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Ex-ministro vê reação, apesar de ritmo ‘medíocre’ do PIB

Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda (Foto: Reprodução/TV Globo)

A recuperação da economia engrenou num ritmo mais forte do que se imaginava no início do ano e é “perfeitamente factível” uma alta do PIB (Produto Interno Bruto) acima de 3% em 2018. Essa é a avaliação do ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega.

Para ele, os números do 3º trimestre vieram “bem melhores do que se esperava”, em razão da revisão para cima feita pelo IBGE dos dados do 1º e 2º trimestres, o que tornam as perspectivas mais animadoras, apesar das dúvidas em relação à aprovação da reforma da Previdência e do nível ainda muito baixo de investimentos.

Leia a seguir os trechos de entrevista do economista :

O PIB cresceu só 0,1% no 3º trimestre, abaixo do esperado, mas o mercado acabou considerando o resultado até melhor do que o do 1º e 2º trimestre. Qual a sua avaliação?

Eu acho que os resultados vieram bem melhores do que se esperava. À primeira vista enganou, porque a expectativa de muita gente era de 0,4%, 0,5%. E teve gente que até começou a falar que foi uma decepção sem olhar a abertura dos diversos componentes do PIB. Vamos ver várias consultorias revendo as suas projeções de crescimento para 2017. Se não crescer nada no 4º trimestre, o PIB já fica entre 0,8% e 0,9%, e a média hoje é 0,7%.

O que mais surpreendeu positivamente?

O que mais surpreendeu foi o consumo das famílias, até mais que o investimento. Em 12 meses, os investimentos continuaram caindo (-0,5%) e o consumo das famílias cresce em 12 meses por 2 trimestres consecutivos, e cresceu 2,2% comparado ao 3º trimestre do ano passado. Isso mostra que o consumo está crescendo em bases mais sustentáveis, independentemente da liberação de coisas (excepcionais) como o saque do FGTS.

O impulso para a recuperação continuará vindo pelo lado do consumo das famílias?

Acho que sim, pelo efeito de redução da inflação, que preserva e até aumenta a renda de determinados segmentos, pela queda da Selic, que amplia a oferta de crédito e a disposição de tomar dinheiro, e pela a queda do desemprego. Tudo isso gera um ganho de confiança que permite às famílias se engajarem mais em consumo. Mas o investimento começa a dar sua contribuição, o que significa que alguns segmentos já estão chegando ao limite de ocupação da capacidade ociosa. E esse investimento só não é maior porque tem muita empresa segurando por conta das incertezas do quadro fiscal e eleitoral.

A recuperação ainda é tímida ou já dá para considerar que a economia engrenou?

Se olhar no conjunto, tudo mostra que a economia realmente pegou tração, que o ritmo é melhor do que se esperava, embora ainda medíocre.

Diante do que se esperava desde o início do ano, os números são muito mais animadores, significando que podemos até ter uma recuperação mais expressiva do que indicam as projeções para 2018.

Boa parte do mercado já projeta crescimento até acima de 3% em 2018. Você compartilha desse otimismo?

Acho que é perfeitamente factível, sim. Só o fato de ter deixado para trás a pior recessão da história é motivo para comemorar. A projeção da Tendências [consultoria da qual Maílson é um dos sócios] é de 2,8% em 2018, mas vamos rever a projeção para 2017 para cima, provavelmente para em torno de 1%, o que significa que a projeção para 2018 também será revista para cima.

Essa melhora vai ser mais visível a partir de agora também para a população?

Acho que sim, mas tem uma defasagem. Ainda tem muita gente pagando dívida e mais de 12 milhões de desempregados. Mas [a recuperação] engrenou, e mais forte do que se pensava. Só que esse quadro pode mudar. Tem dois fatores que podem turvar essa recuperação: um fracasso na reforma da previdência e a marcha das eleições de 2018.

E quais são os riscos de uma não aprovação da reforma da Previdência?

São 3 cenários. No cenário de aprovação, o quadro de confiança se amplia, a bolsa deve passar dos 80 mil pontos, o câmbio cai abaixo dos R$ 3 e expectativas futuras melhoram muito. Num segundo, de rejeição, será difícil fazer a reforma também mais à frente e o país acelerará a sua marcha rumo à insolvência, com juros futuros explodindo e o Banco Central tendo que abortar o ciclo de redução da Selic. E tem o terceiro cenário, em que simplesmente não vota a reforma, fica em suspenso. Daí eu acho que não altera, e vamos ter que esperar para ver quem vai se eleger em 2018.

Apesar de ter voltar a subir após 4 anos, a taxa de investimento ainda segue num patamar crítico, não?

16% do PIB é um nível muito baixo, eu acho que é mais baixo que a da Bolívia.

Os economistas estão de acordo que o Brasil não elevará o seu potencial de crescimento se não acontecer duas coisas: ganho de produtividade e uma expansão da capacidade de investir para algo em torno de 20%, 22% do PIB pelo menos. Estamos longe disso ainda. Por exemplo, a construção civil ainda não deu sinais de recuperação

Quais são as perspectivas para o Brasil no médio prazo? O país conseguirá escapar da necessidade de um ajuste também do lado da receita?

Acho que que dificilmente se pode ter muito otimismo para os próximos 3, 4 anos, porque o potencial de crescimento da economia caiu muito por conta do fato da produtividade ter despencado. Dificilmente o PIB potencial no próximo quadriênio de governo passe de 3% ou 4%.

Não vejo nenhuma medida no curto prazo que possa alterar esse quadro porque o ganho de produtividade virá de uma continuidade de reformas, particularmente da reforma tributária. E não vejo nenhuma chance de fazer algo digno desse nome agora, ou mesmo em 2019.

E reforma tributária é jogar fora o sistema atual de tributação de consumo, extinguir ICMS e ISS, e caminhar para o padrão mundial, que é o IVA [Imposto sobre Valor Agregado], o que ao longo do tempo pode gerar 2 pontos percentuais de crescimento no PIB potencial.

 Darlan Alvarenga

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