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Sob o mando de um vilão, que ainda ficará muito menor do que já é

O verdadeiro amigo da onça

Quando Leonel Brizola perdeu, por uma manobra judicial tramada por Golbery do Couto e Silva, a sigla do PTB de Vargas, Carlos Drummond de Andrade escreveu, no velho JB de de 1980:

Vi danças festejando a derrota do adversário, e cantos e fogos. Vi o sentido ambíguo de toda festa. Há sempre uma antifesta ao lado, que não se faz sentir, e dói para dentro.

A política, vi as impurezas da política recobrindo sua pureza teórica. Ou o contrário.. Se ela é jogo, como pode ser pura… Se ela visa o bem geral, por que se nutre de combinações e até de fraudes?

A consumação do afastamento de Dilma Rousseff, às 6:34 de hoje, por truques jurídicos de um golpe parlamentar, virou história.

Triste, mas história.

Hoje não é dia de discutir como e porque chegamos a este desfecho, mas de abraçar a figura vencida e de abominar a do vencedor.

Chegará, sim, a hora da reflexão – muito mais do que acusação – sobre os erros cometidos, mas certamente não é essa.

Há algo mais grave, muito mais, do que qualquer erro que Dilma, ou Lula, ou o PT, ou mesmo toda a esquerda possam ter cometido.

É que nosso país, de tantas vilanias e de tantos vilões, está sob o mando de um rematado vilão, porque só o vil assim hipertrofiado é que poderia urdir a degola daquela (e daquele, porque também a Lula) a quem deve o lugar de seu substituto.

Não há, na história do país, exemplo igual de vilania. Nem Jango, nem Itamar Franco  tramaram contra Jânio e contra Collor. E o que fez Café Filho com Vargas é asséptico  perto da imundície de Michel Temer.

Imundície que não se resume nele, mas em todas as instituições que assistiram e promoveram a consumação deste esbulho: um acanalhado sem vergonhas, o Legislativo, e  o acanalhado pomposo, o Poder Judiciário.

Bem se vê que ambos não coraram de se acumpliciar ao regicídio, mesmo a maioria deles tendo feito parte da Corte.

Dilma não caiu por crimes, como os tantos da política, nem sequer os de responsabilidade. Basta um fato para demonstrá-lo: o sepulcral silêncio sobre o nome de Joaquim Levy, o ministro da Fazenda que planejou, redigiu e assinou os atos pelos quais Dilma é acusada.

Pois se admitir-se que Dilma “pedalou”, Levy preparou a bicicleta “engatilhada”.

A omissão do ex-ministro da Fazenda é, porém, uma nada perto do nanismo moral de Michel Temer.

Nanismo, o que é pior, sem sequer um sistema de freios e contrapesos parlamentar ou judicial que o possam tracionar.

O que vão faze-lo, por fraco, é comprimi-lo ainda mais ao rés do chão.

E por pequeno, moral e politicamente, transferirá para o povo que ilegitimamente passa a governar, todas estas pressões e compressões.

Passava pouco das seis e meia da manhã quando os últimos raios de luz despareceram do horizonte próximo.

Vamos ter de caminhar muito, junto do povo do qual nunca podemos nos apartar com aventuras, até vermos de novo a luz.

Fernando Brito

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