De 20 anos para cá, a soja começou a tomar conta do sudoeste do Piauí, na fronteira com o Maranhão.
E como ela, os agrotóxicos estão cada vez mais presentes. O estado ocupa a 14ª posição no ranking dos estados consumidores desses produtos.
Em 2016, consumiu 10,1 milhões quilos, o equivalente a 3,18 quilos por habitante.
Embora essa taxa corresponda à metade da média nacional, conforme o IBGE, esses produtos já espalham seus efeitos nocivos entre a população.
Tanto que o glifosato, agrotóxico mais consumido no mundo e no Brasil, foi encontrado em grande parte das amostras de leite materno coletadas em dois municípios.
Em pesquisa para seu mestrado no programa de pós-graduação em Saúde da Mulher do Centro de Ciências da Saúde, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Inácio Pereira Lima constatou a contaminação por glifosato ou ácido aminometilfosfônico (Ampa) – ou ambas as substâncias – em 83,4% das amostras obtidas na maternidade do Hospital Regional Dirceu Arcoverde (HRDA), em Uruçuí.
O município localizado no sudoeste, a 450 quilômetros da capital Teresina, é o maior produtor de soja no estado. Suas lavouras recebem grandes quantidades de agrotóxicos principalmente por meio de pulverização aérea.
A surpresa, porém, foi ter encontrado a mesma contaminação em amostras coletadas entre lactantes do município de Oeiras.
Localizada a 300 quilômetros da capital, na região sudeste, é o contrário de Uruçuí: ali a produção agrícola é a menor do estado. Das amostras obtidas na maternidade do Hospital Regional Deolindo Couto (HRDC), 46,1% continham o agrotóxico e seu derivado.
Entre as mães que participaram do estudo, cedendo amostras de leite, Inácio questionou também casos de aborto.
E descobriu que em Uruçuí, 23,1% delas tiveram a gravidez interrompida de uma a quatro vezes.
O dado é maior do que o encontrado em Lucas do Rio Verde (MT), em 2011, em pesquisa da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT).
Estudos epidemiológicos apontam a exposição crônica a agrotóxicos, principalmente durante a gravidez, como fator de risco para a prematuridade, baixo peso ao nascer, peso reduzido para a idade gestacional, microcefalia e aborto.
“A presença do glifosato no leite materno indica contaminação direta por este agrotóxico ou que as quantidades utilizadas na atividade agrícola da região pode ser tão elevada que o excesso não foi degradado pelo metabolismo das plantas ou microbiológico.
E nas localidades onde não há atividade agrícola, há suspeita de contaminação da água por agrotóxicos“.
Cida de Oliveira