente do profeta Muhammad.

Como jovem, Baghdadi tinha paixão por recitar o Corão e seguia meticulosamente a lei religiosa. Sua família deu-lhe o apelido de “O crente”, porque ele costumava repreender seus parentes por não seguir os padrões com rigor.

Baghdadi deu sequência a seus interesses religiosos na universidade, onde concluiu a graduação em estudos islâmicos na Universidade de Bagdá, em 1996, além de mestrado e doutorado em Estudos do Corão na Universidade de Saddam para Estudos Islâmicos, no Iraque, em 1999 e 2007, respectivamente.

Até 2004, Baghdadi passou seus anos de estudo vivendo no bairro de Tobchi, em Bagdá, com suas duas mulheres e seis filhos. Ele ensinava o Corão a crianças da vizinhança na mesquita local, onde também era a estrela de seu time de futebol.

Na época, seu tio o persuadiu a participar da Irmandade Muçulmana. Baghdadi rapidamente se aproximou dos poucos ultraconservadores violentos no movimento islâmico e, no ano 2000, abraçou o jihadismo salafista.

De ativista a insurgente

Em poucos meses da invasão liderada pelos EUA no Iraque em 2003, Baghdadi ajudou a fundar o grupo insurgente Jaysh Ahl al-Sunnah wa al-Jamaah (Exército de Pessoas da Suna e da Solidariedade Comunal).

Em fevereiro de 2004, as forças americanas prenderem Baghdadi em Faluja, no Iraque, e o encaminharam ao Camp Bucca – um centro de detenção clandestino de prisioneiros dos EUA no deserto no sul do Iraque, onde permaneceu por dez meses. Na prisão, Baghdadi dedicou-se a temas religiosos, liderando rezas e o sermão da sexta-feira, além de dar aulas a prisioneiros.

Segundo um colega prisioneiro, Baghdadi era calado, mas tinha a habilidade de se movimentar entre as facções rivais da unidade, onde se misturavam seguidores de Saddam Hussein e jihadistas.

Baghdadi formou alianças com vários grupos, que mantiveram contato quando ele foi libertado em dezembro de 2004. Depois de sua libertação, Baghdadi procurou o porta-voz da al-Qaeda no Iraque (AQI), uma afiliada local da al-Qaeda liderada pelo jordaniano Abu Musab al-Zarqawi.

Impressionado com o conhecimento religioso de Baghdadi, o porta-voz o convenceu a ir para Damascus, onde deveria trabalhar para que a propaganda do AQI aderisse aos princípios do islamismo ultraconservador.

Zarqawi foi morto em junho de 2006 por forças aéreas americanas e foi sucedido pelo egípcio Abu Ayyub al-Masri. Em outubro daquele ano, Masri dissolveu a AQI e fundou o Estado Islâmico (EI) no Iraque. O grupo continuou a prometer fidelidade à al-Qaeda.

O novo emir

Com credenciais religiosas e habilidade de conciliar os estrangeiros que fundaram o EI com os iraquianos locais que se reuniram ao grupo, Baghdadi cresceu progressivamente na hierarquia da organização.

Ele foi indicado como orientador do Comitê da Sharia e nomeado para o Conselho da Shura, de 11 membros, que aconselhava o emir do EI, Abu Omar al-Baghdadi.

Baghdadi depois foi indicado como coordenador do comitê do EI e gerenciava a comunicação com os comandantes do grupo no Iraque.

Após as mortes do fundador e do emir do EI em abril de 2010, o Conselho da Shura escolheu Abu Bakr al-Baghdadi para se tornar o novo emir. Baghdadi começou a reconstruir a organização, que tinha sido dizimada pelas forças de operações especiais dos Estados Unidos.

Esperando capitalizar a crescente crise na Síria em 2011, com a intenficação dos confrontos entre tropas do governo e grupos rebeldes que se insurgiam contra o presidente Bashar al-Assad, Baghdadi ordenou que um de seus agentes sírios estabelecesse um braço do EI no país, que mais tarde ficou conhecido como Frente al-Nusra.

Surgimento do EI

Baghdadi logo se desentendeu com o líder do al-Nusra, Abu Mohammed al-Julani, que queria colaborar com a principal corrente sunita de rebeldes lutando contra o governo sírio. Baghdadi queria estabelecer seu estado através da força antes de perseguir Assad.

Na primavera de 2013, Baghdadi anunciou que a al-Nusra fazia parte do EI, que ele renomeou como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).

Mais tarde, o dirigente da al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri, cobrou que Baghdadi reconhecesse a independência da al-Nusra, mas ele se recusou a fazê-lo. Em fevereiro de 2014, Zawahiri expulsou o EI da al-Qaeda.

O EI respondeu lutando contra a al-Nusra e consolidando seu domínio no leste da Síria, onde Baghdadi impôs leis religiosas duras. Com sua fortaleza segura, Baghdadi ordenou que seus homens se expandissem para o oeste do Iraque.

O califa

Em junho de 2014, o EI tomou a segunda maior cidade do Iraque, Mossul, e logo depois, o porta-voz do grupo proclamou o retorno do califado, renomeando o EIIL de volta como “Estado Islâmico”. Dias depois, Baghdadi pregou um sermão de sexta-feira em Mossul e se autodeclarou um califa – o chefe de Estado de um governo islâmico.

Se confirmada a morte de Baghdadi, a organização perderá seu habilidoso mediador, político implacável, religioso erudito e homem de linhagem nobre – uma combinação incomum para um líder de uma organização militante global, muito menos para um quase-Estado.

William McCants

OUTRAS NOTÍCIAS