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Não se brinca com a democracia

Os ratos desembarcaram

Os ratos desembarcaram

Aconteceu o que todo mundo já esperava: o PMDB deixou o governo.

Como ratos que abandonam o navio em dificuldades, os peemedebistas abandonaram, momentaneamente, as tetas onde mamam há décadas como coadjuvantes, convencidos de que, com o golpe, vão continuar mamando, mas agora não mais como coadjuvantes e sim como astros principais.

Portanto, a não ser que haja algum acidente de percurso, o vice-presidente Michel Temer, com o seu intrigante sorriso de conspirador da corte na Idade Média, teoricamente já poderá confeccionar o terno da posse.

Afinal, ele tem o apoio de todos os réus, a começar pelo réu-mor Eduardo Cunha, para tomar as medidas que eles esperam, começando provavelmente pela extinção da Operação Lava-Jato, nunca antes, porém, da prisão do ex-presidente Lula, principal alvo do juiz Sergio Moro, para impedir que ele volte em 2018 com força total.

A decisão “histórica”, segundo o ex-líder do governo Romero Jucá, foi tomada por aclamação, em menos de cinco minutos, para não expor as divergências.

E as fotos do evento mostraram ex-integrantes do governo, incluindo ex-ministros, aplaudindo, entusiasticamente e sem qualquer constrangimento, a decisão do partido de desembarcar do governo Dilma, em apoio ao golpe armado pelos tucanos, à frente Aécio Neves, com a cumplicidade da grande mídia e de parte do Judiciário.                                                                                                                                          

Apesar da euforia, porém, registrada na reunião, o impeachment ainda não pode ser considerado favas contadas. Os números ainda não oferecem garantia de aprovação, pois após passar pela comissão especial o pedido precisará passar pelo Senado e, na última trincheira, pelo Supremo Tribunal Federal, que é o guardião da Constituição.

Paralelamente à movimentação para a materialização do golpe, em que até a OAB vergonhosamente manifestou o seu apoio com advogados engravatados insultando Lula – o medo da liderança do ex-torneiro mecânico se manifesta de forma absurda e inexplicável entre os golpistas – o condutor do processo de impeachment, o deputado Eduardo Cunha, manobra no Conselho de Ética para evitar a cassação do seu mandato, confiante nos aliados-cúmplices que garantem a sua permanência na presidência da Casa.

E, indiferente às denúncias que pesam contra ele e aos inquéritos solicitados pela Procuradoria Geral da República, desfila impávido e com pose de intocável pelos corredores da Câmara, com seu andar de primata e sempre acompanhado por um séquito de seguranças e escudeiros.

Por muito menos Severino Cavalcante foi defenestrado da presidência da Câmara e teve o mandato cassado.

Ao mesmo tempo, o midiático juiz Sergio Moro manda uma carta ao Supremo Tribunal Federal e dá conhecimento do seu conteúdo à imprensa – ele não consegue ficar longe dos holofotes – na qual candentemente pede escusas pelos erros cometidos, entre outras ações, na divulgação dos grampos, como se um pedido de desculpas fosse suficiente para apagar os males causados.

E, por sua vez, seguindo a linha de interpretações subjetivas adotada por membros do Judiciário, o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, emite parecer na ação contra Lula, dizendo que nada impede a sua nomeação para ministro, um ato da exclusiva competência da Presidenta da República – o que todo mundo já sabia – mas as investigações sobre ele devem continuar com o juiz do Paraná, porque Dilma teve a “intenção” de subtraí-lo da Justiça ao nomeá-lo para a Casa Civil.

Além de menosprezar o poder de investigação do Supremo, para cuja órbita o processo de Lula-ministro deverá passar, Janot também desrespeita a Constituição, que prevê foro privilegiado para ministros de Estado. Ou seja, contra Lula nem a Constituição tem validade.

Mas a mídia, em especial a Globo, tem esquecido momentaneamente Cunha, Moro e Lula para concentrar-se no processo de afastamento de Dilma.

O esforço agora é para descaracterizar o golpe, ouvindo principalmente ministros do Supremo que afirmam que o impeachment está previsto na Constituição e, portanto, “não é golpe”.

Todos os ministros entrevistados, porém, sempre fazem a ressalva: desde que obedecidas as regras constitucionais. E reside exatamente aí, nesse detalhe, a possível frustração do sonho de Temer de chegar ao poder por um atalho, sem precisar da aprovação popular.

A Carta Magna só considera legal o impeachment de Presidente da República quando comprovada a prática do crime de responsabilidade. Sem esse requisito é golpe.

E como tal crime não existe o Supremo pode invalidar todo o processo, jogando um balde de água fria nos eufóricos peemedebistas. Considerando que a decisão da mais Alta Corte de Justiça do país deve ser técnica – e não política – então o golpe pode não acontecer.

Pelo menos é o que esperam todos os brasileiros de bom senso que amam este país e querem ver a sua jovem democracia consolidada.

Na verdade, parece impensável a possibilidade do STF tomar uma decisão política, pois isso representaria o fim da democracia e a deterioração das instituições.

Com um Congresso desmoralizado, por conta dos fichas-suja que o infestam, e um Judiciário politizado o Brasil ficaria sem rumo, com uma Constituição meramente decorativa, sem presunção de inocência e sem garantias individuais, onde qualquer pessoa poderia ser presa com base apenas na interpretação subjetiva de um juiz.

E se não ocorresse a “ditadura do Judiciário”, a pior forma de ditadura segundo o ministro Marco Aurélio Mello, os militares se sentiriam no dever de intervir para restaurar a ordem e assegurar a soberania nacional, principalmente diante da inevitável entrega ao capital estrangeiro do que sobrou da fúria privatizacionista do governo FHC.

Vale lembrar a recente advertência feita pelo ex-presidente Lula, em entrevista a correspondentes estrangeiros: “Não se deve brincar com a democracia”.

Ribamar Fonseca

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