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Tratamento contra o câncer varia nos hospitais do Sistema Único de Saúde

Elfriede Galera - 61 anos, aposentada, moradora de São Paulo Foto: Rodrigo de Britos

O tratamento oferecido para o paciente com câncer varia dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), segundo levantamento inédito feito pelo Instituto Oncoguia, ONG que oferece apoio a pacientes com a doença. O resultado foi apresentado no 7º Fórum Nacional de Políticas de Saúde em Oncologia, que aconteceu na semana passada, no Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa, em São Paulo.

Para fazer o levantamento, foram solicitados aos hospitais públicos do país uma lista de quais são os tratamentos medicamentosos oferecidos para cada tipo de câncer — o chamado protocolo ou diretriz. Cada hospital é livre para determinar o seu protocolo uma vez que o Ministério da Saúde oferece apenas uma sugestão dos tratamentos que devem ser administrados. São as Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDTs). Esse cenário abre espaço para uma grande variação nos tratamentos oferecidos, com potenciais consequências para a cura e a sobrevida de pacientes.

— Embora haja vários fatores envolvidos no tratamento oncológico, o medicamento é o mais fácil de ser padronizado, para termos um padrão homogêneo. Enquanto é impossível garantir que exista um cirurgião oncológico com a mesma habilidade em cada centro, ou que equipamentos de radioterapia disponíveis tenham o mesmo grau de sofisticação em todas unidades, o tratamento medicamentoso pode ser padronizado — explica Rafael Kaliks, diretor científico do Oncoguia.

No estado do Rio, dos 11 hospitais procurados, nove têm diretrizes. Desses, dois oferecem tratamentos contra o câncer de mama abaixo das descritas nas DDTs, que seria o básico. E outros dois oferecem “acima” e “muito acima” do que recomendam as diretrizes do ministério.

— Procure se colocar no lugar do paciente que sabe isso? E isso faz com que a pessoa procure a Justiça para conseguir o tratamento — analisa Kaliks.

Depoimentos

‘Não falo em cura, mas em controle da doença’

Maria Paula Bandeira – 31 anos, advogada, moradora de Recife

“Convivo com o câncer de mama desde 2011. Em janeiro de 2016, descobri metástases. Não falo mais em cura, mas em controle. Sempre me tratei por plano de saúde e tive acesso a drogas modernas. Conheço muitas mulheres que não têm direito a esses medicamentos por se tratarem no SUS. Muitas não sabem nem que eles existem”.

Tenho muita vida e vou lutar até virar purpurina’

Elfriede Galera – 61 anos, aposentada, moradora de São Paulo

“Recebi o diagnóstico de câncer de mama em 2010, já em estado avançado. Eu me trato num hospital público de São Paulo. Na Justiça, consegui uma liminar para ter acesso às “terapias alvo”, mas o governo dificulta e oferece alternativas que não adiantam mais para mim. Ainda tenho muita vida para viver e vou lutar até virar purpurina”.

Estudo avaliou 34 unidades de todo o país

A pesquisa do Instituto Oncoguia verificou se os hospitais públicos contavam com diretrizes de tratamento para câncer. Naqueles que tinham, ela foi comparada com o que está descrito nas DDTs.

Com base na lei de acesso à informação, a ONG solicitou dados aos 86 hospitais públicos e filantrópicos que atendem pacientes com câncer em todo o país. Desses, 52 responderam, sendo que 18 não possuíam diretrizes e não entraram no levantamento. Dos 34 que permaneceram na análise por dispor de pelo menos diretriz para um dos quatro cânceres mais comuns, 29 centros tinham protocolos para câncer de pulmão, 33 para câncer de mama, 31 para câncer colorretal e 33 para câncer de próstata. Em três casos — Rio, Recife e São Paulo —, foi possível analisar as diferenças dentro de uma mesma cidade.

Comparação com diretrizes do ministério

A análise comparou o protocolo de cada hospital com o que estava descrito nas DDTs, recebendo a avaliação de “adequado”, “acima” ou “abaixo” das diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde.

— Observamos que mesmo dentro de uma mesma cidade, havia diferenças entre o tratamento medicamentoso fornecido pelos hospitais, com potenciais consequências em termos de cura ou longevidade — afirma Tiago Farina, diretor jurídico do Oncoguia. — Esse levantamento efetivamente constata que o SUS de um paciente não é necessariamente igual ao SUS de outro paciente.

 

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