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Denúncias sobre propina no metrô de SP acirram disputa entre petistas e tucanos

 

Uma guerra de dossiês anônimos acirrou a disputa entre PT e PSDB e antecipou a queda de braço entre os dois partidos para as eleições presidenciais de 2014. Os papéis sem assinatura fazem parte da investigação de formação de cartel e supostos pagamentos de propinas a funcionários do governo paulista em contratos do metrô e do setor ferroviário paulista, que poderiam alcançar mais de R$ 150 milhões. O PSDB está à frente do governo paulista desde 1995 e vários dos contratos averiguados foram firmados nesse período.

Os dossiês começaram a surgir depois que a Siemens apresentou denúncia de formação de cartel nas licitações do metrô e do sistema de trens paulista ao Conselho Administrativo de Defesa econômica (Cade). A matriz tomou a decisão de investigar os negócios no Brasil em 2008, depois de receber uma carta anônima de um funcionário brasileiro endereçada ao ombudsman da Siemens AG, na Alemanha. Naquele ano, a empresa alemã adotara regras duras para evitar o envolvimento de seus funcionários com subornos. Esta carta, que não cita políticos, é atribuída ao executivo Everton Rheinheimer.

Antes da Siemens, porém, o Ministério Público da Confederação Suíça já investigava o banqueiro suíço Oskar Holenweger, suspeito de lavagem de dinheiro, e encontrou documentos vinculados à empresa Alstom, vinculados ao pagamento de propina ao redor do mundo. As movimentações financeiras de offshores em bancos suíços passaram a ser mapeadas, e seus donos e controladores, identificados. Essa investigação havia sido iniciada em 2004 e, em 2008, as autoridades suíças começaram a encaminhar para o Brasil, espontaneamente, informações sobre movimentações financeiras suspeitas.

Siemens e Alstom estão entre as principais fornecedoras do setor

Com as notícias de investigações na Suíça sobre a Alstom, principal fornecedora do metrô paulista, a bancada do PT e o deputado Simão Pedro (PT-SP), hoje secretário de Serviços da Prefeitura, passaram a produzir representações com denúncias de irregularidades e entregar ao Ministério Público de São Paulo. Ele pedia abertura de investigações. Várias representações foram arquivadas, por falta de provas. Para os petistas, houve pouca disposição em investigar o governo paulista.

Com a denúncia da Siemens ao Cade, as investigações em torno da Alstom, que se arrastavam desde 2008, foram aceleradas e passaram a ser conduzidas em conjunto pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal. Os executivos da Siemens começaram a ser ouvidos nos inquéritos que haviam sido abertos ou estavam parados no Ministério Público Estadual e no Ministério Público Federal. Vários deles têm de prestar depoimentos mais de uma vez: uma à PF e ao MPF, outra ao Ministério Público Estadual.

O PSDB questiona a imparcialidade do Cade, já que o presidente do órgão, Vinícius Carvalho, trabalhou no gabinete de Simão Pedro na Assembleia Legislativa da Bahia.

Na semana passada, começou a guerra de papéis sem assinatura. O primeiro deles, atribuído a Rheinheimer, foi divulgado na última quinta-feira e acusava políticos de diversos partidos, a maioria do PSDB, de estarem “envolvidos” com consultorias investigadas por prestar serviços fictícios à Alstom no Consórcio Sistrem, um dos contratados pela CPTM.

A primeira informação da PF era que o dossiê anônimo tinha sido enviado pelo Cade. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, chamou para si a responsabilidade e disse ter recebido o documento de Simão Pedro em sua casa, em maio passado. Argumentou que estaria prevaricando caso não encaminhasse os documentos aos responsáveis pela investigação.

MPF e PF pediram bloqueio de bens

O contrato do consórcio Sistrem com a CPTM é um dos investigados. O inquérito do Ministério Público de São Paulo cita apenas executivos até agora. O Ministério Público Federal e a PF, que também investigam o caso, pediram bloqueio de bens de três ex-diretores da CPTM, o que foi aceito pela Justiça Federal.

Os três ex-diretores – Ademir Venâncio de Araújo, ex-diretor de engenharia e obras; João Roberto Zaniboni (ex-diretor de operações e manutenção); e Oliver Hossepian Salles de Lima, ex-presidente da estatal – atuaram na empresa durante a gestão de governadores do PSDB. O processo corre em sigilo de Justiça. Até julho passado, uma consultoria de Zaniboni e Araújo, a Focco, ganhou licitações feitas pelo governo paulista.

A autoria do documento anônimo foi desmentida por Rheinheimer. De acordo com seus advogados, o executivo continuará respondendo apenas nos autos do inquérito policial e não participará do “jogo político”.

O documento foi incluído no inquérito da PF este ano. Simão Pedro (PT) não revelou quem o entregou. O texto mistura parte de depoimento verídico prestado por Rheinheimer à Polícia Federal com trechos que o executivo não reconhece como seus. O autor da íntegra só pode ser conhecido se Simão Pedro disser quem lhe entregou, o que até agora ele não fez.

Na última quinta-feira surgiu outro dossiê anônimo. O PSDB veio a público acusar o PT de ter usado um documento anônimo em inglês e apresentado junto uma tradução errada para o português. Também este documento estaria com a Polícia Federal.

Documentos apresentados não servem como prova

O fato, porém, é que nenhum desses documentos serve como prova. A Justiça impede que sejam quebrados sigilos bancários com base em denúncias anônimas, sem provas concretas. Pouco foi feito para rastrear bens e dinheiro dos supostamente envolvidos no esquema. Um exemplo: ao determinar o bloqueio de bens dos executivos da CPTM, a Justiça teve de pedir para que o MPF fizesse o levantamento do que teria de ser bloqueado, que ainda não havia sido providenciado.

Também o uso de documentos enviados pela Suíça como provas em investigações conduzidas no Brasil está sendo questionado no Superior Tribunal de Justiça.

Ao enviar os papéis, o Ministério Público da Confederação Suíça ressaltou que eles não deveriam ser usados como provas, mas como ponto de partida para investigações. No Brasil, as apurações estão em curso há, pelo menos, cinco anos sem que ninguém tenha sido efetivamente denunciado por algum crime. PT e PSDB dizem que vão à Justiça cobrar explicações um do outro.

Fonte: Cleide Carvalho

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