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STF: ministro diverge de relator e defende promoção de crenças no ensino religioso

Plenário do STF durante sessão que analisou regras sobre ensino religioso na rede pública (Foto: Nelson Júnior/STF)

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, votou nesta quinta-feira (31) contra um pedido da Procuradoria Geral da República (PGR) para eliminar a promoção de crenças em sala de aula por professores do ensino religioso da rede pública.

Ele foi o primeiro a divergir do relator, ministro Luís Roberto Barroso, no julgamento que discute se o conteúdo da disciplina nas escolas públicas deve ou não ser “confessional”, isto é, lecionado por representantes das religiões com a defesa de seus dogmas.

Na sessão desta quarta (30), quando começou a análise, Barroso defendeu que as aulas se limitem à exposição das doutrinas, história, práticas e dimensões sociais das diferentes crenças, assim como do ateísmo e do agnosticismo.

Contra essa orientação, Alexandre de Moraes argumentou que tal concepção contraria a liberdade de expressão dos professores – que ficariam limitados a um conteúdo religioso definido pelo governo – e também a vontade dos alunos em aprofundar-se na fé que escolheram.

“O ministro da Educação baixaria uma portaria com os dogmas a serem ensinados, em total desrespeito à liberdade religiosa. O Estado deve ser neutro, não pode escolher da religião A, B ou C, o que achar melhor, e dar sua posição, oferecendo ensino religioso estatal, com uma nova religião estatal confessional. Não é essa a ideia da Constituição”, afirmou Moraes.

Ele ressaltou que a matrícula, conforme prevê a própria Constituição, é facultativa: o estudante pode optar por não cursar a disciplina sem qualquer prejuízo.

Moraes também argumentou que somente representantes das religiões, que defendem sua fé, teriam o domínio suficiente dos preceitos para ensiná-los.

“Nós não contratamos professor de matemática se queremos aprender física. Não contratamos professor de educação física para dar aulas de português. Quem ensina religião, os dogmas, são aqueles que acreditam na própria fé e naqueles dogmas. Ora, um exército de professores que lecionam preceitos religiosos, alguns contraditórios escolhidos pelo Estado, não configuram ensino religioso”, assinalou.

Voto do relator

Na sessão desta quarta, Luís Roberto Barroso votou por acolheu o pedido da PGR, mas não para proibir de forma taxativa que sacerdotes deem aula de religião.

Conforme o voto, eles só poderiam lecionar a disciplina se admitidos em concurso, que não poderá exigir como requisito que sejam representantes de determinada religião. Eles seriam escolhidos dentro do quadro normal de professores.

No Brasil, a Constituição prevê o ensino religioso nas escolas públicas como disciplina do ensino fundamental (para alunos 9 aos 14 anos de idade), mas estabelece que é facultativa: o estudante pode se recusar a cursá-la, por vontade própria ou da família.

Para garantir tal opção, Barroso também defendeu a proibição de matrículas automáticas nas escolas públicas no ensino religioso, e que a ausência do estudante nas aulas não implique prejuízo à frequência mínima exigida nem às notas para o aluno passar a uma série seguinte.

PGR, AGU e CNBB

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse que a opção de não se matricular na disciplina não impede que o aluno sofra “doutrinamento” pelo fato de evitar comportamentos que se desviam do que é considerado “normal” pela maioria dos colegas.

“Não se pode admitir que se transforme uma escola pública em catequese ou em local para proselitismo religioso, católico ou de qualquer outra religião. A escola pública não é espaço para ensino confessional”, disse.

A possibilidade de ensino confessional foi defendida pela advogada-geral da União, Grace Mendonça. Ela ressaltou que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação assegura o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil e proíbe qualquer forma de proselitismo.

“O Estado não pode tornar obrigatória qualquer religião. Porém, o Estado tem o dever de oferecer um ambiente favorável para que essa liberdade se desenvolva num ambiente sadio. Nosso Estado é laico, não laicista. O ensino religioso é ofertado pelo Estado, mas não imposto. O ensino religioso é ofertado pelo Estado, mas se impõe qualquer tipo de credo”, afirmou.

Representando a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Fernando Neves argumentou que aulas sobre história das religiões já são ministradas em outras disciplinas. Para ele, a definição do conteúdo pelo Estado contrariaria o princípio de sua separação da Igreja.

“Ensino religioso não é catequese, não é proselitismo. É aprofundamento daquele que já escolheu aquela fé, por si ou por sua família”, defendeu.

 Renan Ramalho

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