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Manifestações mostram que luta contra Temer continua

Essa luta continua

Na tarde de ontem, quando Eleonora Menicucci, ministra-chefe da Secretaria de  Políticas para Mulheres no governo Dilma Rousseff, sentou-se para dar uma a entrevista ao 247, o mapa das mobilizações de estudantes contra a Reforma do Ensino Médio e contra a PEC 241, agora PEC 55, mostrava as dimensões de uma luta gigantesca.

Eram 1149 instituições de ensino ocupadas no país: 1016 escolas, 51 universidades e 82 institutos federais, numa mobilização que tende a crescer, mesmo enfrentando medidas de repressão cada vez mais violentas.

“A luta dos estudantes mostra que a resistência democrática continua cada vez mais ativa. Mesmo após as eleições municipais, que representaram uma derrota de toda a esquerda, o governo de Michel Temer  está longe de ter o domínio da situação política,”diz Eleonora.

“A luta continua,sempre.”

Conhecida por uma militância política a favor dos direitos da mulheres e da defesa intransigente da democracia,  a feminista Eleonora conhece as lutas estudantis por experiência própria.

Estudante do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais, teve uma longa experiência nas mobilizações de sua geração, que marcaram a resistência à ditadura de 1964.

Em 1965 foi vice-presidente da União Estadual  de Estudantes/MG e no ano seguinte foi eleita vice-presidente da UNE, no Congresso de 1966, realizado em BH.

Presa e torturada nas dependências do DOI-CODI de São Paulo, quando testemunhou a morte do jornalista  militante Luiz Eduardo  da Rocha Merlino.

Eleonora foi companheira de cela de Dilma Rousseff. Professora titular de Medicina Coletiva na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), ela deu o seguinte depoimento ao 247:

O Brasil parece viver uma situação política especial. O mesmo país onde a esquerda sofreu uma derrota profunda, nas eleições  municipais, assiste a uma mobilização cada vez maior dos estudantes, que resistem a Medida Provisória da Educação e a PEC 241, hoje PEC 55.

Recentemente, tivemos a greve dos bancários, uma das maiores da história. Como entender isso?

ELEONORA —  Não há dúvida que o campo da esquerda sofreu uma grande derrota nas eleições.

Não foi uma derrota do PT, apenas. Todos os partidos de esquerda perderam, inclusive o PSOL.

Essa derrota eleitoral é uma continuação do golpe que afastou a Dilma e se manifesta no plano das instituições.

Foi produzida pela judicialização da política, por uma campanha permanente e coordenada de mentiras.

O campo democrático perdeu no Brasil inteiro, menos no Acre, São Luiz e alguns municípios do Maranhão e em Fortaleza.

Não dá para explicar um resultado dessa dimensão sem levar o golpe em conta, como o fator principal. É fruto de um processo, longamente preparado, articulado, acredito, desde 2013.

  247 — Como explicar,  numa situação como esta, que os estudantes estejam engajados em mobilizações importantes,  mais amplas do que as realizadas antes do golpe?

ELEONORA — Eu acho, em primeiro lugar, que não falta motivo para resistir. Os estudantes já perceberam que terão muito a perder e não querem se render.

Mesmo mantendo um agudo espírito crítico em relação ao que se fez nos últimos anos, eles não deixam de reconhecer os imensos avanços realizados,  as oportunidades oferecidas.

Como pensar na formação da cidadania com uma proposta de educação baseada na Escola sem partido?Foi por isso que uma estudante, Ana Julia, foi capaz de dar um depoimento maravilhoso na Assembleia do Paraná, onde limitou-se a dizer verdades que podem ser ditas com serenidade e um sorriso.

Outros setores já perceberam essa necessidade, também, como o movimento de mulheres, o feminismo, o movimento sindical do campo e da cidade. Eles também estão engajados, ainda que de forma mais lenta, o que é natural, pois enfrentam situações muito diferentes.

A política é sempre um processo pedagógico e, para muitas pessoas, o aprendizado está apenas começando. Muitos chegaram a  acreditar que o PT e o governo foram afastados porque cometeram  “muitos equívocos.”

Claro que em treze anos de governo, alguns equívocos aconteceram. Falo dos avanços e acertos. É obrigatório pensar na defesa dos mais pobres, do Bolsa Família, da elevação do salário mínimo. Mas não foi isso apenas.

Por exemplo, pela primeira vez implantou-se no Brasil uma política universal de enfrentamento à violência contra as mulheres, desde as Casas da Mulher Brasileira, o disque 180, o combate incessante a cultura do estupro.

Não dá para negar avanços importantes no ensino, iniciados na gestão do Fernando Haddad e consolidados com Aloizio Mercadante, que tem autoridade para atuar contra a MP do Ensino Médio e contra a PEC 55.

Mas o  aprendizado permitirá perceber que fomos afastados por nossos acertos, por aquilo que fizemos de bom para o povo.

Este processo pedagógico ajuda a colocar as coisas em seu devido lugar. Mostra que é preciso pesar os fatos, analisar e refletir. Todo o esforço do Temer e seus aliados consiste em tentar colocar na defensiva, como uma força isolada, sem futuro.

Mas como acreditar nisso quando a gente sabe que o Lula continua o candidato favorito em 2018 e que segue o mais popular presidente da História?

 247 — A perseguição a Lula, que pode levar a cassação de seus direitos e mesmo a prisão, guarda pontos semelhantes com o processo do regime militar contra Juscelino Kubitscheck logo depois do golpe.

Ambos eram os políticos mais populares de seu tempo e representavam uma possibilidade de resistência. Como  a senhora compara uma situação e outra?

ELEONORA — Do ponto de vista das consequências políticas, a perseguição ao JK e a Lula são muito semelhantes.

Sua finalidade é avançar num processo de consolidação de um golpe de Estado, pela restrição de liberdades e eliminação pura e simples de adversários com lastro popular.

A diferença é que Lula tem consciência de seu lugar na democracia brasileira e tem uma visão mais comprometida com o conjunto dos brasileiros.

Sabe que seus direitos políticos não representam uma propriedade individual, mas um patrimônio político construído por uma parcela importante da população.

Por entender isso, Lula está disposto a resistir e defender seus direitos. Já disse que não vai se entregar nem vai fugir. Vai lutar, inclusive na ONU, um ambiente importante quando é preciso denunciar abusos.

Paulo Moreira Leite

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