Os últimos nove anos e meio foram de muita luta e desafios para Samille Simões Parreiras da Silva Landim, de Volta Redonda, no Sul do Rio de Janeiro.
A empresária, de 33 anos, perdeu o marido, Cleberton Cássio Landim, vítima de um tumor cerebral fatal.
Antes do drama familiar, o casal tentou ter filhos com a ajuda de inseminação e fertilização in vitro. Sem sucesso, resolveram congelar alguns embriões . Em meio à luta pela vida do companheiro, inesperadamente, a moradora de Volta Redonda, Samille engravidou de forma natural de Pietro Cássio.
Sonho do marido
O menino não chegou a conhecer o pai, que morreu ainda durante a gravidez da mulher.
Mas o desejo de ampliar a família fez a empresária travar uma nova batalha: a de conseguir autorização na Justiça para implementar os embriões que ainda restavam.
Após quase dois anos, ela, enfim, conseguiu realizar o último sonho do marido.
Com quatro meses, Samille tem uma gravidez considerada de risco . Por isso, sua rotina foi modificada e os cuidados até o nascimento da criança foram redobrados.
A previsão é que o bebê, que se chamará Enrico ou Maria, venha ao mundo a partir de 13 de fevereiro de 2021. A data é significativa na vida da empresária: nesse mesmo dia irá completar dez anos da morte de Cleberton, que tinha 32 anos.
— Foi muita luta. Mas vejo como um renascimento. Eu tinha uma fase para encerrar. Precisava ter meu filho. Fiz uma promessa quando o meu marido morreu, por isso, não deixaria os embriões congelados para trás. Está previsto para nascer a partir do dia que meu marido morreu . Mas Deus é maravilhoso. Talvez, vai vir justamente para não ficarmos mais tristes nessa data. Será como se tivéssemos recomeçando — afirma.
Várias tentativas
A história começou quando Samille tentou engravidar e não conseguia.
O casal teve o diagnóstico de esterilidade sem causa aparente e recorreram à medicina para fazer três intrauterinas e in vitro, onde congelaram três embriões. Ela chegou a engravidar de gêmeos, mas sofreu um aborto em um acidente de carro. Meses depois, ela precisou interromper o tratamento de fertilização, há cerca de nove anos e meio, quando Cleberton teve o tumor.
Na época, eles moravam em Bom Jesus Jardim, em Minas Gerais. Mesmo saudável e sem qualquer problema clínico, o mineiro faleceu de forma abrupta e inesperada. Mas antes de partir, ele soube da gravidez natural, disse que seria um menino e que viria para ser o companheiro dela.
— Não estava nos meus planos ficar viúva e criar um filho sozinha, aos 23 anos. Antes de entrar em coma, ele disse que o nosso filho, um menino, viria para cuidar de mim e ser meu amigo. E fez um último pedido: para buscar nossos bebês. Ali eu assumi um compromisso com ele — conta.
Primeiro obstáculo
Uma semana depois, contactou a clínica, localizada em Belo Horizonte (MG) e lhe garantiram que os embriões seguiam guardados. A jovem se mudou com o filho para casa dos pais, em Volta Redonda, e só voltou a pensar em ter um novo bebê sete anos depois.
Pietro sempre lhe pediu irmãozinhos, mas Samille preferiu esperar. Foi então que o primeiro obstáculo apareceu: o Conselho Regional de Medicina (CRM) de Minas Gerais queria que a clínica comprovasse que o marido da empresária desejava esse procedimento.
A inseminação post mortem é realizada após a morte de um dos genitores, sendo um procedimento permitido pela Resolução 1.957/2010 do Conselho Federal de Medicina, desde que haja autorização prévia e específica do (a) falecido (a) para a utilização do material biológico crio preservado, e observe a legislação vigente.
Como Cleberton estava morto, não havia como ter uma autorização dele ou qualquer prova.
Acordo judicial e a pandemia
Com a negativa, a única forma encontrada para realizar o sonho era na Justiça.
Em 2018, Samille ingressou com uma ação para conseguir prosseguir com a implantação dos embriões . Ao mesmo tempo, corria para que o prazo para mantê-los na clínica não expirasse, já que o contrato se encerraria em agosto de 2020.
Em dezembro de 2019, veio a decisão definitiva para que a empresa e ela fechasse um acordo judicial para a liberação da implantação dos embriões.
— Fiz um acordo com a clínica, porque eles achavam que, futuramente, eu poderia processá-los. Mas eu não queria indenização e nem processar eles. O importante para mim era conseguir o direito para implementar meus embriões. Então, abri mão de algumas coisas. Mas estou feliz em poder realizar esse sonho e isso que me importa. Só queria meus filhos — diz.
Depois de passar por uma série de exames , Samille estava preparada para realizar a implantação em março, chegou a viajar para BH, mas a pandemia do coronavírus adiou o processo. Além de a clínica parar de funcionar na quarentena, seu endométrio estava fechado.
“Voltamos frustrados e de barriga vazia”, lembra. Mas ela continuou com a medicação e todos os cuidados, até que, em junho, tudo ficou melhor e ela pode, enfim, realizar o procedimento. Apenas dois dos três embriões foram implantados, porque um não desenvolveu.
Quase uma terceira perda
No entanto, um novo percalço no caminho: Samille teve um forte sangramento quatro semanas após a cirurgia e precisou ser hospitalizada. Foi então que teve um aborto , o segundo durante essa trajetória, e achou que seu mundo havia desabado e, o sonho se encerrado. Mas ao fazer um novo ultrassom descobriu que ainda tinha um bebezinho, e a esperança retomou à sua vida.
— Foi um bálsamo. Fiquei de repouso absoluto por um mês, só saía para ir às consultas e realizar ultrassom. Graças a Deus, ele se desenvolveu e está firme e forte. Fiz um chá revelação e descobrimos que seria um menino. Mas no meu exame de sexagem apareceu uma observação falando que o cromossomo do feto abortado por permanecer no organismo por até 20 semanas. Então, ainda não temos certeza. Mas o que vier estamos feliz, sendo a Maria ou o Enrico — disse ela.
Ciúmes
Hoje, Samille e Pietro festejam a chegada do novo membro da família. Nesses quase dez anos, Samille teve outros relacionamentos, mas está há três anos solteira.
Um dos motivos é justamente porque nunca escondeu que teria um filho do marido morto, o que sempre causou ciúmes em outros companheiros.
— Casei com o amor da minha vida. Depois que ele morreu, namorei, conheci pessoas, mas sempre comparo com o Cleberton, porque ele sempre foi um ótimo marido. Me apaixonei por ele quando eu tinha 10 anos, ele tinha 19. Dei meu primeiro beijo nele, aos 12, mas só namoramos quando eu tinha 16. Os novos relacionamentos eram complicados. É difícil aceitar que eu queria um filho do meu marido. Eu não iria abrir mão. Não estava pronta para me relacionar com ninguém. Isso era algo que precisava resolver e seguir adiante. O desfecho que Deus e a gente queria.
Agência Brasil