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O que explicaria o interesse da Alemanha em adquirir blindados e munições do Brasil para a Ucrânia?

Tanque Tanque antiaéreo Gepard 1A2

Uma coisa é fato: a história da diplomacia brasileira sempre teve como norte a negociação e o diálogo diante de conflitos — em outros tempos nem tão remotos assim, tentava, inclusive, agir como uma mediadora para que países chegassem a um denominador comum em suas resoluções.

No caso específico da operação militar especial da Rússia na Ucrânia, o Brasil reforçou a postura neutra, realçada com a solidariedade do atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), à Rússia uma semana antes do lançamento da ação.

No entanto, a atitude menos previsível por parte das relações exteriores do atual governo brasileiro fez com que dúvidas surgissem, nos últimos anos, entre alguns líderes mundiais e suas respectivas nações — caso da Alemanha, cuja relação com o Brasil entrou em franco desgaste durante a administração Bolsonaro.

As críticas do país europeu em relação aos desmatamentos na Amazônia e ao modo como o governo brasileiro geriu a crise da COVID-19 estiveram entre os principais motivos do desentendimento.

Daí a estranheza diante da revelação feita pela imprensa internacional e amplamente repercutida em território nacional de que a Alemanha está, supostamente, recorrendo ao Brasil para conseguir blindados alemães antiaéreos Flakpanzer Gepard e, sobretudo, munições para esses tanques, a fim de abastecer militarmente as fileiras das tropas ucranianas.

Tanque antiaéreo Gepard 1A2 é demonstrado em 15 de junho de 2009, em uma apresentação de desempenho do Exército alemão em área de treinamento militar em Munster, na Alemanha.

Segundo a imprensa, a quantidade de armamentos e munições do mesmo tipo doados por Berlim a Kiev teria capacidade para cerca de risíveis 20 minutos de combate.

O modelo dos anos 1970, que deixou de operar na Alemanha no ano de 2010, foi adquirido pelo Brasil em 2013, quando 34 tanques Gepard versão 1A2 foram incorporados ao arsenal nacional para garantir a segurança durante três eventos de escala mundial: a Jornada Mundial da Juventude, que teve a presença do papa Francisco, a Copa das Confederações e a Copa do Mundo de 2014.

O que se sabe é que, depois desse prolífico calendário internacional, o Brasil tentou se desfazer da compra por considerar as máquinas obsoletas (e até conseguiu vender algumas para o Catar, que realiza a próxima Copa do Mundo em novembro deste ano).

Por meio de nota, as Forças Armadas brasileiras disseram que não foram oficialmente contatadas para uma eventual aquisição de munição.

Entretanto, a partir da estranha revelação vêm duas perguntas: o que o Brasil teria a ganhar com isso? O que estaria por trás desse suposto interesse?

A Sputnik Brasil conversou com a professora Isabela Gama, especialista em teoria das relações internacionais e em segurança e pesquisadora pós-doutoranda da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), na tentativa de entender esse movimento inesperado por parte da Alemanha.

Caso o pedido seja feito, ela acredita que seja improvável a cessão de armamentos por parte do Brasil a fim de municiar as tropas ucranianas.

“Nos últimos anos, a política externa brasileira tenta se manter neutra quando o assunto é um conflito. É claro que nos últimos anos do governo de Jair Bolsonaro algumas questões da política externa brasileira ficaram um pouco confusas para serem analisadas de forma mais precisa.

Mas, dado que até o momento o Brasil não se posicionou com relação a esse pedido de maneira formal, acho improvável dado o histórico do país de não se envolver”, avalia Gama.

Fato é que se o Brasil decidisse enviar esses blindados e essas munições, isso seria uma grande surpresa que contrariaria a postura tradicional da política externa brasileira.

Apesar da improvável cessão de material bélico à Ucrânia, algumas possibilidades geopolíticas podem ser consideradas a partir das supostas intenções da Alemanha em relação ao Brasil. Isso porque a operação especial russa na Ucrânia se tornou também, para muitos, uma disputa de narrativas.

“É preciso ver como isso vai ser retratado dentro de países europeus, assim como dentro do Brasil. O movimento me parece uma forma de explorar um pouco algumas questões que o Brasil vem tendo e também explorar uma tentativa nossa de sermos aceitos dentro da OCDE [Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico]”, pontua a professora.

Sputnik

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