A Indonésia registra tremores praticamente todos os dias, mas o tamanho do terremoto e do tsunami que atingiram a cidade de Palu na última semana pegou tanto os cientistas quanto a população local de surpresa.
Mais de 1,3 mil pessoas morreram, mas a contagem final poderia ser muito maior, dizem as autoridades.
O controlador de tráfego que perdeu a vida ao ajudar avião a decolar durante desastre na Indonésia
O jovem que ficou perdido no mar três vezes
Especialistas explicam que a combinação de geografia, alertas inadequados e o momento em que o desastre aconteceu fizeram com que o pior cenário possível se tornasse realidade.
Uma localização perigosa
Terremotos são causados pela movimentação das placas tectônicas. Isso acontece o tempo todo, mas às vezes o movimento é grande o suficiente – e próximo o suficiente de áreas povoadas – para causar consequências devastadoras
Países localizados longe da borda das placas tectônicas tendem a ter menos terremos, enquanto países localizados próximo ao encontro de duas bordas tendem a sofrer mais.
Na sexta-feira do dia 28 de setembro, pequenos tremores aconteceram ao longo da manhã na Indonésia. No início da tarde, contudo, a fenda Palu-Koru se movimentou subitamente, a uma pequena distância da praia e a apenas 10 km abaixo da superfície, gerando um terremoto de magnitude 7,5 na escala Richter.
O geólogo Hamza Latief, do Instituto de Tecnologia Bandung, vem estudando a fenda desde 1995 e disse que o impacto do terremoto foi amplificado pelas grossas camadas de sedimento nas quais a cidade de Palu está construída.
Durante um terremoto, quando o solo é composto de rochas, ele apenas treme. No entanto, quando é formado por camadas sedimentares, ele se move muito mais – comportando-se quase como um líquido. Imóveis com pouca segurança estrutural não conseguem resistir a esse movimento.
“Nenhum lugar onde as pessoas construíram sobre camadas sedimentares será tão sólido quanto um solo rochoso”, afirma Jess Phoenix, geóloga americana que estuda a Indonésia.
Uma onda inesperada
“Normalmente não se presta muita atenção à fenda Palu-Koru no que diz respeito à possibilidade de tsunamis”, diz o professor Philip Liu Li-Fan, da Universidade Nacional de Cingapura.
Isso porque, explica ele, as duas placas estão se movimento horizontalmente, não da maneira vertical normalmente necessária para dar início às perigosas ondas.
“Temos tentado descobrir o que estava realmente acontecendo”, diz Liu.
Segundo ele, é possível que o terremoto tenha iniciado um deslizamento debaixo d’água, o que por sua vez deslocou uma grande massa de água. Outra possibilidade é que haja imprecisões na análise da fenda. “Ainda não sabemos”, afirma.
Uma vez que a onda começou a se mover, a cidade de Palu – localizada no fim de uma baía estreita de 10 km – era um alvo fácil.
Tsunamis não são um perigo quando acontecem em mar aberto. Mas quando as ondas chegam perto da costa, seu comprimento diminui e sua altura aumenta.
Dentro de três minutos, Palu foi atingida por três ondas.
Jess Phoenix explica que a geografia e o momento fizeram com que o pior cenário imaginável se concretizasse.
“Quando a água chega em uma área com o formato da baía de Palu, a onda não aumenta de altura só porque o oceano está ficando mais raso. Você também tem um efeito em que as ondas rebatem na linha da costa ao redor da baía”, explica Phoenix.
Latief diz que a área já foi atingida por tsunamis antes – registros históricos apontam que em 1927 uma onda de 3 ou 4 metros na boca da baía chegou aos 8 metros de altura quando atingiu a cidade.
Sistema de alertas ineficiente?
Depois que um tsunami no Oceano Índico matou 250 mil pessoas em 2004 na região, volume expressivo de recursos foi empregado em sistemas de alerta prévios em diversos países, incluindo na Indonésia.
Um complexo sistema de sensores foi instalado pela região. Eles servem para ajudar cientistas a analisarem rapidamente a probabilidade de um terremoto iniciar um tsunami e, eventualmente, terem tempo para alertar a população a se abrigarem em um local alto.
O diretor da Agência de Mitigação de Desastres da Indonésia disse que uma parte central do sistema de alerta do país – uma série de boias conectadas a sensores no leito do mar – não funciona desde 2012. Ele culpou a falta de orçamento.
Liu afirma que o sistema funciona “mais ou menos”, e que a Indonésia tem privilegiado o monitoramento das regiões ao sul, que foram muito afetadas no tsunami de 2004.
Um alerta de tsunami foi emitido depois do terremoto, mas, segundo Phoenix, ainda não foi avaliado se “o alerta foi implementado corretamente e se as pessoas o ouviram”.
Não é incomum que pessoas sejam mortas por tsunamis porque ficam na praia para observar o fenômeno do mar retrocedendo – que acontece enquanto a onda se forma, pouco tempo antes de o tsunami atingir a costa.
Desde 2004, um grande esforço foi feito para instruir as pessoas a correrem para um lugar alto se a água retroceder.
Um homem contou à BBC que viu o mar “sumindo” e mandou sua família procurar um local mais alto enquanto, enquanto ele agarrou uma criança que estava por perto e subiu em uma árvore
Apesar do alerta, aparentemente ainda havia muitas pessoas na praia ou próximo dela, parte delas se preparando para um festival.
“As pessoas na região estão cientes do estrago que um tsunami pode fazer. Espero que as pessoas que estavam na praia estivessem tentando sair”, diz Phoenix.
A especialista afirma que uma onda de três metros é algo de grandes proporções e que, para conseguir evacuar todo mundo em um período curto de tempo, é preciso ter rotas de fugas muito claramente demarcadas.
“Pela minha experiência trabalhando na Indonésia, não vi rotas de fuga muito bem demarcadas. Não tenho certeza sobre Palu especificamente, mas é realmente difícil retirar uma grande quantidade de pessoas de uma área muito rápido.”
Anna Jones