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Os desafios de ser professor no Brasil

A qualidade do professor é fator decisivo para o sucesso escolar dos alunos.

A qualidade do professor é fator decisivo para o sucesso escolar dos alunos. Esta afirmação é corroborada por décadas de pesquisas sobre o tema. Lógico que isso só se aplica ao contexto escolar – as pessoas podem aprender sozinhas ou com o uso de tecnologia.

Neste post, tentaremos responder três perguntas: (1) em que consiste a qualidade do professor, (2) como formar e (3) como atrair professores de qualidade em um país como o Brasil.

A qualidade do professor é aferida por quatro indicadores. O primeiro refere-se ao nível de qualidade de sua formação geral – tipicamente demonstrada pelo sucesso escolar. No Brasil, um bom indicador seria a nota no ENEM, por exemplo. O segundo refere-se ao preparo para o ensino de uma turma ou disciplina específica. Na literatura internacional, o indicador mais utilizado é o grau de conhecimento do professor a respeito dos conteúdos que ele ensina. Por exemplo: para um professor com turmas do 6o ao 9o ano é mais importante conhecer a fundo os conteúdos deste período. Para um professor de pré-escola é fundamental conhecer em detalhe os processos de desenvolvimento infantil. Tudo isso é muito mais importante do que obter graus mais avançados como mestrado ou doutorado. O terceiro indicador refere-se à capacidade prática de o professor usar estratégias eficazes de ensino em sala de aula. Essas estratégias também são bem mapeadas na literatura científica e adequadas a diferentes disciplinas e níveis de ensino. Estudos nesta área mostram que raramente um professor despreparado é capaz de dominar bem as metodologias – não existe forma sem conteúdo. O quarto indicador é a prova de fogo – como é o desempenho dos alunos desse professor no curto e longo prazo.

Esses indicadores ilustram o grande desafio para melhorar a educação no Brasil:  ficamos presos no 1o indicador. A maioria dos nossos professores de séries iniciais situa-se no decil inferior da distribuição nas notas do ENEM. Nas licenciaturas, a variedade de desempenho é maior, mas raramente eles situam-se acima do nível médio de desempenho.

Nos países educacionalmente desenvolvidos, os professores são recrutados entre os 30% melhores de sua geração. Nos últimos quarenta anos, as autoridades educacionais brasileiras vêm tentando, sem sucesso, diferentes estratégias de “capacitação e “formação em serviço” – para ensinar tanto conteúdos quanto metodologias.

Não existe qualquer evidência de que isso funcione – e já foram quarenta anos e bilhões de reais gastos nisso. Também não funciona aumentar o nível de exigência de titulação – pois a matéria prima e a qualidade da formação não se alteram.

Resta abordar a segunda pergunta: como atrair professores de qualidade? A experiência de outros países é o único guia, mas ela precisaria ser adaptada à história e à realidade brasileira. A equação completa inclui uma variedade de políticas articuladas.

Um primeiro passo consistiria em atrair jovens situados entre os 30% melhores do ensino médio – com notas em torno de 700 pontos no ENEM. Uma alternativa é atrair jovens já formados com esse perfil e que queiram mudar de profissão. O segundo passo consistiria na formação. A experiência internacional aponta para modelos muito diferentes – o que é comum é a qualidade: pessoas talentosas bem formadas têm mais chances de se tornarem bons professores. Não há uma receita única. O detalhe importante é o conhecimento profundo dos conteúdos que o professor vai ensinar – não importa o curso que ele tenha feito.

O terceiro passo consistiria na indução – ou seja, assegurar estágio probatório em escolas bem organizadas, de boa qualidade e sob a supervisão de professores experientes e competentes no uso e ensino de estratégias comprovadamente eficazes de manejo de classe de diferentes faixas etárias e ensino de disciplinas específicas.

Este é um gigantesco desafio, no caso brasileiro, tanto pela falta de pessoas experientes para servir como tutores e pela falta de escolas em condições de servirem como plataformas adequadas quanto, sobretudo, pela falta de convicção e conhecimento das evidências sobre o que efetivamente funciona.

Nos países desenvolvidos, cerca de 50% das pessoas não passa nesse estágio – o que demonstra não apenas o rigor com que é ministrado, mas os desafios de ser professor.

Por João Batista Oliveira

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