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TOFFOLI AFASTA PROMOTOR QUE INVESTIGAVA AÉCIO E AEROPORTO DE CLÁUDIO

CADA UM DELES USA A ARMA QUE TEM

O ministro Dias Toffoli, um dia antes de assumir a presidência do STF, afastou o promotor Eduardo Nepomuceno da Promotoria do Patrimônio Público do Ministério Público de Minas Gerais.

Nepomuceno tinha reaberto o inquérito que apura irregularidades na construção do aeroporto na cidade de Cláudio pelo então governador Aécio Neves.

O aeroporto, que custou R$ 14 milhões (valores de 2014) fica em uma antiga propriedade da família de Aécio na cidade, e o acesso a ele era controlado pelo tio do ex-governador.

Em 2014, com a revelação de que a pista estaria servindo a interesses particulares, Aécio apresentou dois pareceres, um de Carlos Veloso e outro de Carlos Ayres Britto, ambos ex-ministros do STF, para atestar a regularidade da obra.

O prefeito da cidade também contestou a Folha de S. Paulo, que revelou a obra na fazenda do tio de Aécio, e disse que a chave do aeroporto ficava em seu poder, e era a prefeitura que fazia o controle de acesso.

Em 2014, eu estive em Cláudio e constatei que o aeroporto tinha pouco movimento — Aécio tinha pousado lá algumas vezes, e uma ou outra aeronave, com espaço de tempo que às vezes durava meses, também o utilizava.

Irregularmente, diga-se, já que o aeroporto não tinha sido homologado pela ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil.

Alguns meses depois, o Ministério Público na cidade arquivou a ação, com base nos pareceres e na comunicação da prefeitura.

Em abril do ano passado, surgiu um fato novo — fatos novos justificam a reabertura de inquéritos. E o promotor Eduardo Nepomuceno decidiu retomar o caso.

Uma decisão absolutamente correta, tendo em vista a gravidade do fato novo.

A Polícia Federal, na investigação sobre os R$ 2 milhões que Aécio Neves pediu a Joesley Batista, obteve autorização judicial para grampear os telefones do primo do senador, Frederico Pacheco de Medeiros, o Fred, que foi à JBS para receber o dinheiro.

Em uma das conversas de Fred, a PF descobriu que Aécio, três anos depois da prefeitura de Cláudio informar que era ela que controlava o acesso ao aeroporto, tinha a chave do local.

Na conversa com um interlocutor ainda não identificado, Fred diz que um segurança de Aécio Neves tinha a chave.

O homem pergunta a Fred:

“Se o Duda tá descendo no avião, alguém vai abrir o portão para ele ou não?”

Frederico responde:

“Sim, já deve ter aberto. Ele já deve ter saído e já deve ter fechado.”

O interlocutor indaga:

“E quem é essa bênção de pessoa?”

Frederico, mais uma vez, responde:

“Deve ser o segurança de Aécio”.

“Ah, ele tem a chave?”, pergunta o interlocutor.

“Deve ter. Estou imaginando na condição de alguém ir lá abri-lo. Eu não sei nem se vai, mas deve. Passa lá na porta”, diz Frederico.

A Polícia Federal encaminhou esse trecho da escuta para o Ministério Público de Minas Gerais, e o caso foi para as mãos de Nepomuceno, que já tinha investigado questões relacionadas ao aeroporto.

Nepomuceno intimou Fred para prestar esclarecimento, e a audiência deveria ocorrer ontem à tarde.

Mas o advogado pediu o adiamento para a semana que vem, sem que promotor tivesse sido intimado da decisão de Toffoli.

Certamente, o advogado de Fred, Marcelo Ferreira, soubesse. Mas Nepomuceno, ainda que soubesse, sem ser intimado, continuava no cargo.

O afastamento de Nepomuceno retoma uma antiga reclamação prestada contra ele pela defesa do senador Zezé Perrella, aliado de Aécio, no Conselho Nacional do Ministério Público.

O promotor investigou várias denúncias contra Zezé e seus parentes, e moveu alguns ações civis que ainda tramitam.

Graças a esse trabalho, os bens do senador se tornaram indisponíveis até o desfecho das ações.

É de autoria dele, por exemplo, a ação civil pública que pede o ressarcimento dos recursos liberados pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais, para a manutenção e combustível do helicóptero da família Perrella, apreendido em uma fazenda do Espírito Santo com 445 quilos de pasta base de cocaína, em novembro de 2013.

Zezé Perrella, argumentando que estaria sendo perseguido, denunciou Nepomuceno ao Ministério Público de Minas Gerais e o caso foi parar no Conselho Nacional do Ministério Público, que afastou o promotor.

No ano passado, Nepomuceno deixou a Promotoria do Patrimônio Público. Mas recorreu, e acabou retomando o antigo posto, por decisão da juíza federal Vânila Cardoso André de Moraes.

Conforme anota hoje o jornal O Tempo, de Belo Horizonte, é essa decisão da juíza federal que foi agora reformada por Toffoli, e Nepomuceno foi tirado do alcance das ações que são sensíveis a Perrella/Aécio Neves.

A decisão do Conselho Nacional do Ministério Público de afastamento de Nepomuceno, confirmada agora por Toffoli, chama a atenção por contrastar com outras resoluções do órgão.

Há quatro anos, Lula e outros políticos do PT têm denunciado ao Conselho procuradores e promotores que fizeram do ex-presidente o motivo de uma verdadeira cruzada.

O CNMP nunca acolheu nenhuma dessas reclamações.

Toffoli validou a decisão do CNMP na véspera do depoimento de Frederico Pacheco, o primo que Aécio disse a Joesley Batista, em tom jocoso, que seria capaz de matar antes de fazer a delação.

Está havendo assassinato, neste caso, mas não de Fred, mas da reputação de Nepomuceno, um promotor respeitado pelos colegas por ser firme nas suas investigações.

Quem acha que Aécio está politicamente morto se engana. Ele ainda tem influência, e muita.

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