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RS: os riscos da crise climática para o preço dos alimentos

A catástrofe da chuva no Rio Grande do Sul já gera consequências no preço dos alimentos no estado e acendeu o debate sobre o impacto que a crise climática exerce no valor da comida.

Relatos da população que vive nas regiões atingidas denunciam casos de cobranças abusivas nos supermercados. Nacionalmente, a cadeia produtiva já faz declarações de que o preço do arroz pode aumentar.

O Rio Grande do Sul é o maior produtor do cereal do país. A região cultiva, colhe e comercializa mais do que todos os outros estados brasileiros juntos. Com as chuvas, uma parte considerável das plantações foi perdida.

Ainda assim, não é possível mensurar o estrago, segundo Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga).

Quando as chuvas começaram, na semana passada, o estado já tinha colhido mais de 80% da safra. No entanto, ainda havia 150 mil hectares com plantações ativas e armazéns também foram atingidos.

A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) segue a mesma linha. “As fortes chuvas que atingem o Rio Grande do Sul terão impacto na produção agrícola do estado, mas ainda é precipitado fazer qualquer previsão de quantitativo e de suas influências em relação ao abastecimento e aos preços”, informou a companhia.

Julia Catão Dias, especialista do Programa de Consumo Sustentável do Instituto de Defesa dos Consumidores (Idec), afirma que a tendência de alta costuma ser o caminho mais comum do preço dos alimentos em situações de desastre.

Ela alerta, no entanto, que esse cenário exige uma reflexão mais detalhada sobre o papel das práticas da cadeia produtiva.

 “É importante que consumidores saibam que, sim, desastres climáticos vão impactar no preço dos alimentos – até por isso uma tomada de ação é urgente – mas temos que ficar atentos atento a como esse alarde é usado por determinadas forças, que são justamente essas forças responsáveis por produzir toda essa situação.”

Ela ressalta o papel que o modelo de produção do agronegócio exerce nas catástrofes causadas pelo aquecimento global e pontua que a parte mais afetada é a agricultura familiar, responsável pela maior parte dos alimentos que chega às mesas das famílias brasileiras.

“Muitas vezes, o alarde de que o preço dos alimentos vai subir rapidamente é capturado pelo setor produtivo do agronegócio para reclamar por mais isenções, por mais financiamento e para dizer que o agronegócio precisa de socorro. Mas na verdade, quem precisa de socorro – até para possibilitar a construção de saídas para esse momento de emergência climática que vivemos – é a agricultura familiar.”

A tragédia climática que atinge a população gaúcha é um exemplo dramático e radical da relação entre insegurança alimentar e devastação ambiental. Mas o impacto do aquecimento global nos preços dos alimentos já é uma realidade global.

“Quando falamos de desastres climáticos, estamos falando desse desequilíbrio causado no planeta pelos modos hegemônicos de produção e de consumo, pelo modelo capitalista. A escolha por esses modos de produção e consumo está causando uma série de destruições socioambientais”, afirma Julia Catão Dias.

Nos últimos anos, a Organização das Nações Unidas (ONU) faz alertas sucessivos a respeito do tema. Os relatórios mais recentes do Painel Intergovernamental sobre o clima (IPCC) apontam prejuízos em diversos sistemas de produção de alimentos. Por outro lado, as grandes áreas de plantação de commodities são menos afetadas.

A percepção também está presente no Fórum Econômico Mundial. No relatório de Riscos Globais de 2024, a entidade aponta que o aquecimento do planeta afeta sistemas marinhos e terrestres com consequências direta na segurança alimentar.

Nara Lacerda

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