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Covid: Ex-ministros criticam sugestão do Depen em alojar presos em contêineres

Presos em contêineres

Ex-ministros da Justiça dos governos FHC, Lula, Dilma e Temer, além de ex-presidentes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), divulgaram uma carta, no dia 30 de abril de 2020, em discordância sobre a sugestão do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) em alojar presos com sintomas de Covid-19 em contêineres.

Dez dias antes, no dia 20 de abril, conforme divulgado pela Agência Brasil, o Depen, que é um órgão ligado ao Ministério da Justiça, enviou ao CNPCP uma nota sugerindo o método de isolamento a partir do uso de “estruturas provisórias” que “poderiam ser similares a dos hospitais de campanha, com pré-moldados, barracas de campanha e até mesmo na forma de contêineres habitacionais climatizados”, sendo este último utilizado na construção civil.

“Perplexos” e “surpresos”, seis ex-ministros da Justiça e oito ex-presidentes do CNPCP afirmam em nota que é “lamentável que o Estado brasileiro cogite soluções dessa índole”.

No mesmo documento, foi relembrado que o Conselho, no ano de 2009, se posicionou contra a ação de aprisionamento de adultos e adolescentes em contêineres no Espírito Santo. Na ocasião, diante da repercussão do fato, o Brasil foi denunciado na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Organização das Nações Unidas (ONU).

“No difícil momento de pandemia, responsável por afetar a vida de todos os brasileiros, é fundamental que as autoridades constituídas reafirmem sua postura de respeito aos ditames do Estado Democrático de Direito e ao princípio universal de dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil.

Nada pode justificar o tratamento de indivíduos em condições subumanas e de precariedade em níveis medievais”, diz os subscritores.

Os ex-ministros e ex-presidentes do CNPCP reconhecem as “carências e deficiências” que envolvem o sistema penitenciário nacional, mas acreditam que a situação não pode ser aprofundada sobre o pretexto de vulnerabilidade dos presos diante do novo coronavírus.

Por fim, eles também recomendam ao Conselho que seja feito o veto imediato de tal sugestão e de outras de mesma natureza.

Confira a nota na íntegra:

Os ex-ministros de Estado da Justiça e os ex-presidentes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), abaixo subscritores, receberam com surpresa e perplexidade a informação divulgada pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), em 20 de abril de 2020, da sugestão encaminhada ao colegiado do CNPCP com a finalidade de permitir a utilização de “estruturas modulares temporárias”, leia-se “containers”, para o alojamento de pessoas presas que apresentem sintomas da COVID-19 e necessitem de atendimento médico.

De acordo com a notícia veiculada pela Agência Brasil, “as estruturas provisórias poderiam ser similares às dos hospitais de campanha, com pré-moldados, barracas de campanha e até mesmo na forma de containers habitacionais climatizados, muito utilizados há vários anos na construção civil”.

Tal recomendação ainda carece de deliberação do CNPCP, em face do pedido coletivo de vista solicitada em sua última reunião.

É lamentável que o Estado brasileiro cogite soluções dessa índole. Vale lembrar que no ano de 2009, o mesmo CNPCP, dessa vez fazendo valer seu compromisso institucional e legal, insurgiu-se contra calamitoso “estado de coisas” existente, à época, no Espírito Santo.

Naquela oportunidade, descobriu-se a submissão e aprisionamento prolongado de pessoas detidas, adultos e adolescentes, em containers, alcunhados de autênticos “microondas”.

A repercussão da gravíssima e intolerável situação redundou na imediata mobilização da sociedade e no oferecimento de denúncias contra o Brasil em organismos internacionais, tais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Organização das Nações Unidas (ONU).

No difícil momento de pandemia, responsável por afetar a vida de todos os brasileiros, é fundamental que as autoridades constituídas reafirmem sua postura de respeito aos ditames do Estado Democrático de Direito e ao princípio universal de dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil.

Nada pode justificar o tratamento de indivíduos em condições subumanas e de precariedade em níveis medievais.

As existentes e conhecidas carências e deficiências históricas do sistema penitenciário nacional não podem ser aprofundadas sob qualquer pretexto.

Se a vulnerabilidade dos presos brasileiros se apresenta ainda mais sensível em decorrência da pandemia, o próprio Conselho Nacional de Justiça, mediante Recomendação nº 62/2020, já ali estabeleceu as medidas adequadas a serem implementadas no ambiente carcerário, como a identificação dos grupos de risco e a priorização do cumprimento de pena fora das unidades.

Publicamente, portanto, os subscritores manifestam e declaram que outra solução não há ao CNPCP que não a recusa e o veto imediato e peremptório na adoção de quaisquer medidas dessa natureza.

Assinam

Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça

José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça

José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça

Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça

Tarso Genro, ex-ministro da Justiça

Torquato Jardim, ex-ministro da Justiça

Alamiro Velludo Salvador Netto, ex-presidente do CNPCP/MJ

Antonio Claudio Mariz de Oliveira, ex-presidente do CNPCP/MJ

Eduardo Muylaert, ex-presidente do CNPCP/MJ

Eduardo Pizarro Carnelós, ex-presidente do CNPCP/MJ

Geder Gomes, ex-presidente do CNPCP/MJ

Luiz Bressani, ex-presidente do CNPCP/MJ

René Ariel Dotti, ex-presidente do CNPCP/MJ

Sérgio Salomão Shecaira, ex-presidente do CNPCP/MJ

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