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Sucesso da Rússia na Copa está alimentando nostalgia da União Soviética

Famílias se oferecem para limpar estátuas da era soviética em parque de Moscou: quase 60% dos russos disseram estar "chateados" com o fim da URSS

Os russos tinham expectativas tão baixas sobre seu time de futebol antes da Copa do Mundo que uma cômica música ridicularizando a seleção russa registrou 12 milhões de visualizações no YouTube, em meio ao escárnio público da equipe.

Isso, aliado à falta de vitórias e a uma posição ruim no ranking mundial, ajuda a explicar a mistura de choque e euforia que varreu o país depois que a Rússia surpreendentemente venceu os dois primeiros jogos de seu grupo.

Eles se classificaram para a segunda fase do torneio sem precisar se preocupar com a partida final do grupo com o Uruguai, na qual a equipe da casa perdeu por 3 a 0.

Esquecimento
A última vez que os jogadores russos tiveram tamanho sucesso eles ainda jogavam sob a bandeira soviética, mais precisamente no México, em 1986.

Cinco anos mais tarde, com o desmembramento da União Soviética, a Rússia continuou sozinha e, de seis Copas do Mundo, não conseguiu passar da fase de grupos em três delas e nem sequer se qualificou para as outras.

Talvez não seja surpreendente que a atual campanha esteja provocando uma nostalgia soviética no país.

É um fenômeno expressado em várias esferas da vida pública na Rússia: uma pesquisa anual realizada desde 1992 mostrou que, em dezembro, quase seis em cada dez russos estavam insatisfeitos com o desmoronamento do grupo de 15 repúblicas.

Esses foram os níveis mais altos registrados desde 2009, de acordo com o instituto de pesquisa Levada, que conduziu a pesquisa em um momento em que jogadores russos pediam apoio a jornalistas para diminuir as críticas à equipe.

Farrapos
A ex-URSS era um time com o qual você podia contar, chegando às semifinais da Copa do Mundo de 1966 e vencendo a Eurocopa de 1960 – eles também foram vice-campeões em 1988. E ainda ganharam dois ouros olímpicos.

Esse legado evaporou na “carreira solo”, com a exceção de uma jornada surpreendente até as semifinais da Euro 2008.

Mas como a nostalgia soviética é um negócio próspero em Moscou e outras grandes cidades, reforçado por cafés retrô e atrações variadas como museus, o futebol também trará lembranças reconfortantes?

Na primeira década após o desmembramento da URSS em 1991, a Rússia estava em dificuldades e com a economia em farrapos.

O fracasso do estado de bem-estar social levou a uma queda maciça nos padrões de vida – a expectativa média de vida da Rússia caiu de 69 para 65 anos para mulheres e de 64 para 57 entre homens em apenas quatro anos, de 1990 a 1994.

“Atualmente, as vidas das pessoas são mais estáveis ​​na Rússia, mas tem havido muito pouca mudança nos níveis medidos de nostalgia soviética”, diz Vadim Nikitin, um escritor russo sediado em Londres.

“É algo maior do que patriotismo ou o anseio para que a Rússia se torne novamente uma superpotência. Eu suspeito que seja a sensação das pessoas de que a URSS tinha mais coletividade e união.”

Coincidência ou não, a mensagem de esforço em equipe permeia a campanha da anfitriã na Copa do Mundo.

“Eu ainda ouço comentaristas falando muito sobre a atmosfera de fraternidade e fazendo comparações com o Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes, de 1957”, conta Ekaterina Kalinina, uma acadêmica russa, em entrevista à BBC.

Kalinina se refere a um evento bianual realizado regularmente desde 1947, cuja maior edição ocorreu na Rússia há mais de 50 anos, quando 34 mil jovens de 131 países se reuniram em Moscou.

“Mas a Copa do Mundo traz a alegria de se unir e celebrar a dimensão internacional do esporte. Eu não diria que isso possa intensificar a nostalgia do período soviético “.

“É mais um desejo de paz, alegria e comunidade”.

A sombra da URSS ainda não foi embora. As pesquisas Levada, por exemplo, mostram que mesmo as pessoas nascidas depois de 1991 “sentem saudades dos tempos soviéticos” – em dezembro passado, 20% das pessoas com idade entre 18 e 24 anos sentiam essa nostalgia, em comparação com 42% que não sentiam.

Fernando Duarte

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