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Intolerância Religiosa é debatida em audiência pública

Religião debatida na Câmara Municipal.

Com o objetivo de debater a intolerância religiosa no município de Feira de Santana, a Casa da Cidadania realizou, na manhã desta sexta-feira (25), uma audiência pública de iniciativa da Comissão de Reparação, Direitos Humanos, Defesa do Consumidor e Proteção à Mulher.

Compuseram a mesa de honra o presidente da referida Comissão, o vereador Pablo Roberto (PMDB), bem como representantes de segmentos religiosos.

Após saudar e cumprimentar os presentes, Pablo Roberto ressaltou a importância de se tratar sobre o assunto.

“Quero dizer da importância da sociedade estar debatendo um tema tão importante no nosso dia a dia, que faz parte das discussões que temos travado na Câmara Municipal”, afirmou.

Na oportunidade, o edil lamentou a ação criminosa contra os transmissores da Rádio São Gonçalo dos Campos, no município de São Gonçalo, colocando o ato como possível intolerância, uma vez que o veículo de comunicação é ligado à Igreja Católica.

“Vamos solicitar informações a Dom Itamar Vian e pediremos providências, por entender também que pode ser um processo relacionado à intolerância”, disse Pablo.

Dom Sérgio Muricy, bispo da Igreja Cela, Rito Ortodoxo, citou a questão histórica do país para justificar o surgimento da intolerância religiosa.

“Falar de intolerância religiosa no Brasil é acompanhar a nossa própria história. Desde a chegada dos portugueses, em 1500, até a atualidade, vem ocorrendo uma série de invasões de terreiros e cultos afro, igrejas católicas e tantos exemplos que a mídia nos apresenta”, pontuou.

O bispo lembrou que o primeiro ato religioso feito na então Terra de Santa Cruz foi uma missa, começando ali a morte de culturas indígenas e, posteriormente, africanas, durante o período de escravidão.

“A primeira ação religiosa por parte dos portugueses foi feita uma missa, os nativos da terra observando a cena sem entenderem nada e o resultado foi a destruição da religião indígena, do Deus da lua, para de uma hora para outra acreditarem em um Deus que morreu em uma cruz, ressuscitou e promete a vida eterna. Ali foi a imposição ao Cristianismo pela força da espada, causando genocídio de uma cultura milenar e colocando a vivência do sagrado, bem como a rica cultura africana, que valoriza de forma única os elementos da natureza, força espiritualidade, que de forma surpreendente criaram uma resistência através do sincretismo religioso”, ressaltou.

A professora doutora Elizete da Silva, coordenadora do Centro de Pesquisa da Religião na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), comentou a respeito do termo intolerância religiosa.

“Quero tratar do conceito de tolerância ou intolerância religiosa. A intolerância é a negação da tolerância. É o oposto da aceitação, mas o próprio ato de tolerar já contém intolerância. A gente fala da intolerância, mas qual o antídoto da intolerância, é o diálogo religioso e o movimento ecumênico”, avalia.

Elizete citou ainda o surgimento de práticas ecumênicas, avaliando que o ecumenismo só se abriu para os cultos protestantes. “A presença e oficialidade da Igreja Católica, que era a religião oficial do Brasil, só com a Proclamação da República deixou de ser oficial, porém a liberdade religiosa foi para os protestantes apenas”, afirmou a palestrante, lembrando que cultos indígenas ou práticas de religiões africanas continuam sendo vistas de forma preconceituosa.

Com a opinião formada de que nenhuma religião salva, o professor Marcos Caribé, sacerdote Ilê Opô Alagunan, professor do Centro Universitário de Cultura e Arte (Cuca) pediu respeito a todas as religiões.

“Não estamos aqui reivindicando melhorias salariais, estamos aqui reivindicando apenas o direito de exercer a nossa religião da forma que ela é. A intolerância existe porque os padres e pastores, os pais de santos e todos os outros que se acham poderosos acabam conscientizando seus fieis de que só aquela religião salva. Eu, com 54 anos, hoje aprendi que religião nenhuma salva, quem salva é o meu coração e o que poderei fazer de melhor para o meu irmão”, destacou.

O professor ressaltou que não apenas o candomblé passa por intolerância. “Muitos evangélicos ou mesmo católicos também passam por algum momento por intolerância, enfatizei a minha religião por conta do momento que estamos vivendo”, explicou Marcos.

O vice-prefeito Luciano Ribeiro (PMDB), representando o prefeito José Ronaldo e o arcebispo metropolitano de Feira de Santana, Dom Itamar Vian, chamou atenção para que a Casa da Cidadania possa acolher as sugestões feitas durante a audiência.

“Devo ressaltar que tudo aquilo que foi dito neste momento deve ser levado em consideração. Nada do que foi feito foi sem nenhum sentido, os desabafos se o fazem é porque estão sentindo; se estão sentindo é porque suas comunidades também estão. Quero parabenizar o vereador Pablo Roberto pela realização e peço que acolha as sugestões que sejam colocadas aqui. Temos o mesmo objetivo independentemente da religião ao qual pertencemos”, enfatizou o vice-prefeito.

Representando a Arquidiocese de Feira de Santana, diácono Carlos Branco Cerqueira, também chamou atenção para o respeito a todas as religiões.

“A intolerância religiosa não deve caber em nossa sociedade, devemos ser livres como o nosso país é livre. Todos nós não podemos estar sempre acusando uns aos outros”, disse.

O religioso lembrou que a Igreja Católica levará tudo o que foi proposto na audiência ao arcebispo Dom Itamar Vian.

“Estou aqui representando a Arquidiocese e posso dizer que a Igreja é sempre aberta. Partindo desse pressuposto, levarei tudo isso ao nosso arcebispo. Não estamos aqui para fazer a defesa desta ou daquela religião, mas para lutar pelo bem comum”, declarou Carlos Branco.

Outras pessoas presentes no plenário fizeram algumas observações, como por exemplo, a respeito da ausência de vereadores tratando de intolerância religiosa. Porém, segundo os reclamantes, no momento de campanha eleitoral, alguns políticos se fazem presentes, independentemente de crenças, nos mais diversos cultos religiosos.

Os debatedores lamentaram as agressões verbais e, até mesmo física, ao “povo de santo”.  Com relação aos homossexuais, foi dito também que só as religiões de matriz africana aceitam essa parcela da sociedade.

 Para um debatedor, deveria compor a mesa de honra na audiência pública da Casa Legislativa não só representantes de religiões, mas também agnósticos e ateus.

Na oportunidade, foi sugerida a data de 25 de setembro como um Dia Municipal de Combate à Intolerância Religiosa no município de Feira de Santana, bem como a retirada da Bíblia do plenário da Casa da Cidadania, em respeito às religiões que não têm esse livro como sagrado.

Estiveram presentes na sessão o vereador Robeci da Vassoura (PHS); Otto Vinícius Agra Figueiredo, pró-reitor de Políticas Afirmativas e Assuntos Estudantis da UEFS; Dom Marcos Paulo, bispo provençal da Bahia, Igreja Católica Independente; Tiago Oliveira, presidente do Grupo Liberdade, Igualdade e Cidadania Homossexual (GLICH); pastor Luiz Nery Santana, professor da UEFS (representando a Comunidade de Jesus, Igreja Batista Nazaré); Paulo Costa, chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Prevenção à Violência (representando o secretário municipal de Prevenção à Violência, Mauro Moraes).

Também prestigiaram o evento Vagner Paulino, coordenador de Projetos da Secretaria de Prevenção à Violência; Vicente Silva dos Santos (representando o Ilê Axé Gilodefan); Geovane Ferreira, chefe de Promoção da Igualdade Racial da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social; José Ginenaldo dos Santos, diretor do Departamento de Igualdade de Gênero Racial e Juventude da Secretaria de Desenvolvimento Social; Marconi Porto Sena, ouvidor da UEFS; Andrei de Brito Valente (representando a FENACABE); Marcelo Martinho, representante do Conselho Regional Espírita; Rafael Cardoso dos Santos (Tatá Kanbono); além de profissionais de imprensa e pessoas da comunidade.

ASCOM/Assessoria

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