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Pesquisadores financiados pelo CNPq podem ficar sem bolsas a partir de outubro

João Luiz Filgueiras, presidente do CNPq desde 1º de fevereiro, afirma que o orçamento de 2019 definido na LOA só garante o pagamento de bolsas de pesquisa até setembro — Foto: Marcelo Gondim/CNPq

O orçamento confirmado para 2019 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) só garante dinheiro para pagar as bolsas de pesquisa até setembro, afirmou em entrevista João Luiz Filgueiras de Azevedo, presidente do órgão. Ele explica que, além de a verba para este ano ter sofrido redução em comparação com o ano anterior, parte do dinheiro para 2019 foi usada para o pagamento das bolsas referentes a dezembro de 2018.

Azevedo estima que o CNPq necessite de cerca de R$ 300 milhões para conseguir fechar as contas de 2019, considerando tanto a redução orçamentária quanto os cerca de R$ 80 milhões do orçamento deste ano que foram usados para pagar contas do ano anterior.

“Nesse momento, é correta a afirmação. [O orçamento] paga integralmente as bolsas até setembro. De outubro em diante certamente não paga tudo, provavelmente paga muito pouco”, disse o presidente do CNPq.

O problema, porém, pode ser ainda pior, já que, na sexta-feira (29), o governo federal anunciou um contingenciamento de R$ 2,13 bilhões no Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

Alertas desde 2018

Desde a discussão da lei orçamentária anual, no segundo semestre de 2018, o valor abaixo do esperado para 2019 já acendia sinais de alertas. Mas, segundo o atual presidente, os diferentes cenários possíveis caso o dinheiro das bolsas de fato termine antes do fim do ano ainda não estão sendo levantados.

Azevedo explicou que o CNPq conta com o apoio do ministro Marcos Pontes, para tentar reverter o problema:

“O ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações e Comunicações está plenamente consciente disso, sabe do problema e, mais do que isso, está trabalhando para tentar reverter. Então não é um problema do qual o CNPq está desesperado atrás, não estamos sozinhos. Nosso ministro está na luta.” – João Luiz Filgueiras de Azevedo, presidente do CNPq

Azevedo diz, porém, que ainda não recebeu notícias do MCTIC sobre como a pasta vai repassar o contingenciamento anunciado pelo governo federal.

Quedas consecutivas do orçamento

Dados do CNPq mostram que esse é pelo menos o terceiro ano consecutivo de queda na verba destinada ao pagamento de bolsas. De 2018 para 2019, nas demais áreas, como gastos de administração e de fomento à pesquisa, houve um aumento no orçamento. Porém, o orçamento global do CNPq teve uma perda em valores absolutos de R$ 142,6 milhões, considerando os valores do orçamento do ano passado corrigidos pela inflação acumulada até janeiro deste ano.

“Estou cautelosamente otimista de que a gente vai conseguir reverter a situação, porque existe um empenho grande do nosso ministro. Mas concordo que em breve a gente vai ter que começar a ver o cenário do que a gente faz se chegar nessa situação”, resumiu Azevedo.

Quase 80 mil bolsistas

O G1 teve acesso a números do CNPq relativos a fevereiro deste ano, quando o conselho registrou 79.749 bolsistas – o número flutua conforme novos bolsistas são incorporados, ou antigos bolsistas concluem suas pesquisas. Metade deles recebem bolsas de iniciação científica ou tecnológica, que têm valores entre R$ 100 e R$ 400. Considerando o número de bolsistas nesses programas e o valor das bolsas, o CNPq gastou cerca de R$ 13 milhões com 40.383 bolsas naquele mês.

O segundo maior grupo em número de bolsistas é o da pós-graduação (mestrado e doutorado no Brasil). No total, 8.708 mestrandos recebem R$ 1.500, e 8.215 doutorados têm bolsa de R$ 2.200 por mês. Em fevereiro, o CNPq repassou cerca de R$ 31 milhões a esses 16.293 pesquisadores.

Outros 15.232 pesquisadores recebem bolsas de produtividade e recebem entre R$ 1.100 e R$ 1.500 por mês.

Os demais bolsistas são das modalidades de pós-doutorado, bolsas tecnológicas ou de extensão, apoio técnico à pesquisa, programa de capacitação institucional e outras bolsas, como atração de jovens talentos e desenvolvimento tecnológico.

Há ainda 868 bolsistas do CNPq desenvolvendo pesquisas no exterior, mas o valor varia de acordo com o país de destino.

Valores defasados

Nem todas as modalidades têm valores definidos de forma detalhada no site do CNPq e, em alguns casos, o valor varia de acordo com subgrupos. As modalidades detalhadas, como as de iniciação científica, pós-graduação, produtividade, pós-doutorado e tecnológicas, somaram 77.106 bolsistas em fevereiro. No caso dos bolsistas de produtividade e de alguns tipos de pós-doutorado e bolsas tecnológicas, os valores pagos variam.

Um cálculo que considera que cada um deles recebeu apenas o valor mínimo estabelecido mostra que o CNPq gastou em fevereiro pelo menos R$ 68,8 milhões para manter essas pesquisas.

Mesmo assim, esses valores estão defasados há anos. Um levantamento feito pela Associação Nacional de Pós-Graduandos mostra que o último reajuste nas bolsas de mestrado e de doutrado aconteceu em 2013.

Desde então, a inflação acumulada chegou a 42,6% até fevereiro de 2019, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Caso fossem reajustadas de acordo com o índice, as bolsas de mestrado chegariam a R$ 2.139,77 e as de doutorado, a R$ 3.138,33.

Segundo Azevedo, para este ano não é possível reajustar os valores das bolsas de pesquisa, já que o orçamento, segundo ele, “está posto”, ou seja, já foi sugerido pelo Executivo e debatido pelo Legislativo durante o ano passado.

Ana Carolina Moreno

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