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‘Bem venceu o mal’: catador tem livros queimados e recebe triplo em doações

Odilon Tavares montou um sebo improvisado na calçada

O ambulante Odilon Tavares, 58, vende livros no centro de Belo Horizonte há três anos. Neste fim de semana, porém, encontrou fuligem e um chão chamuscado ao chegar ao local onde trabalha. Um homem, ainda não identificado, ateou fogo e destruiu cerca de 3 mil livros de Odilon.

Uma rede de solidariedade repassou a informação pelas redes sociais e se mobilizou para reerguer o negócio com a doação de novas obras.

Nas contas do vendedor, o acervo chegou a 10 mil livros em cerca de 48 horas.

“Foi uma prova de que o bem vence o mal. Sempre”

Os primeiros livros do negócio foram encontrados no lixo, enquanto buscava por materiais recicláveis. Por “não saber o valor dos livros” com o novo negócio, estabeleceu o preço único de R$ 5 para cada unidade. O grande sucesso continua sendo “Harry Potter”.

Apesar de considerar a si mesmo como um divulgador cultural, ele mesmo não é de muita leitura. Primeiro, diz que as letras se embaralham por um problema de vista. Segundo, porque teve pouco estudo. No colégio em Carandaí, a cerca de 130 km de Belo Horizonte, foi só até a quarta série. “Gostar de ler, eu gosto. Mas leio só umas paginazinhas e pronto”, diz.

Há cerca de dois anos, fiscais da Prefeitura tentaram removê-lo da rua Grão Mogol e as obras foram apreendidas. Com a repercussão negativa, a fiscalização voltou atrás e manteve os livros à venda nas calçadas, embora o livreiro reconheça que vendê-los é considerado atividade “contra a lei”.

“A cultura tem de tudo: ciência, arquitetura. Você pode escolher. Quando você descobre a cultura, você cria uma postura. Um analfabeto não olha no olho de doutor do mesmo jeito, né?”.

Odilon viveu nas ruas após se separar da ex-esposa, mas estava na casa onde hoje vive com o restante da família quando houve o incêndio. Nesta semana, o livreiro voltaria ao trabalho após isolar-se contra a pandemia do novo coronavírus.

O trabalho é de segunda a sexta, mas agora estendeu-se aos fins de semana para receber as doações que chegam ao local. As doações podem ser feitas no local onde Odilon trabalha, na altura do número 5.873 da avenida do Contorno, esquina com a rua Grão Mogol da capital mineira.

Enquanto não trabalhou, dependia do auxílio emergencial. Quando viu a cena do incêndio, não se desesperou. “Não senti nem raiva, nem tristeza. Eu vivo o hoje”, relata. “Mas quem botou fogo nos livros deve ser alguém que não gosta de cultura”.

Marcos Candido

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