A mesa do coronel Flávio Botelho Peregrino, na sede do PL, em Brasília, mereceu um capítulo à parte no relatório da Polícia Federal.
Ex-assessor e homem de confiança do general Walter Souza Braga Netto, Peregrino guardava provas que desvendam detalhes do roteiro da tentativa de golpe de estado e também mostram a preocupação com as consequências, depois que as investigações começaram.
Na sede do partido presidido por Valdemar Costa Neto, um dos indiciados pela PF, os investigadores encontraram um envelope na mesa de Peregrino com perguntas a respeito da delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.
Segundo o relatório da PF, “possivelmente, foram feitas perguntas a Mauro Cid sobre o conteúdo do acordo de colaboração realizado por este em sede policial”.
As respostas parecem vir de Mauro Cid e relatadas por um terceiro, porque usam verbos na terceira pessoa do plural como “aliviou” ou “não falou nada”.
No documento, o interlocutor quer saber se a investigação descobriu algo sobre a narrativa construída em torno da distorção do artigo 142 da Constituição, usado pelos golpistas para tentar justificar uma intervenção das Forças Armadas na vida política, promovendo a ruptura democrática.
“Minuta do 142. Existia documento físico?”, pergunta o interlocutor não identificado. “Eles sabem de coisas que não estavam em lugar nenhum (e-mail, celular, etc.)”, responde, em vermelho, a pessoa que a PF acredita ser Mauro Cid ou a pessoa que falou com ele.
Golpistas se preocuparam com delação de Mauro Cid
Fica claro que, naquele momento, já existia preocupação com os estragos que a delação de Cid poderia provocar e até onde ela ia.
Sobre Filipe Martins, ex-assessor de Jair Bolsonaro, a resposta é curta: “sabem dele por outros meios”. O documento tem também uma pergunta sobre relatos da imprensa a respeito da participação das forças especiais, os kids pretos, nas operações golpistas.
“Imprensa plantando narrativa dos FE liderando os movimentos (12 e 24 dez e 08 jan)”, diz o interlocutor.
A resposta não oferece tranquilidade: “Está em outra investigação com o subprocurador do MPF (Dr. Carlos Frederico – um FDP)”.
O conteúdo da delação assustava os golpistas. No dia 12 de outubro de 2023 o general Mário Fernandes, hoje preso e apontado no relatório da PF como um dos coordenadores da tentativa de golpe, trocou mensagens com o coronel reformado Jorge Luiz Kormann tentando acalmar o colega militar.
Fernandes garantiu a Kormann que os pais de Mauro Cid haviam ligado para os generais Braga Netto e Augusto Heleno três dias após a homologação do acordo de colaboração de Cid com o ministro Alexandre de Moraes para informar que “é tudo mentira”, se referindo às reportagens publicadas na imprensa sobre o acordo.
Memórias Importantes.
Mas a mesa do coronel Peregrino guardava ainda outras surpresas para a investigação. Em uma pasta chamada Memórias Importantes os agentes encontraram o esboço da Operação 142.
Escrito à mão, o documento parece um rascunho da operação que visava distorcer o conteúdo do artigo para justificar o golpe militar. E listava os passos da trama: “interrupção do processo de transição”, “mobilização de juristas e formadores de opinião”, e “enquadramento jurídico no decreto 142 (AGU e MJ)”.
O texto segue com o passo a passo do golpe: “Anulação das eleições”, “Prorrogação dos mandatos”, “Substituição de todo TSE”, e “Preparação de novas eleições” e termina com o que chama de Estado Final Desejado Político: “Lula não sobe a rampa”.
Heloisa Villela