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Qual a relação de Brasil e Argentina ?

Pobreza na Argentina cresce de dezembro a janeiro

Diante das relações comerciais, políticas e econômicas históricas entre Brasil e Argentina, que juntos concentram mais de 65% do produto interno bruto (PIB) da América do Sul, a cientista política acredita que a decisão do governo Milei pode ser “um tiro no pé”.

Uma vez que vai estremecer a parceria, principalmente no Mercosul.

“Então a gente vê que talvez exista um conflito porque agora ambos os presidentes [Luiz Inácio Lula da Silva e Javier Milei] estão em espectros políticos opostos, como acontece quando [Jair] Bolsonaro era presidente do Brasil e Alberto Fernández na Argentina”, acrescenta.

Conforme a especialista, o governo Milei ainda afronta pelo menos três dispositivos legais com a expulsão de brasileiros sob o argumento da falta de documentação.

Para além de desrespeitar a livre circulação entre os países-membros do Mercosul, infringe a própria Lei de Migração Argentina, de 2003, que amplia as categorias de permissão para o ingresso de estrangeiros no país e ainda garante maior proteção.

“E tratando de relações bilaterais, tem o acordo firmado entre Brasil e Argentina, que facilita a emissão de autorização de residência para a Argentina no território brasileiro e vice-versa.

Então, obviamente, pode gerar um isolamento da Argentina no nível regional. O país ainda é um dos principais destinos de migração intrarregional, ou seja, de países sul-americanos”, conclui.

País pode adotar a mesma postura com estrangeiros argentinos?

Já o professor de direito internacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Lucas Carlos Lima, afirma que as relações entre os países são regidas pelo princípio da reciprocidade.

Com isso, “o mesmo rigor utilizado pelo país argentino no controle de fronteiras poderia ser empregado pelo Brasil”, explica o especialista. Questionado sobre a situação e uma eventual mudança na política migratória para argentinos, o Itamaraty diz que “tomou conhecimento de relatos de inadmissão de estudantes brasileiros na Argentina e realizou gestões sobre o tema junto às autoridades locais”.

A situação ainda poderia causar, segundo o especialista, futuras consultas diplomáticas ou até processos judiciais de “denegação de direitos” reconhecidos internacionalmente.

“Não me parece, portanto, uma medida que vai facilitar a vida do presidente Milei […]. A medida coloca em xeque toda uma série de iniciativas voltadas à livre circulação de pessoas no Mercosul.

É difícil verificar se contraria essas normativas porque, ao que parece, as ações de restrição de entrada são baseadas em suposta documentação irregular (e a documentação é exigida no âmbito das regras do Mercosul).

Contudo, resta a interpretação de que o recrudescimento de normas e exigências não parece ser um passo rumo à facilitação da integração”, afirma.

O pesquisador do Laboratório de Estudos Políticos de Defesa e Segurança Pública (LEPDESP), formado pela UERJ e pela Escola Superior de Guerra (ESG), Lier Pires Ferreira, explica que os “falsos turistas” alegados pelo governo Milei seriam pessoas que entraram no país com propósitos diversos, como estudar ou trabalhar.

De acordo com o PhD em direito, os casos de brasileiros que procuram a Argentina para estudar, diante das regras restritivas para o ingresso nas universidades públicas do país, são clássicos, principalmente cursos de medicina.

“Considerando as facilidades relativas para o ingresso nas ótimas universidades públicas argentinas, com destaque para a Universidade de Buenos Aires (UBA), muitos brasileiros entram como turista e buscam, posteriormente, adquirir o status de estudante, aproveitando-se das oportunidades até aqui facultadas pela Direção Nacional de Migrações (DNM), segundo as quais o visto de estudante pode ser obtido dentro de 30 dias da entrada regular no país, ainda que na condição de turista”, argumenta.

Na última semana, uma reportagem do portal UOL chegou a relatar um grupo de brasileiros que, apesar de garantirem que estavam com a documentação exigida, foram expulsos da Argentina após serem classificados como “falsos turistas”: metade afirmou que iria estudar no país e a outra que iria fazer turismo.

“Me colocaram em um avião e não me deixaram saber o número do voo. Fizeram eu me sentir uma bandida. Foi muita humilhação. Era meu sonho. Todas as minhas economias foram para estudar na Argentina”, contou uma jovem à publicação.

“A tese do falso turista, embora dotada de certa legalidade, é controversa, tanto no que conflita com outras normas existentes, quanto no que tange ao espírito da lei.

Além disso, ela adentra na seara do Ministério da Segurança, comandada pela ultradireitista Patricia Bullrich, que aponta para a restrição de imigrantes latino-americanos na Argentina, sejam legais ou não”, diz Lier.

sputnik

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