O Google é acusado de selar acordos com fabricantes de dispositivos e sistemas operacionais, como Apple e Samsung, para garantir que seus produtos fossem pré-instalados nos smartphones e configurados como de uso padrão.
Para garantir esse privilégio, o Google pagaria entre US$ 8 bilhões e US$ 12 bilhões (entre R$ 39 e R$ 59 bilhões) por ano para a Apple, o que representa entre 17% e 26% de toda a receita da fabricante do iPhone, alega o Departamento de Justiça norte-americano.
“Essas práticas, juntas, garantem um efeito em cascata que favorece o Google. Ao comprar um celular, o consumidor recebe um ambiente moldado para que eles façam as buscas com o Google e, ao buscar alternativas, encontra dificuldades”, disse o pesquisador do CNPq e da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Ergon Cugler à Sputnik Brasil.
Para ele, trata-se de um “movimento coordenado de fechar acordos de exclusividade e manipular os leilões de anúncio dos concorrentes, que impõe barreiras para que concorrentes não entrem no mercado de buscas”.
Seja na Internet ou fora dela, a formação de monopólios é considerada nociva para a atividade econômica e para os consumidores, explicou o professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie Milton Pignatari.
“O monopólio pode se caracterizar pelo comércio abusivo, que consiste em um indivíduo ou grupo tornar-se único possuidor de determinado produto e, pela falta de competidores, poder vendê-lo por um preço exorbitante”, disse Pignatari à Sputnik Brasil.
Nesse contexto, um dos principais problemas gerados pelo monopólio é a eliminação da concorrência, que retira do consumidor o seu poder de escolha.
“O monopólio geralmente não favorece os consumidores.
No entanto, o sucesso de um mecanismo de buscas depende justamente do seu número de usuários e volume de atividade. Quanto mais buscas, mais informações são geradas para otimizar os algoritmos, explicou o pesquisador Cugler.
“O Google desenvolveu bons algoritmos justamente por ter uma posição monopolista”, disse Cugler.
Os danos causados pelo estabelecimento de um monopólio no mercado de buscas não se resumem à esfera econômica, interferindo diretamente no debate social e político.
Para ele, “os mecanismos de buscas não são neutros” e boa parte das tecnologias que utilizam algoritmos “são revestidas de interesses econômicos e políticos específicos”.
“Vimos a capacidade das grandes empresas de tecnologia de manipularem algoritmos na Internet durante o debate sobre o Projeto de Lei 2630 [que instituiria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet]”, lembrou o pesquisador da FGV.
“Nessa ocasião, as empresas faziam com que postagens que iam contra seus interesses fossem desengajados, com impacto direto na nossa realidade.”
Nesse contexto, emerge o debate sobre a regulamentação de empresas do porte do Google não só nos EUA, mas também no Brasil. Para o economista Milton Pignatari, a regulação e intervenção do Estado em casos de monopólio deve ser proporcional ao dano que este causa ao comércio e aos consumidores.
Porém, o próprio poder de monopólio de empresas como o Google dificulta sobremaneira a imposição de regulação por parte do Estado e da sociedade, alerta Cugler.
“É um grande desafio regular empresas com poder de monopólio tão grande. Já vimos que, quando projetos de lei são apresentados, […] essas empresas reagem com uma força muito grande contra a regulamentação”, disse Cugler.
O caso EUA et al. vs. Google é o primeiro julgamento sobre monopólio movido pelo governo norte-americano na era da Internet e deve durar cerca de dez semanas. Durante o processo, serão ouvidas testemunhas e apresentados documentos internos do Google obtidos pelo Departamento de Justiça dos EUA.