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Marcelo Gallardo, o homem que mudou a história.

Foto: Reuters

Fim de jogo na Fortaleza, em Lanús. O River é eliminado na semifinal da Libertadores de 2017 de maneira inacreditável. Depois de vencer a partida de ida pela vantagem mínima e conseguir abrir 2 a 0 na casa do rival, Gallardo assistiu, olhos arregalados, como Pepe Sand e Laucha Acosta comandavam a histórica virada que ecoaria por Núñez. O 4 a 2 não só tirou o River Plate da decisão da Libertadores daquele ano, também fez Muñeco balançar no cargo pela única vez neste vitorioso ciclo que já dura cinco anos e meio.

Por isso, logo que se reelegeu presidente, Rodolfo D´Onofrio não perdeu tempo e procurou o técnico para renovar. D´Onofrio queria afastar os rumores da imprensa que sugeriam um término com o Gallardo. Na televisão, os programas esportivos alegavam que ele já havia feito seu trabalho: devolveu o River ao protagonismo internacional e eliminou o Boca em dois confrontos diretos, até então.

Gallardo, talvez até um pouco motivado por tudo isso, nem tomou tempo para pensar. Aceitou a proposta, ficou no Monumental e o tempo foi a melhor testemunha para provar que quando toma decisões, poucas são as vezes que Marcelo Gallardo se equivoca.

A confiança nos auxiliares

É ele quem toma todas as decisões, mas nunca sem antes escutar a comissão técnica, que conta, inclusive, com uma especialista em neurociência. Matías Biscay e Hernán Buján, os amigos de infância, são fundamentais nesse caminho repleto de títulos e champanhe.

O entrosamento e a confiança é tamanha que, durante um superclásico no Monumental em 2014, quando o River perdia para o Boca no por 1 a 0 em meio à chuva e o campo pesado. foi Biscay quem sugeriu a entrada de Germán Pezella, zagueiro de natureza, para jogar enfiado na área rival feito atacante de origem. O auxiliar enxergou algo que Gallardo não viu e o mérito do técnico foi dar ouvidos ao amigo. Valendo-se da altura privilegiada, Pezella guardou posição fixo entre os defensores Xeneizes, escorando os cruzamentos e lutando contra colegas tão íntimos. E assim veio o gol de empate, graças ao talento de um zagueiro improvisado como atacante.

Pode parecer loucura, mas este gol evidencia uma das maiores qualidades do técnico: sua capacidade de adaptação às circunstâncias do jogo. E também deixa claro a importância dos homens que cercam Gallardo no banco de reservas. Ele tenta fazer do trabalho algo prazeroso, que seja familiar. O próprio pai do técnico (quem algum dia, na distante e esquecida infância, o fez torcedor do San Lorenzo – segundo o próprio Marcelo em uma distante entrevista) já se desempenhou como olheiro a pedido do filho.

Recentemente, o bom olho de Gallardo nos treinamentos também serviu para dar destino a uma partida. Ninguém esperava o jovem Jorge Carrascal como titular no jogo de volta contra o Cruzeiro, no Mineirão. O técnico tinha a intuição – e ele gosta de se apegar e utilizar esse termo – de que o colombiano pudesse render. E, de fato, apesar do empate sem gols (a classificação viria nos pênaltis), o garoto foi um dos destaques da noite.

Curiosamente, à medida que acumula títulos e sucessos em Núñez, Gallardo também se tornou o carrasco dos técnicos do Boca Juniors. Se Alfaro confirmar as especulações e deixar o clube depois do final deste ano, serão três os treinadores Xeneizes derrotados por Muñeco e que não resistiram à necessidade urgente de renovação. Antes dele, Rodolfo Arrubarrena e os irmãos Schelotto ficaram sem clima depois perderem no mano a mano com Napoleón.

O mérito de não esmorecer

Relembramos o primeiro parágrafo deste texto e saltamos direto para o final de 2018, em Madri. O River Plate saiu vitorioso contra o maior rival, na maior final possível. Novamente ressurge o assunto sobre um possível final de ciclo, mas, desta vez, disparado pelo próprio Gallardo. “Não há nada maior do que isso. Não há nada maior do que isso”, repetia ainda no gramado do Santiago Bernabéu. Depois disse que avaliaria a continuidade, se colocasse novos objetivos após alcançar o topo com o time que aprendeu a amar ainda nas categorias de base.

Definitivamente não faltam méritos. Gallardo encontrou os motivos certos para se renovar. Como poucos sabe estimular os garotos das canteras, promovendo períodos de experiência no time principal e experiências sem apressar qualquer processo de amadurecimento e evolução natural dos jovens (vale lembrar que três titulares do time subiram das categorias de base pelo técnico: Montiel. Martínez Quarta e Exequiel Palacios). E também o bom olho para contratações no mercado local e, principalmente, regional: Nico De La Cruz, Jorge Carrascal, Rafael Santos Borré, Juanfe Quintero e por aí segue a lista.

E sim, claro, Gallardo decidiu ficar após 13 finais disputadas, sendo 10 vencidas com 7 títulos internacionais e 3 copas nacionais no currículo. Ainda tem mais duas decisões no horizonte (amanhã contra o Flamengo, e quatro dias depois contra o Central Córdoba pela Copa Argentina). Muñeco é uma máquina copeira de finais. E dentre essas tantas virtudes, talvez a principal é saber como conduzir as coisas tão bem por tanto tempo. Por sua capacidade de renovar o ânimo do vestiário e a vontade dos jogadores. Porque quando toma decisões, poucas vezes Gallardo se equivoca.

Leo Lepri

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