Interessante e preocupante a coluna de fim de ano de André Singer, hoje, na Folha.
Ele se pergunta o que fez o “partido-ônibus” que era o PMDB, um saco de gatos onde cabia todo mundo e qualquer um, passar a perseguir seus dissidentes, como está fazendo com Jarbas Vasconcelos (PE) e Kátia Abreu (TO), expulsa do partido.
Singer arrisca uma explicação: para ele, “o deslocamento liderado por Temer entre 2015 e 2016, quando o partido rompeu a aliança com o lulismo para assumir a vanguarda da derrubada de Dilma, não era epidérmico, como às vezes pareceu”.
Para ele, trata-se de “espaço criado pelo conservadorismo que avançou na sociedade brasileira.”
O acesso ao Executivo, via impeachment, deu ao grupo em torno de Michel, como gostam de dizer os [seus] correligionários, a possibilidade de realizar um programa que move importantes forças nacionais. Contenção estrutural do gasto público, desmonte da CLT e reforma da Previdência constituem medidas que alteram características centrais da Constituição de 1988, como é o desejo de parcela expressiva da classe dominante.
Concordo com a visão de Singer, mas agrego – sem contradizê-lo – que não é apenas a ocupação do espaço “criado” pelo conservadorismo. É a ocupação do espaço que o PSDB, com sua evidente decadência, deixou aberto neste campo e nesta agenda. A degradação absoluta do nome de Aécio Neves, mesmo antes do episódio das malas, e as limitações flagrantes de Geraldo Alckmin, que não o substitui, mas o sucede – como observou com lucidez Janio de Freiras – denotam a decadência do tucanato como ferramenta deste programa neoliberal.
Tudo corrobora o raciocínio do colunista da Folha, de que a turma do Michel e outros peemedebistas nem tanto “não pretendem entregar os louros conquistados de mão beijada para algum tucano da vida”. Até porque a plumagem tucana foi de exuberante a esmaecida nestes anos.
E que o problema que se lhes apresenta é o mesmo que fez Garrincha perguntar ao técnico Vicente Feola, ao ouvir dele um esquema infalível para marcar gols na forte seleção da então URSS, em 1958, se ele já tinha “combinado com os russos” que as coisas seriam assim.
E com os milhões de russos-eleitores o PMDB não tem combinação alguma e muito menos um Garrincha.
Por isso, diz Singer, o tal semipresidencialismo parece ser o esquema tático a se tentar usar.
Até agora porém – e definitivamente se não aprovar a reforma da Previdência – parece que os planos do PMDB não irão além da prancheta.
Por Fernando Brito