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Comissão pode votar nesta quarta projeto que institui doação eleitoral oculta

Texto do relator Vicente Cândido (PT-SP) define que o eleitor poderá optar pelo sigilo de sua identidade ao fazer a doação. Críticos avaliam que medida prejudica transparência nas eleições.

comissão da Câmara que analisa propostas de reforma política pode votar nesta quarta-feira (16) um projeto de lei que, entre outros pontos, institui a doação eleitoral oculta.

O relator do texto, deputado Vicente Cândido (PT-SP), que incluiu o dispositivo no texto na terça-feira (15), argumenta que o modelo protege o eleitor. Críticos afirmam que a medida traz “grave problema” de transparência.

O parecer que traz mudanças na lei eleitoral agora prevê que o doador terá o direito de pedir a não divulgação de sua identidade. A exceção será para os casos de prestação de contas e fiscalização dos órgãos de controle e do Ministério Público.

A proposta pode ser votada na comissão especial na tarde desta quarta. Depois, precisa ser aprovada pelos plenários da Câmara e do Senado.

Antes, Cândido propunha que houvesse a ocultação apenas para eleitores que doassem até três salários mínimos. Agora, o sigilo acabou sendo ampliado para todos os doadores.

“É uma proteção ao eleitor. O momento que estamos vivendo exige esses cuidados. Estamos numa política muito agressiva, do não reconhecimento do contraditório”, argumentou o deputado ao apresentar o novo parecer.

Para ele, não há um problema de transparência na doação oculta, já que órgãos como os tribunais de contas, a Receita Federal e o Ministério Público poderão ter acesso aos dados.

Crítico à medida, o advogado e ex-juiz Márlon Reis, que é um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, afirmou que não há justificativa que torne aceitável a doação oculta.

“A pretexto de uma proteção ao eleitor, ela abre a porta para o risco de fontes inidôneas, que comprometerão o resultado da eleição”, disse. “O eleitor tem o direito de saber qual a origem dos recursos que financiam os candidatos. Negar essa informação ao eleitor é extremamente grave”, completou.

Na avaliação do advogado, não é válido o argumento de que os dados estarão disponíveis para o fiscalização e controle, porque, para ele, a velocidade dos órgãos que têm essa função é muito pequena.

Márlon Reis afirmou ainda que, se o dispositivo for aprovado pelo Congresso, ele próprio trabalhará para que essa discussão chegue ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Na avaliação do deputado Alessandro Molon (Rede-RJ), a doação oculta traz um “problema grave” de transparência. Ele diz ter esperança de que o relator retire esse trecho do texto, antes que seja feita a votação no colegiado.

“O eleitor tem o direito de saber quem está doando para quais candidaturas. Certamente vamos fazer pressão para que seja retirado”, disse.

Segundo a deputada Luiza Erundina (Psol-SP), parlamentares achavam que haviam convencido o relator de não colocar essa previsão no texto, mas foram surpreendidos com a mudança.

“É inaceitável, um absurdo. Neste momento que vive o país, com problemas causados por falta de transparência e de desvios éticos, você cria um mecanismo que reforça isso?”, disse.

Em entrevista à radio CBN nesta manhã, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Gilmar Mendes, também criticou a doação oculta.

“Com certeza, acho que nas condições atuais seria um grande retrocesso, porque já nas eleições, como eu dizia, de 2016, nós tivemos metade, mais ou menos, dos doadores declarados não teriam renda para fazer a doação. Logo, é notório que estão usando cpf de pessoas que não têm capacidade financeira para fazer a doação. Agora, se puder fazer aí de forma escondida, de forma recôndita, de forma anônima, como está se falando, certamente esse quadro vai se agravar”, afirmou o ministro.

Histórico

Em 2015, em projeto conhecido como “minirreforma eleitoral”, capitaneado pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um dispositivo semelhante foi incluído na lei. Pelo texto aprovado na época, as prestações de contas não trariam mais a “individualização dos doadores”.

No mesmo ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu essa ocultação das doações. No julgamento, os ministros da Corte entenderam que a norma contrariava a transparência na disputa eleitoral, comprometia a fiscalização das contas e dificultava a escolha de candidatos pelo eleitor.

 

G1

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