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“Centrão” que não é de centro

Centrão nada do nada

Acho engraçado esse negócio de “Centrão”. Em que mundo aqueles partidos são de centro? Só na novilíngua do noticiário político brasileiro, em que Ciro Gomes é “radical”, Lula é “extremista” e Boulos, “terrorista”.

São partidos de direita com comportamento acentuadamente fisiológico – outra expressão curiosa, um eufemismo brasileiro que indica aquela zona cinzenta entre o oportunista e o corrupto.

É mais um “Gelatinão” do que qualquer outra coisa. Um paradoxo, na verdade: o “Centrão” é a manifestação organizada da geleia geral da política partidária brasileira.

Agora, rifam Ciro e decidem apoiar Alckmin. O candidato do PSDB ganha algum gás e encerra, ao menos por enquanto, a ofensiva para substituí-lo por Dória.

O preço que paga é ter seu eventual (ainda improvável) governo tutelado por seus novos parceiros; seu programa, que a imprensa vai chamar de “liberal”, só poderá ser a manutenção, ampliação e blindagem da rapinagem da elite política sobre o Estado brasileiro.

Mas não se sabe se o apoio será o suficiente para erguer sua campanha – os tucanos andam chamuscados demais para conseguir alçar voo.

Ciro sai mal da história, sem os apoios ambicionados e com dificuldade para recuperar seu discurso à esquerda.

Mas a lição principal é que os partidos da direita fisiológica também fecham as portas para uma saída negociada da situação aberta com o golpe.

Ciro tentava se posicionar como o arauto de um novo lulismo, capaz de conciliar os contrários e pacificar o país.

Um lulismo diferente, é claro, adaptado à sua persona, sem a barreira que o preconceito de classe gerava, com um toque mais tecnocrático e menos popular. Mas com o mesmo espírito, de uma pactuação que incorporasse todos sem ameaçar ninguém.

A manutenção de Lula como preso político, nas circunstâncias que todos conhecemos, mostra que a classe dominante brasileira fecha as portas para esta repactuação, tal como proposta por Lula.

Ciro já enfrentava o desagrado de muito do empresariado e, agora, ganha a rejeição formal da elite política: seu próprio projeto de repactuação não encontra eco.

O caminho deles, está dito e redito, é aprofundar os retrocessos, sem ceder nada, sem conceder nada.

Luiz Felipe Miguel

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