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Booktubers são os novos críticos literários

A partir da esquerda, as booktubers Tatiana Feltrin, Pam Gonçalves, Isabella Lubrano, Paola Aleksandra e Mell Ferraz — Foto: Reprodução/YouTube

Elas amam livros e irão defendê-los até a morte – bem como o direito de poder ganhar dinheiro para falar sobre eles em seus canais no YouTube. São as booktubers.

Oferecem dicas de leitura e de escrita a um público jovem e “em formação”. Têm nenhum problema para falar hoje sobre “A sutil arte de ligar o F*od-se” e amanhã sobre “Memórias póstumas de Brás Cubas” (até porque cai no vestibular).

Garantem que não querem roubar o espaço da crítica tradicional. Mas sentem que sofrem preconceito da “intelectualidade”. Há quem condene a abordagem supostamente superficial ou simplória de temas literários e o fato de, em certos vídeos, receberem dinheiro para comentar determinada obra.

No caso de material feito sob encomenda, seja de editoras ou de autores, os booktubers colocam um aviso informando que se trata de conteúdo pago.

Embora com número de fãs bem inferior aos milhões habituais de youtubers celebridades, booktubers são alvo de assédio crescente por parte de editoras e outras empresas do ramo – elas veem aí um novo e rentável canal de divulgação.

#publi, mas nem sempre

Chamam essas ações de “publieditorial”. E, por causa dessas “parcerias”, estiveram recentemente no centro de uma polêmica depois que um escritor divulgou uma tabela com valores cobrados para ter um livro “resenhado”.

Ao G1, as principais booktubers do Brasil defendem a legitimidade dos “publis”, afirmando que não vendem opinião, mas só espaço e tempo. Argumentam que há regras claras e acreditam que a opinião negativa se deve ao desconhecimento que tem a velha guarda sobre ser booktuber.

Relembre como foi a controvérsia:

O escritor Ronaldo Bressane postou uma mensagem em que dizia: “É assim que funciona o mundo maravilhoso dos booktubers: JABÁ”. Colou um e-mail enviado por uma booktuber com “o orçamento para leitura/divulgação/resenha em vídeo” de um livro e um aviso: “o público será avisado de que se trata de publicidade”.

Os valores variavam de R$ 1,5 mil para divulgação de capa e sinopse em vídeo coletivo a R$ 5 mil para leitura + impressões (pessoais, sem interferência) em vídeo exclusivo (de 5-10 minutos) + divulgação de capa nas redes e sinopse em vídeo coletivo.

Um dia depois, a booktuber Tatiana Feltrin fez uma série de posts no Twitter (um “thread honestão”) sobre o tema. No último, escreveu: “Pois é: tem um preço. Achou caro? Procure outro vlogueiro (…)”. Tatiana publicou uma tabela de preços com outros valores.

O repórter da “Época” Ruan de Sousa Gabriel escreveu uma coluna no site da revista: “Talvez haverá sempre algo de nebuloso no negócio dos booktubers: eles fazem divulgação ou uma nova modalidade de crítica literária, mais em sintonia com os novos tempos?”.

O jornalista e escritor Paulo Roberto Pires, editor da revista “serrote”, publicou, também no site da “Época”, a coluna “A impostura booktuber”: “Vamos combinar que é preciso uma generosa suspensão do espírito crítico para levar a sério cultural, ou intelectualmente, os chamados booktubers”.

Depois, Bressane publicou no Medium um artigo: “Será que um desavisado frequentador de YT saberia separar uma resenha espontânea de uma resenha paga?”.

Fundador da Coisa de Livreiro, que analisa o mercado editorial, Bruno Mendes diz que “tem muito influenciador que ‘vende’ mais livros do que uma livraria interia no Rio”. “Estou falando de varejista. O booktuber indica um livro no vídeo, com um link para a Amazon, e vende mais que uma loja pequena. Não estou exagerando.”
“Hoje, a editora precisa falar com o leitor, e a grande verdade é que a grande maioria não sabe fazer isso. E quem é que sabe? Os jovens booktubers sabem. Deixam de ser uma opção, passam a ser algo essencial.”

De acordo com o analista, há editoras que investem R$ 15 mil em uma única campanha de divulgação de livro com vários “influenciadores”.

Mendes conta que há nove influenciadores com os quais ele trabalha. “A influenciadora que mais ganhou com a gente faturou cerca de R$ 25 mil ao longo do ano passado – isso só com a gente, porque pode ter feito mais. Contando todos que trabalham com a gente, dá um total de mais ou menos R$ 175 mil. Em 2018, isso deve crescer de 20 a 25%.”

Cauê Muraro

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