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Série sobre educação mostra escolas inovadoras e transformadoras no Brasil.

Bastidores da gravação da série "Sementes da Educação", que mostra escolas inovadoras e transformadoras — Foto: Divulgação/Oz Produções

“Se a sala está muito silenciosa está errado porque o conhecimento tem que vir da comunicação.” A frase é de um professor de uma das 13 escolas retratadas pela série documental “Sementes da Educação”, que mostra exemplos e propostas inovadores de educação em vários cantos do Brasil.

A série, da produtora são carlense OZ, foi veiculada pelo canal Cine Brasil TV no ano passado e, este ano, passou a ser disponibilizada na plataforma digital Videocamp, disponível gratuitamente para exibições em grupos.

“A gente sempre teve a intenção de trabalhar com conteúdos voltados para educação, entendendo que a evolução da educação é importante para a evolução do nosso país”, explicou o diretor da Oz, Hygor Amorim.

O objetivo da série é mostrar iniciativas regionais de educação inovadora e de qualidade que sirvam de inspiração para outras escolas e professores.
“Tem um caminho muito grande para ser percorrido e este tipo de conteúdo, que gera possibilidade de inovação em educação, pode ajudar a promover mais iniciativas inovadoras dentro de escolas”, afirma Amorim.

O mapeamento de escolas inovadoras e transformadoras de todo Brasil contou com especialistas em educação, entre eles Caio Dib, CEO do Caindo no Brasil – portal de conteúdos para inovação na educação no Brasil, a psicóloga e educadora Rosely Saião e filósofo e educador Celso Vasconcelos. Eles também participam do documentário.

Todas as escolas selecionadas são públicas e reconhecidas pelo Ministério da Educação (MEC). Há instituições em locais simples, pobres, de difícil acesso, em capitais, cidades do interior, litoral e áreas rurais. Os exemplos vão do de ensino infantil até superior, além de Ensino de Jovens e Adultos (EJA).

“Escolhemos escolas que não tinham tido espaço na mídia, exatamente para mostrar que as pequenas escolas conseguem inovar. Um exemplo vindo de uma escola pequena, que não teve visibilidade e que ainda não teve o reconhecimento merecido, estimula mais que outras escolas do mesmo tamanho possa dar início ao processo de mudança”, afirma o diretor.

Força de vontade e vontade e mudar

Há diversidade também de linhas pedagógicas, mas a maioria não segue apenas uma e acaba unindo diversas pedagogias de ensino, criando a sua própria maneira de ensinar o conteúdo programático estabelecido de acordo com a realidade dos alunos e da comunidade e é isso que os idealizadores da série esperam despertar em outras escolas.

“Elas bebem de várias fontes, olham para o contexto delas e criam sua própria forma de educar. A série não é uma receita de inovação, é uma inspiração. Nenhuma dessas iniciativas deve ser repetida em outros lugares porque tem que considerar o contexto. Você pode se inspirar para fazer as perguntas, mas as respostas serão outras”, diz Amorim.

“A gente entende que a formação dentro da escola não pode ser só a formação intelectual, de conteúdos. São seres humanos e têm várias dimensões que precisam ser percebidas e cuidadas”.
— Catarina Matos – EEEP Alan Pinho Tabosa – Pentescoste (CE)

Outra característica comum nessas escolas documentadas é a vontade de proporcionar o melhor ensino. “O que elas tinham de semelhante era a força de vontade das pessoas que estavam trabalhando nelas”, afirma a produtora Amanda Castro.

“Surgiram da vontade de mudar. O ensino era travado, eles tinham vontade de melhorar o ensino para as crianças. A maioria das escolas foi iniciativa de professores, diretores coordenadores que queriam mudar a forma de ensinar e conversaram com a prefeitura e o MEC para ter respaldo de mudança”, completa Amorim.

Troca

O diretor conta que uma diferença clara dessas escolas é a liberdade dada aos alunos que era respondida com maior engajamento. Em alguns casos, eles propunham os temas a serem debatidos.

“Eles [alunos] tinham um envolvimento muito maior, eles tinham vontade de aprender, eles tinham vontade de estar em sala de aula porque não era sala enfileirada, era uma sala de aula que dava espaço para aprender.

Dependendo da pedagogia, ele tinha influência no conteúdo que ele ia estudar, isso torna mais atraente para ele”, afirma.

Em várias ocasiões os professores assumem papel de mediadores, fugindo do estereótipo das escolas onde somente os professores falam.

“A diversidade de pessoas e de atividades é para poder ajudar a criança a ser mais feliz, mais consciente. A criança nasce querendo aprender e a escola tradicional vai ensinando para ela que aprender não é tão bom, copiar é melhor”.
— Tia Rô – Escola Pluricultural Ode-Kayodê – Goiás (GO)

“Para o professor, o ideal é que todo mundo pense igual, aprenda ao mesmo tempo e tire as notas no mesmo padrão. Se você desenvolver a autonomia e a individualidade dos alunos, respeitando as diferenças, o tempo de aprendizado de cada um, o interesse de temas diferentes, o professor tem mais trabalho, porque ao invés a classe como um grupo só uma só, ele vê o aluno como um só.”

“A série mostra que a liberdade nem sempre é uma cosia ruim. Porque a gente acha que a escola pública vai ser uma baderna, que não tem regra, que alunos desrespeita professor, que professor não consegue ter o controle da sala de aula, e não é por aí, a gente mostrou com a série que você dando liberdade em alguns contextos específicos é muito interessante para o aprendizado da evolução daquele ser humano que é uma criança, mas que amanhã terá uma responsabilidade social”, diz Lígia Di Nardo, da Oz.

São escolas que trabalham o ser humano e seus diversos níveis de aprendizagem. “Escolas transformadoras, com essas escolas dão oportunidade para as pessoas saírem do automático e tomarem as próprias decisões na vida, autoconhecimento, promovem momentos em que cada um olha para si mesmo. Abre um leque de possibilidades de tipos de vidas para estes alunos.”, diz Amorim.

Algumas escolas avançam no cuidado com o aluno e a comunidade, como a Lampinho, no Ceará, que tem aulas de mediação de conflito.

“Foi a escola que mais me tocou. Falava de empatia, então você trazia muito o ser humano em primeiro plano e eu nunca tinha pensado que a escola poderia trabalhar nessa instância dessa forma e eu achei isso muito lindo”, afirma Amanda.

“Só tem uma forma de a gente entrar na sala de aula e dar a nossa aula? Realmente os alunos quando chegam aqui eles não sabem nada? Eles não podem contribuir? A função do aluno é ser um mero receptáculo?”
— Gustavo Serra – IFPR – Jacarezinho (PR)

Algumas não são organizadas por idade, saíram das séries e utilizam ciclos nos quais há crianças de várias idades, mas dentro do mesmo conjunto de interesses e potenciais.

“Pode misturar crianças de várias idades no mesmo ciclo, o mais velho ajudando o mais novo, como é o mundo, é um movimento até intuitivo. Não precisa transformar a escola numa realidade à parte da vida. Porque as escolas têm que ser tão inspiradas no meio de produção industrial, padronizado e tão pouco inspirada na sociedade”, questiona Amorim.

Outro diferencial dessas escolas é o envolvimento dos pais, que são muito mais presentes.

“Na maioria das escolas, você terceiriza a educação do seu filho. Você não faz parte dela porque não consegue entrar para ver o que está acontecendo. E isso é erradíssimo. Todas as escolas que nós fomos fazem o contrário, traz o pai para dentro da escola como uma forma de mostrar: ‘Olha, você participa da educação do seu filho. Aqui é uma extensão da sua casa, vamos compartilhar a responsabilidade’” , diz Amanda.

Algumas escolas vão até as famílias para apresentar o resultado dos filhos. “Com isso elas acabam entendendo o contexto familiar que a criança vive que pode influenciar muito na maneira como ela aprende”, conta Amorim.
Isso porque o sistema de avaliação dessas escolas também é diferente do convencional e o vestibular não é o objetivo dessas escolas que miram além. As provas com dia marcado abrem espaço para avaliações diárias feitas por exposições e atividades em grupo.

“Não tem sentido fazer a criança a estudar 15 anos da vida dela para fazer uma prova de algumas horas. Se ele estiver passando mal no dia vai tudo embora”, pondera Amorim.

Desafios

Ter um perfil inovador pressupõe enfrentar muitos desafios. Entre alguns enfrentados pelas escolas da série estão a resistência de alguns pais e a adequação às novas diretrizes do ensino, que já foram implantadas no ensino infantil e fundamental e está em processo de implantação no ensino médio e que não levam em consideração as características de cada região.

“Essas escolas encaram essas barreiras como degraus. Acaba sendo um estimulo para inovar, para achar caminhos no meio das restrições”, afirma Amorim.

Inspirador

Todos que participaram da idealização e da produção da série tiveram uma vivência tradicional de ensino, onde tinham pouca voz e as lembranças que carregam destes tempos são justamente as de experiências diferentes como experimentos, viagens, grupos e esportes.

Mas fazer a série despertou nos profissionais a atenção pela educação. O editor e designer Francis Félix chegou a mudar o filho de escola.

“Fomos procurar uma coisa mais na ‘vibe’ que a gente queria, de se preocupar mais com a relação das pessoas do que só passar o tempo lá na escola”, afirmou.

“Com certeza foi inspirador Até para nossas relações. Eu carreguei muita coisa do que assisti para a relação lá em casa com a família. Você tira dela muitas questões que você não enxergava antes”, afirmou.

Como assistir

Para assistir aos episódios da série é preciso fazer uma sessão de exibição com pelo menos três pessoas. A plataforma exige um relatório de quem participou e de como foi a discussão e uma foto.

“Por meio das fotos e dos textos a gente consegue uma resposta de como foi a aceitação da série, quantas pessoas a gente impactou e abre um canal de comunicação, pontes, os personagens que estão na temporada são muito acessíveis, então a escola que se interessem por uma inspiração de um episódio pode ter contato com aquele professor e talvez até ajudar numa ponte para as iniciativas que podem surgir”, diz Amorim.

Fabiana Assis

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