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A atração do Nobel

 

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Poucos admitem, todos o querem

+ O passarinho da literatura todo dia vem nos acordar com sua mensagem cruel: trabalhar, trabalhar, trabalhar – quem não trabalha não ganha o Nobel.

+ Trabalho duro e persistente é uma balela. Você conhece alguma formiga que tenha conseguido o Nobel?

+ Tomou uma decisão. Vai começar a escrever o discurso que pronunciará quando receber o Nobel. É um desses escritores que planejam tudo. Tem vinte anos e hoje o jornal de Alecrim da Serra publicou seu primeiro texto.

+ Pelo andar da carruagem, devo estar em Estocolmo por volta de 2059, se ainda houver Suécia e Prêmio Nobel.

+ Até os trinta anos sonhou com o Nobel. Dos trinta aos cinquenta trabalhou para conquistá-lo. Depois disso desistiu, e a frase que mais diz hoje é: “Os suecos não entendem nada de literatura.”

+ Enquanto não vem o Nobel, aceito o Jabuti. Há quarenta anos moro no mesmo lugar. Para facilitar, podem entregar aqui.

+ Nobel? Jabuti? Concurso do Paraná? De Ituiutaba? Você está brincando. Quer saber? Não consigo publicar nem o meu livro de sacanagem. O editor disse que não trabalha com paradidáticos.

+ Vem Natal, vai Natal, vem Noel, vai Noel, e ele só ganha gravata e cueca. Quando a Academia Sueca lhe dará o Nobel?

+ Sempre que chega o carteiro, o Velho faz a mesma pergunta:

“Alguma carta de Estocolmo?”

Há dez anos a resposta do carteiro é:

“Não.”

Há dez anos o Velho se lamenta:

“O Nobel me esqueceu.”

“Quem sabe amanhã”, sugere o carteiro.

” Ou depois.”

+ Por trinta anos manteve a convicção. No dia de sua morte, quando o padre veio, ele o recebeu esperançoso:

“Mão gelada. É inverno em Estocolmo?”

+ Ele se despoja da última esperança, enquanto os poetas jovens premeditam o Nobel.

+ Depois de um sonho em que recebeu finalmente o Nobel, o escritor foi acordado de manhã pelo carteiro. Era um comunicado oficial, não de Estocolmo, mas de sua cidade: estava sendo notificado e multado por um excesso no consumo de água.

+ Não deram o Nobel a Fernando Pessoa pelo receio de que à cerimônia comparecessem mais de cem.

POR RAUL DREWNICK

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